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São Paulo, segunda-feira, 03 de novembro de 2003

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TURBULÊNCIA À VISTA

Empresa manteria compartilhamento de vôos com a TAM, mas as administrações seriam separadas

Varig admite criar holding em vez de fusão

DA REPORTAGEM LOCAL

Novos tempos, novas medidas. À espera, em 2003, do seu melhor resultado operacional em sete anos, a Varig mudou o discurso em relação à fusão com a TAM e espera que o governo reveja o projeto de união entre as duas empresas aéreas.
Para Luiz Martins, presidente do conselho de curadores da Fundação Ruben Berta, controladora da Varig, uma das possibilidades é a constituição de uma holding gerindo as duas empresas, que intensificaria o compartilhamento de vôos vigente desde março. Mas com administrações separadas, já que "as filosofias operacionais e a cultura das duas companhias são muito diferentes".
Martins, que ressalva que ainda não há uma alternativa definida, falou à Folha em Varsóvia, na Polônia, durante evento da companhia polonesa LOT, que recentemente se tornou a 15ª empresa aérea da Star Alliance -acordo operacional do qual a Varig faz parte. (MAELI PRADO)

Folha - Além da fusão com a TAM estruturada pelo banco Fator existem outros caminhos para a Varig?
Luiz Martins -
Esse modelo de fusão foi desenhado no início do ano, em um momento extremamente ruim e com uma situação de caixa crítica da companhia. Os credores não tinham absolutamente confiança na Varig. De lá para cá, houve o compartilhamento de vôos, que produziu benefícios para ambas as empresas e reduzimos nossos custos. O mercado melhorou significativamente, o dólar baixou, nosso endividamento também, e vamos ter em 2003 o melhor resultado operacional em sete anos. Estamos em dia com o Banco do Brasil, com a BR Distribuidora e entramos no Refis [programa do governo federal que permite o pagamento de tributos em até 180 meses]. Afastamos quase cem pilotos que tinham salários mais altos. Desde o início, a fusão foi ditada por uma necessidade de ambas as companhias, de encontrar uma solução para a guerra tarifária que o modelo de política aeronáutica permitiu acontecer. A constatação agora é de que a Varig de hoje não é a mesma Varig de março. E, naturalmente, o modelo tem de ser diferente porque é uma outra companhia.

Folha - Alguma alternativa já foi discutida com o governo?
Martins -
Não existe alternativa ainda. Isso deverá surgir após análise do BNDES [Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social]. Estamos dando toda a sinalização possível [para o BNDES] de que a Varig de hoje é diferente da do início do ano. E acredito que o banco criará uma nova percepção sobre a situação atual da Varig.

Folha - Há a possibilidade de constituir uma holding ou de intensificar o compartilhamento de vôos?
Martins -
A intensificação do "code share", com as duas empresas sob uma holding, é a possibilidade mais plausível hoje, a exemplo do que aconteceu no México. As companhias mantêm seus clientes, suas alianças, seus programas de fidelidade mas trabalham sob um comitê de gestão que administra a capacidade de sinergia entre as empresas.

Folha - Dentro dessa possibilidade, haveria uma divisão entre as empresas sobre os vôos nacionais e internacionais?
Martins -
A Varig tem tanto participação nacional como uma marca no setor internacional. Isso deve ser estudado tecnicamente. Ainda é cedo para começar a estabelecer proporções, mas o conceito é de que se aproveite o que de melhor cada companhia pode dar. A TAM poderia, eventualmente, compartilhar os vôos internacionais com a Varig. Não haveria uma união societária entre as duas empresas, mesmo porque os grupos são diferentes, as filosofias operacionais e a cultura das duas companhias são diferentes.

Folha - O governo é o principal incentivador da fusão. Essa percepção de que as duas companhias vivem um momento diferente é compartilhada pelo governo?
Martins -
Vejo que o governo tem alguma dificuldade para perceber isso. Esperamos que o BNDES encontre uma fórmula diferente. O único credor que tem nos ajudado é a Infraero [Empresa Brasileira de Infra-Estrutura Aeroportuária], apesar de estarmos em dia com o BB e com a BR Distribuidora. Essas entidades deveriam nos dar crédito normal em transações. A Varig não quer dinheiro, quer crédito para poder girar como um negócio.

Folha - O sistema de administração da Fundação Ruben Berta é criticado, encarado como um modelo que privilegia interesses políticos em detrimento de interesses financeiros. O sr. concorda com isso?
Martins -
Um modelo onde o trabalhador tenha a prioridade do negócio é muito mais complicado, mas muito mais legítimo. É um modelo onde os funcionários se sentem representados. Mas isso permite um instrumento de auto-regulação que funcionou este ano. Trocamos toda a cúpula da empresa porque não concordávamos com a forma como as coisas estavam funcionando.

Folha - A Apvar (Associação dos Pilotos da Varig) está propondo uma alternativa ao modelo de fusão. Existiriam investidores interessados em entrar no capital da empresa. Essa seria uma opção?
Martins -
A Apvar já comprou várias bandeiras furadas. Hoje congrega 400 sócios. Desses, 200 não concordam com a posição da associação. Dos 200 que sobram, 60 foram demitidos da Varig. O BNDES já disse, no passado, que é um plano inconsistente, mas eles continuam sustentando essa proposta através da mídia.

Folha - A qualidade do serviço prestado pela Varig ao consumidor piorou neste ano. Esse é o ônus da reestruturação da empresa?
Martins -
O serviço piorou em todas as empresas por causa das restrições econômicas. Isso não aconteceu apenas na Varig. Todo mundo está apertando o cinto.

Folha - Qual o impacto sobre o mercado gerado pelas companhias de baixo custo, como a Gol?
Martins -
Tem de haver lugar para o "low cost", "low fare", mas quem quer pagar menos [pelo bilhete] deve se sujeitar a outras condições, como ir para aeroportos menores ou ter horários específicos para os vôos. É utopia vender filé mignon a preço de banana. Enfrentar uma companhia de baixo custo operando no mercado mais rentável, como Cumbica [SP], é um caso único no mundo.


A repórter MAELI PRADO viajou à Polônia a convite da Star Alliance


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