São Paulo, sábado, 03 de dezembro de 2005

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OPERAÇÃO SAGITÁRIO

Enquanto policiais chegavam ao Stand Center, comerciantes fechavam estabelecimentos, em "efeito-dominó"

Lojista monta esquema para evitar ação da PF

DA REPORTAGEM LOCAL

Um esquema de "segurança" dos lojistas do Stand Center foi acionado assim que parte dos 700 agentes do fisco e da Polícia Federal começou a chegar, por volta das 10h de ontem, ao local, na avenida Paulista. Enquanto policiais subiam as escadas para o segundo andar do prédio, as portas-sanfona dos boxes eram fechadas como num "efeito-dominó".
"Aqui é assim. Quando o primeiro box lá da ponta fecha, é como se uma sirene de perigo tivesse sido ligada. Todos têm de fechar", diz T.C., 27, funcionária do local. "Quem não fecha dança."
Lacrados com cadeados, os boxes foram abertos, um a um, a partir das 11h30, com o uso de alicates como os usados pela Eletropaulo para fazer reparos e cortar a energia de inadimplentes. Equipes de fiscais da Fazenda de São Paulo e da Receita Federal se revezavam na apreensão do material.
O clima nos dois andares do Stand Center era de assombro. "Nunca vi nada igual. Há uns três meses os fiscais vieram, verificaram nossa documentação, mas não fizeram apreensão de mercadorias", diz a dona de um box de perfurmaria, que preferiu não se identificar. Ela contou que estava sem inscrição estadual porque a administração não forneceu documentos necessários referentes ao IPTU para abrir sua empresa.
"Empregamos nove pessoas em dois boxes, pago R$ 6.000 para ter a minha loja e agora vamos pagar pelos erros dos outros? Isso não é justo. A minha documentação estava em processo de regularização. Mas a minha mercadoria é vendida com nota. É legal", disse a comerciante, chorando, enquanto observava os fiscais apreenderem os produtos de seu box.
Na praça de alimentação do centro comercial, vários estrangeiros -chineses, coreanos e alguns japoneses- carregavam malas de mercadoria e tomavam café, na tentativa de despistar os fiscais. "Estou a passeio. Não falo português", dizia um deles. Minutos mais tarde, a reportagem verificou que o suposto consumidor era um lojista que vendia roupas aparentemente falsificadas.
Um depósito de mercadorias -com duas salas, de respectivamente seis metros quadrados e dez metros quadrados- foi encontrado escondido no centro comercial. Nessa área, havia várias caixas de uísque, monitores de computadores e perfumes. Pertencia a uma lojista do Stand Center, que não quis se identificar. "Tenho nota, tenho nota", gritava a comerciante chinesa enquanto os auditores verificavam a mercadoria. À Folha, os fiscais afirmaram que as notas apreendidas eram aparentemente frias -adquiridas de empresas de fachada para "esquentar" a mercadoria contrabandeada e/ou pirateada.
A maior parte dos funcionários dos boxes trabalha das 10h às 20h, sem registro em carteira e tem salário entre R$ 350 e R$ 500. "Trabalho em uma loja de DVD há quatro meses, mas sem registro. Vendemos uma média de 30 a 40 cópias prensadas ou gravadas, piratas mesmo", diz R.S., 17. "Faz sucesso por causa do preço." Um jogo para o videogame PlayStation 2, com preço original de R$ 250, custa R$ 10 no Stand Center.
No escritório da administração, policiais conseguiram salvar arquivos dos computadores que estavam sendo apagados. O shopping era vigiado por um sistema profissional de vigilância. Policiais disseram que mais de 50 câmeras monitoravam o local.
"A vigilância era eficiente, por isso a ação da fiscalização e de policiais podia ser detectada tão facilmente e comunicada aos lojistas", disse Carlos Fernando Lopes Abelha, delegado da PF.

Disfarce
A Folha apurou que agentes da Fazenda de São Paulo visitaram os 220 boxes do Stand Center durante 30 dias, como consumidores, para detectar as irregularidades praticadas no local.
Enquanto a polícia arrombava os estandes, vários consumidores tentavam entrar no local. "É a primeira vez que venho aqui e encontro essa bagunça? Se tem sonegação, tem de ter prisão. Pergunto: por que só aqui?", questionava o aposentado Pascoal, 76.
Funcionárias de uma empresa de processamento de dados A.S., 28, e T.M.A., 28, diziam que não se importavam em comprar produtos falsos. "Tanto faz com nota ou sem. O que importa é o preço." (CLAUDIA ROLLI E FÁTIMA FERNANDES)

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