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Indústria editorial não tem visão", afirma Livraria Cultura
À frente de uma rede que cresce 29% ao ano e irá inaugurar sua maior loja, com 4.000 m2, em SP, Pedro Herz diz que editoras não tratam o livro como negócio
MARCELO SAKATE
DA REDAÇÃO
Prestes a inaugurar no Conjunto Nacional, em São Paulo, a
maior loja da livraria que se tornou uma rede, a Cultura, 59,
afirma que cresce apesar do
mercado editorial brasileiro.
A crítica é do paulistano Pedro Herz, 66, dos quais 37 à
frente da Livraria Cultura. "A
indústria editorial é defasada.
Há muito tempo é assim."
Herz reclama que falta visão
à indústria editorial nacional.
Diz que ela não trata o livro como negócio, pouco aposta em
marketing e depende muito de
compras governamentais.
E não se trata de avaliação
conjuntural, motivada por episódio recente. Ele se recorda da
criação da loja virtual. "Quando
lançamos o site [em 1995], pedimos aos editores que nos enviassem textos sobre os livros.
Mas, no início, demoravam para mandar [as informações],
leitores reclamavam. No exterior, a prática já era comum."
O filho de dona Eva, a fundadora da Cultura numa época
em que o serviço consistia apenas no empréstimo de livros,
não deixa, porém, de reconhecer os próprios erros, explicitados quando busca explicar por
que a livraria tem crescido.
"Fomos obrigados a fechar as
filiais nos anos 70 e 80. A que
abrimos na estação São Bento
[do metrô paulistano] tinha 40
m2. Nunca havia no estoque o
que o cliente queria", recorda.
Aprimorar o serviço tornou-se uma obsessão.
A unidade prevista para fevereiro reflete esse pensamento.
Substituirá as quatro lojas do
Conjunto Nacional -a primeira aberta em 1969- e terá auditório, restaurante do grupo
Viena e espaço para exposições, no local onde, por quatro
décadas, funcionou o Cine Astor. Serão 4.000 m2, ou cem vezes o tamanho da antiga filial.
As demais cinco unidades da
rede, todas em shoppings, foram inauguradas nos últimos
seis anos, um ritmo acelerado
para uma livraria que teve um
único ponto até 2000 -as quatro lojas do Conjunto Nacional
são consideradas uma só unidade. Visão, entretanto, não
compartilhada pelo livreiro.
"Não é acelerado. A estrutura é a mesma para todas as lojas
e nos permite crescer", insiste
Herz. Segundo ele, condições
de negociação de despesas
mais favoráveis explicam o início das operações da Cultura
em shoppings, em 2000.
Já a opção por lojas maiores
é definida pelo livreiro como
"uma questão de mais espaço
físico para os clientes".
Mas pode ser também uma
questão de sobrevivência. "As
livrarias que não se modernizaram, com um número maior de
títulos, a criação de sites ou no
atendimento, por exemplo, fecharam. Foi o que ocorreu com
muitas pequenas livrarias de
bairro", avalia Eduardo Yasuda, presidente da ANL (Associação Nacional de Livrarias).
O diagnóstico se aplica ao
mercado dos últimos anos, mas
evidencia também em que bases a Cultura se sustentou.
Marketing emocional
Uma delas é a tecnologia,
presente, por exemplo, no cadastro informatizado com dados de mais de 950 mil clientes,
que permite ações direcionadas para fidelizar o leitor. É a
estratégia definida como "marketing emocional" por Sérgio,
35, o primogênito de Pedro.
Ele e o irmão, Fábio, dois
anos mais novo, ajudam o pai a
administrar a Cultura desde o
início dos anos 90, quando ela
já gozava de prestígio entre autores e intelectuais, mas deixava a expansão de lado.
"Não somos anunciantes.
Não acho que se conquista leitores pela mídia", diz Herz.
Além da falta de apreço a esse
marketing, ele se diz cético
quanto à eficácia de práticas como descontos agressivos ou
parcelamentos sem juros.
"Acho que há outros fatores
para os quais o leitor dá importância além do preço", diz. É
uma alusão ao orgulho da família, o atendimento qualificado,
que possa orientar o leitor. É o
outro alicerce da expansão.
O processo de admissão inclui de prova de conhecimentos
gerais à aprovação do candidato pelos funcionários que já trabalham em uma loja. "Como a
remuneração é coletiva, ninguém vai querer alguém sem
qualificação", diz Herz.
Os métodos pouco ortodoxos
na gestão do capital humano se
refletem na sala que o livreiro
ocupa no 11º andar de um edifício na avenida Paulista.
Ele tem como companhia
pouco mais de uma dezena de
jovens de calça jeans e camiseta, que trabalham no núcleo de
atendimento ao site, na ante-sala. Não há secretária, só uma
telefonista para o andar.
"Para quê secretária? Eu
mesmo marco meus compromissos", conta Herz enquanto
mostra o palmtop que utiliza
para organizar sua agenda.
O mesmo raciocínio é aplicado nos negócios. Em vez de
contratar uma construtora para a futura unidade no Conjunto Nacional, a família Herz decidiu montar uma equipe própria de engenharia, que terceiriza o serviço. A decisão traz
economia e flexibilidade para
alterar projetos, diz Sérgio.
Não que a rede esteja em má
situação financeira. Neste ano,
o faturamento deve chegar a R$
151 milhões, alta de 26% em relação a 2005. Desde 2001, a expansão média anual tem sido
de 29%. Já o mercado editorial,
no mesmo período, cresceu a
um ritmo médio de 4,5%.
As perspectivas favoráveis
-o cronograma prevê uma unidade nova por ano até 2010-
levam Pedro Herz a não se
preocupar em planejar com
exatidão o futuro. Ele diz apenas que o caminho é a profissionalização da gestão.
"Já decidimos que a geração
familiar [à frente da Cultura]
acaba aqui. Está nos estatutos.
Não quero meus netos envolvidos. Talvez entre um sócio ou
podemos abrir o capital."
Tais mudanças, porém, não
ocorrerão tão cedo. "As perspectivas são favoráveis nos próximos anos. Não temos por que
pensar nisso agora."
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