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OPINIÃO ECONÔMICA
O Brasil deve apoiar Argentina
PAULO NOGUEIRA BATISTA JR.
A argentina atravessa um
período crítico nas suas relações com o FMI e os credores. Precisa do apoio do Brasil. E o Brasil
não deve se omitir.
A parceria com a Argentina tem
um significado estratégico para o
Brasil, e vice-versa. Entre argentinos e brasileiros há muitas convergências e semelhanças. Temos
também diferenças marcantes
-inclusive de temperamento.
Mas até as diferenças nos aproximam, pois constituem motivos de
curiosidade e interesse.
O brasileiro talvez seja um dos
povos mais pragmáticos do mundo, com tudo que isso tem de positivo e negativo. Desse pragmatismo resulta, entre outras coisas, a
nossa célebre tendência à conciliação. Na Argentina, o pragmatismo é mercadoria muito escassa, e a confrontação, bem mais
comum do que a conciliação.
Os rompantes argentinos exasperam os brasileiros, até mesmo
os mais temperamentais. Certa
vez, Maria da Conceição Tavares,
espantada com alguma extravagância da Argentina, exclamou
com aquela veemência que lhe é
peculiar: "Esses argentinos são
uns românticos alemães!".
Não faz mal. Entre o "romantismo alemão" dos argentinos e o
nosso pragmatismo conciliador
encontraremos -quem sabe?-
um ponto intermediário benéfico
para os dois países.
Faço essas considerações a propósito da nova rodada de embates entre o governo Kirchner, os
credores externos e o FMI. Nesta
semana e na próxima, temos três
acontecimentos importantes.
Primeiro: em Washington, a direção do FMI começou ontem a
apreciação da segunda revisão do
acordo com a Argentina. Dessa
revisão depende o desembolso da
próxima parcela do empréstimo
negociado no ano passado. A decisão pode demorar.
Segundo: na próxima terça-feira, dia 9, vencem US$ 3,1 bilhões
de uma dívida da Argentina com
o FMI. O governo Kirchner avisou
que adiará o pagamento até receber uma indicação clara de que a
segunda revisão do acordo será
aprovada pelo FMI. A Argentina
conta com o desembolso vinculado a essa revisão para evitar que o
pesado pagamento de terça-feira
provoque a corrosão das reservas
internacionais do país.
Terceiro: na quarta-feira, dia
10, Kirchner chega a São Paulo
para um encontro com Lula. A finalidade é definir uma abordagem comum para as relações com
os organismos financeiros internacionais, dando seqüência ao
entendimento a que chegaram os
dois presidentes em recente encontro em Caracas.
Cenário armado, portanto. Na
Argentina, é o tema do momento
-com riscos e abismos para "romântico alemão" nenhum botar
defeito. No Brasil, o assunto ainda não despertou a atenção da
opinião pública.
O problema central, como se sabe, é a renegociação da dívida argentina com credores privados. O
Fundo está sendo utilizado pelos
países desenvolvidos como instrumento para pressionar a Argentina a fazer propostas mais flexíveis
aos detentores dos títulos em moratória. Por enquanto, o governo
argentino vem resistindo com firmeza -ameaça estender a moratória ao FMI, se esse organismo
continuar funcionando como
agência de cobrança de dívidas
privadas. Um argumento que reforça a posição argentina, ainda
não contestado pelo Fundo, é que
todas as metas de política econômica do acordo foram cumpridas,
o que justificaria uma rápida
aprovação da segunda revisão.
Enquanto Kirchner lança os
seus desafios e enfrenta ruidosamente os credores e o FMI, Lula
faz o seguinte gesto, tipicamente
brasileiro: convida o diretor-gerente do Fundo, Horst Köhler
(um alemão nada romântico),
para um churrasco em Brasília...
Churrasco na Granja do Torto e
"Crepúsculo dos Deuses" em Buenos Aires. Durante o tal churrasco, no último domingo, a Argentina foi certamente um tema. Anteontem, Lula deu outro passo: telefonou para Bush pedindo que o
caso argentino seja reconsiderado. É preciso levar em conta, teria
dito o presidente brasileiro, que o
governo Kirchner vem atuando
com seriedade e responsabilidade
no manejo das contas públicas.
Parece que o governo Lula resolveu não repetir o vexame que
deu na crise anterior entre o governo Kirchner e o FMI, em setembro do ano passado. Na hora
H, o presidente brasileiro se fez de
desentendido e praticamente sumiu do mapa. A Argentina acabou levando a melhor naquele
confronto com o Fundo, mas a
omissão de Lula em momento tão
crítico desgastou a sua relação
com Kirchner e gerou dúvidas sobre a solidez da aliança entre os
dois governos.
Agora, o Brasil está se antecipando aos fatos e vem se mostrando mais presente e ativo, sem
fugir ao seu estilo conciliador. Veremos nos próximos dias se o
apoio brasileiro à Argentina ficará a altura dos acontecimentos.
Paulo Nogueira Batista Jr., 48, economista e professor da FGV-EAESP, escreve
às quintas-feiras nesta coluna. É autor
do livro "A Economia como Ela É..." (Boitempo Editorial, 3ª edição, 2002).
E-mail - pnbjr@attglobal.net
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