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OPINIÃO ECONÔMICA
JK e a Índia
GESNER OLIVEIRA
Todo emergente é invejoso. É da natureza do emergente. É natural que outros países
emergentes mirem com inveja o
acordo nuclear entre Índia e Estados Unidos. Não pela substância
do tratado, que ainda precisa ser
aprovado pelo Congresso dos
EUA e está sujeito a críticas de
mérito. Mas pelo reconhecimento
do peso da Índia na ordem mundial. Algo que os países latino-americanos -e o Brasil em particular- perderam em diferentes
momentos do século passado.
Daí a nostalgia de alguns emergentes. O Brasil apareceu para o
mundo muito antes da Coréia, da
China ou da Índia. O período de
Juscelino Kubitschek ficou retido
na memória nacional como uma
fase de avanço em direção ao desenvolvimento em um regime democrático. Uma fase em que o refinamento e a explosão criativa
da bossa-nova e de talentos do futebol como Pelé foram revelados
para o mundo.
A era JK marcou um salto qualitativo no crescimento da indústria brasileira. Segmentos inteiros
foram criados em material de
transporte, mecânica e material
elétrico sob a forma de substituição de importações. Tal processo
acarretaria custos e ineficiências
do ponto de vista estático. Porém,
nas circunstâncias da época, seria
difícil imaginar outra possibilidade de avanço da economia na
mesma intensidade. Vários erros
foram cometidos, em particular
em relação ao descaso com a educação e a disciplina fiscal. O principal ativo representado pelo conhecimento continuou escasso e
extremamente concentrado.
É curioso como o Brasil ignorou
solenemente a experiência de outros países. Não se criou a tradição de estudo de casos nacionais.
Nem mesmo a curiosidade intelectual de d. Pedro 2º e seu fascínio por outras culturas serviram
de exemplo. A pequena elite com
acesso à cultura tendeu sempre a
mimetizar alguns poucos centros
ocidentais e a menosprezar o resto do mundo. Chama a atenção
em particular a demora em reconhecer a importância do espanhol e em observar o que ocorre
na América Latina que não fala
português.
Enquanto isso, o mundo mudou. Chegou a fase da economia
de escala e de conhecimento em
que a capacidade de geração de
inovação é fundamental. Países
que não geram e disseminam inovações não resistem na batalha
da produtividade. Em tais circunstâncias, a Índia soube tirar
proveito da criação de centros de
excelência para pesquisa e desenvolvimento e a adoção de estímulos para empresas voltadas para o
progresso técnico. Pode-se afirmar que a Índia lançou mão das
três linguagens mais importantes
da atualidade: do inglês para o
mundo dos negócios, da tradição
em matemática e da informática.
Recordo que ainda há menos de
três anos a proposição de um
acordo de natureza acadêmica
com uma instituição indiana foi
motivo de brincadeira entre profissionais de alto nível no Brasil.
As experiências da Índia sempre
foram vistas como algo exótico no
país. Hoje, a mesma instituição
indiana é cortejada por diversas
universidades mundiais.
A Índia deu um salto e, em certo
sentido, está mais adiantada do
que a China. Ao contrário da China, não tem um enorme passivo
autoritário a ser resolvido nas
próximas décadas. Tanto a China
como a Índia apresentam problemas graves de infra-estrutura. No
caso da Índia, as deficiências são
ainda maiores do que as do Brasil.
Inveja e nostalgia não levam a
lugar nenhum. O Brasil atual precisa de uma mudança de atitude.
Primeiro, é necessário mais arrojo
e espírito empreendedor, como na
era JK (depurada, naturalmente,
da negligência com a disciplina
fiscal). Segundo, precisa se inspirar na experiência asiática e promover um salto não apenas em
capital físico, mas em capital humano. Chegou a hora de um plano de metas para a educação. Para realizar tais tarefas será preciso deixar os preconceitos (fruto da ignorância) e, com muita humildade, aprender com o resto do
mundo.
Gesner Oliveira, 49, professor licenciado da FGV-EAESP, presidente do Instituto Tendências e ex-presidente do Cade.
Atualmente, é professor visitante do
Centro de Estudos Brasileiros na Universidade Columbia (EUA).
Internet: www.gesneroliveira.com.br
E-mail: gesner@fgvsp.br
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