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OPINIÃO ECONÔMICA
Bengalada no PIB
GESNER OLIVEIRA
Evitando palavrões em homenagem ao Dia da Família, é possível imaginar o seguinte
diálogo entre um assessor e um
ministro da área econômica na
primeira vez em que circulou
dentro do governo a notícia de
que o PIB caiu 1,2% no terceiro
trimestre deste ano.
Ministro: "Quanto deu o PIB?".
Assessor: "menos 1,2%".
Ministro: "Você quer dizer
mais 1,2%? Que boa surpresa!".
Assessor: "Não, ministro. A taxa foi negativa, mesmo".
Ministro: "Mas isso é a taxa
anualizada. Quanto deu no trimestre?".
Assessor: "Não, ministro. Essa
foi a taxa no trimestre. O senhor
quer que divulgue a taxa anualizada?".
O diálogo foi encerrado abruptamente, e a grande repercussão
que o número gerou nas últimas
48 horas é conhecida. Isso em
uma semana em que o segundo
quadro político mais importante
do partido do governo foi cassado e em que um ônibus repleto de
passageiros foi brutalmente incendiado, causando a morte de
cinco pessoas.
Alguém pode argumentar corretamente que um dado para um
único trimestre não deveria gerar
tanta celeuma. É verdade. Não se
pode extrapolar um número referente a um único período, especialmente quando a estatística
está sujeita a revisões, como é o
caso das contas nacionais do IBGE.
Infelizmente, o governo não
costuma ter esse cuidado. Quando o PIB registrou recuperação
no último trimestre de 2003, o
presidente anunciou com grande
estardalhaço que o país estava
prestes a assistir ao "espetáculo
do crescimento".
Mas não foi só o presidente. No
parágrafo 15 da ata do Copom de
março de 2004, referente à reunião de 16 e 17 daquele mês, observou-se que, "... a partir do segundo semestre de 2003, iniciou-se um processo de recuperação,
um crescimento de 1,5% no quarto trimestre em relação ao trimestre anterior, o que equivale a
uma taxa anualizada de pouco
mais de 6%". Para exaltar os melhores resultados da economia,
várias autoridades passaram a
anualizar as taxas trimestrais.
De fato, a anualização da taxa
trimestral de 1,5% resulta em
uma taxa anual de 6,1%. Analogamente, uma próxima (naturalmente hipotética) ata do Copom deveria assinalar que, "...a
partir do terceiro trimestre de
2005, iniciou-se um processo de
queda, um declínio de 1,2% no
terceiro trimestre em relação ao
trimestre anterior, o que equivale
a uma taxa anualizada de -4,7"!
Uma queda dessa ordem de
magnitude constituiria recessão
grave, apenas comparável ao que
ocorreu no início dos anos 90, durante o governo Collor, após o
confisco da poupança e em meio
a um processo hiperinflacionário.
Ao fazer um exercício de projeção para os próximos meses, não
faz sentido extrapolar o declínio
do terceiro trimestre. Alguns dos
fatores que influenciaram a queda da produção não estarão mais
em operação. É certamente o caso do ajustamento de estoques da
indústria, que já surtiu efeito sobre a atividade. Ou ainda dos
efeitos causados pela fase mais
crítica da crise política, que, ao
contrário daquilo que se propagandeava à época, afetou as expectativas de consumidores e investidores.
Tampouco faz sentido negar o
efeito negativo que a overdose de
juros provocou sobre a economia.
E menos sentido ainda projetar
um cenário róseo de crescimento
sustentado para os próximos
anos. É preciso lembrar que a demanda externa, que tem sido a
mola propulsora do crescimento
dos emergentes, não é eterna. E
que as variáveis estratégicas para
a expansão de longo prazo têm
registrado desempenho preocupante. É o caso do investimento,
que voltou a acusar queda no terceiro trimestre (de -0,9%).
O balanço de final de ano é duro para antigos campeões do
crescimento como o Brasil. É duro também para o primeiro campeão brasileiro, o glorioso Atlético Mineiro, rebaixado para a segunda divisão. Uma volta para a
primeira divisão exigirá trabalho
sistemático e estratégia. Não é
por acaso que o Brasil está em último lugar entre os emergentes
em termos de crescimento.
Gesner Oliveira, 49, é doutor em economia pela Universidade da Califórnia
(Berkeley), professor da FGV-EAESP, presidente do Instituto Tendências de Direito e Economia e ex-presidente do Cade.
Internet: www.gesneroliveira.com.br
E-mail - gesner@fgvsp.br
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