São Paulo, sexta-feira, 03 de outubro de 2008

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BC teme ser "obrigado" a impor aperto monetário em 2009

Crise financeira aumenta tensão na instituição

SHEILA D'AMORIM
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

À medida que a crise externa se estica em direção a 2009, cresce a tensão no Banco Central. E, isso, muito mais por causa das pressões internas do governo Lula do que pelo cenário internacional. Constantemente criticado pelo aumento dos juros, considerado excessivo por parte do governo, o BC teme ser obrigado a impor, no ano que vem, uma política de aperto monetário num cenário de baixo crescimento.
Nos últimos dias, o BC engoliu, a contragosto, crescer nos debates na equipe econômica sobre os desdobramentos da turbulência vinda dos EUA a tese de que a crise ajudará no combate da inflação no país e, com isso, já seria possível parar com os aumentos nos juros.
Essa defesa baseia-se não apenas na retração do mercado de crédito, mas também na queda nos preços das commodities, os vilões da inflação este ano. Isso puxaria o IPCA, índice de preços referência para o governo, para baixo, fazendo parte do trabalho dos juros.
Uma corrente dentro do BC argumenta, porém, que ainda não é possível garantir que a crise terá esse efeito estimado de controlar a inflação. Mas isso não é consenso entre os próprios diretores que integram o Comitê de Política Monetária.
Nos últimos dias, a desvalorização do real deu força a esse discurso. Se o real perde muito valor em relação ao dólar e se esse movimento se sustenta por muito tempo, o impacto na inflação é praticamente imediato. Desde o final de junho, quando as commodities atingiram os valores mais elevados, a queda no preço médio dos principais produtos da cesta de exportação do Brasil recuou 25,3%. Somente no mês de setembro, a taxa de câmbio teve desvalorização de 23,9%.
Com isso, o medo de alguns diretores do BC é que mesmo que a crise freie a demanda e as commodities estejam em queda, a desvalorização do real possa anular todo o efeito para inflação e mantê-la em alta.
Considerando ainda que a queda na demanda deve ser lenta por causa do crescimento do emprego e ganho de renda -que também leva mais tempo para reverter a tendência atual-, o BC pode se ver na situação de ter que elevar os juros para garantir o centro da meta de 4,5% em 2009. A cada dia, os diretores do BC reforçam os discursos de que o objetivo é levar a inflação para 4,5% no ano que vem.
A equipe do ministro Guido Mantega (Fazenda) está certa de que é possível compatibilizar o crescimento em 2009 num patamar inferior aos 5,5% esperados neste ano, com inflação sob controle. O câmbio, acreditam, vive um momento de estresse e essa oscilação atual deve ser absorvida pela economia, que vive um regime de câmbio flutuante.
O maior problema nesse momento, argumentam, não é escolher um "extremo" e persegui-lo a ferro e fogo, ignorando o resto da economia. Com isso, não há nenhum problema se a inflação convergir para a meta do ano que vem mais lentamente do que vinha programando o BC, desde que o nível de atividade seja assegurado.
O presidente Lula já disse que o crescimento é prioridade e, na fase atual da crise externa, o foco é não deixar o mercado de crédito parar, o que teria grave efeito sobre a economia.


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