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Crise dobra o desemprego no México
País vive o pior desempenho econômico desde 1932; neste ano, PIB deverá ter queda superior a 8%
População sofre com o desemprego, especialmente na região de fronteira; país ainda é muito dependente de exportações aos EUA
FLÁVIA MARREIRO
ENVIADA ESPECIAL A TIJUANA (MÉXICO)
Há um ano, Delfina Rodríguez, 55, perdeu o emprego numa das 700 maquiladoras de
Tijuana. Já não tem esperança
de encontrar outro após 23
anos trabalhando nesse tipo de
empresa, que importa insumos
e peças para reexportar produtos prontos. "Eles falaram que
não queriam gente velha. E não
me pagaram nada."
Em sua casa num dos morros
sem vegetação da empoeirada
cidade mexicana -o bairro
lembra uma favela carioca num
quadro saturado pela luz do deserto-, ela comemora porque
seu genro Hugo, de 18 anos, voltou a trabalhar em agosto, depois de sete meses de aperto,
numa maquiladora de eletrônicos. Ao lado dela, a filha Angelis, 16, grávida de sete meses,
diz que só pagarão ao seu marido US$ 200 mensais, menos da
metade do que ele recebia no
emprego anterior.
A família Rodríguez sofre as
consequências do pior desempenho econômico do México
desde 1932 -o PIB caiu 10,3%
no segundo trimestre e o recuo
anual não deve ser menor de
8%. Estão na populosa e murada fronteira do país com San
Diego, na Califórnia. Como o
resto da divisa México-EUA, a
região é estratégica tanto para o
narcotráfico como para o modelo exportador baseado nas
maquiladoras. Tijuana é pioneira e importante nos dois tipos de negócio.
Já abalada pela fuga de empresas rumo à China, em busca
de mão de obra ainda mais barata, no começo da década, a região de fronteira vive sua segunda e mais profunda recessão desde 2001. Alimenta o debate a que o próprio presidente
mexicano, Felipe Calderón, se
referiu quando esteve no Brasil
no mês passado: é preciso diminuir a dependência econômica
dos Estados Unidos.
A dependência se aprofundou nos 15 anos do Nafta, a área
de livre comércio da América
do Norte. Mais de 80% das exportações mexicanas vão para o
grande vizinho, de onde vêm as
remessas dos imigrantes, também em queda, que perfazem
2% da riqueza do país.
Analistas e a oposição tomaram o mote do presidente para
repetir que o modelo de desenvolvimento se esgotou. Ninguém vê uma saída rápida da
encruzilhada, no momento em
que o país ainda sofre com a
queda da produção de petróleo,
monopólio estatal, o que ajuda
a piorar as contas públicas.
"Da maior expansão da economia americana entre 2004 e
2007, quem se beneficiou foi a
China. Nós seguimos medíocres. Se o México não buscar
outra maneira de se posicionar,
se seguir apostando tudo na
atração de investimento externo pela mão de obra barata,
sem nenhuma congruência
com uma política industrial nacional, as perspectivas de futuro são muito ruins", diz o economista Cuauhtémoc Calderón, do prestigiado Colégio da
Fronteira Norte, em Tijuana.
Vendedor de pão
Na comparação com o primeiro semestre de 2008, o desemprego dobrou, de 3,22% para 7,61%, de janeiro a junho
deste ano no Estado de Baixa
Califórnia, onde fica Tijuana.
Estima-se que 50 mil pessoas
tenham perdido o trabalho formal. Os números são altos para
uma zona que, na década passada, exibia praticamente pleno
emprego, ainda que com baixos
salários e quase nenhuma garantia trabalhista. E não contabiliza a grande população flutuante de Tijuana -tanto a que
desiste da travessia aos EUA,
cada vez mais perigosa, quanto
a que é deportada de lá.
A situação se repete no Estado de Chihuhaua, que abriga o
polo de maquiladoras automobilísticas de Ciudad Juárez, devastado pela crise das montadoras americanas.
Pelas zonas de maquiladoras
de Tijuana -elas também instaladas nos topos dos morros-,
vê-se placas de venda de indústrias inteiras. Trabalhadores
reclamam de jornada reduzida.
Dizem que as empresas demitem para contratar por menores salários.
Na porta de uma das fábricas,
Victor Olivares, 34, diz que é
vendedor de pão desde o começo do ano. Conta que assim ganha o dobro do salário que lhe
pagava uma maquiladora que o
contratava mês a mês, algo que
viola as leis trabalhistas mexicanas. "Eles pagam cada vez
pior. E agora, com o desemprego, há dez vendedores de pão
em cada fábrica", reclama.
Dois dos sete filhos de Delfina Rodríguez também trabalham em maquiladoras, e tiveram as jornadas de trabalho encurtadas. "É a pior crise que eu
já vi. As coisas vão piorando."
Ela veio há 23 anos do Estado
de Michoacán, no centro do
país, para tentar chegar aos
EUA. Ficou em Tijuana porque
arrumou emprego. Um de seus
filhos, porém, decidiu cumprir
seu plano inicial. Saiu de casa
para cruzar a fronteira há seis
anos e Delfina diz que nunca
mais teve notícias dele.
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