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Juros deverão cair, mas no longo prazo, afirma economista
Para diretor do Bradesco, grau de investimento não deve elevar entrada de dólares e déficit externo evitará alta maior do real
Octavio de Barros diz que status contribui para a menor
instabilidade, mas o que
determina crescimento é a
perseverança nas reformas
GUILHERME BARROS
COLUNISTA DA FOLHA
Na quarta-feira passada,
quando recebeu a notícia de
que a agência de classificação
de risco Standard & Poor's promoveu o Brasil a grau de investimento, o economista Octavio
de Barros, 50, diretor de pesquisas e estudos econômicos do
Bradesco, não escondeu a satisfação. Ele foi um dos poucos
analistas que mantiveram, desde o agravamento da crise internacional, no início deste
ano, a aposta de que o Brasil iria
ser promovido a grau de investimento ainda neste semestre.
Muitos analistas passaram a
acreditar que esse novo degrau
só seria atingido em 2009.
Apesar da boa notícia, Barros
não acredita que o grau de investimento vá fazer o Banco
Central baixar os juros no curto
prazo. A nova classificação só
vai ajudar o país a atingir mais
rápido uma taxa normal de juros, mas ainda vai levar um
tempo para isso acontecer.
O economista também não
acredita numa valorização expressiva do câmbio. A taxa de
câmbio, a seu ver, tende a se
manter no patamar que se encontra agora. Sua aposta é a de
um câmbio, no final do ano, a
R$ 1,75 por dólar. Leia entrevista concedida à Folha:
FOLHA - Qual é a importância do
grau de investimento para o Brasil?
OCTAVIO DE BARROS - O mais importante de tudo é que o grau
de investimento retira uma incerteza de médio e longo prazos sobre o câmbio. Historicamente, incerteza sobre o câmbio sempre foi o calcanhar-de-aquiles do Brasil. Significa que
teremos um financiamento
mais confortável do balanço de
pagamentos daqui para a frente. Para um país onde a instabilidade cambial sempre foi a origem do sobe-e-desce da economia via inflação, esse é um belo
sinal e facilita o trabalho de
combate à inflação por parte do
Banco Central.
FOLHA - Isso significa que os juros
vão cair?
BARROS - Os juros futuros mais
longos já estão caindo. O mercado se dá conta de que o câmbio tende a deixar de ser um fator de pressão inflacionária como foi a vida toda. Além disso,
seria impensável que o Brasil,
classificado como grau de investimento, mantenha-se durante muito tempo com juros
reais de segundo maior país do
mundo, atrás apenas da Turquia. Não faz o menor sentido.
FOLHA - O Banco Central já pode
pensar em queda de juros?
BARROS - Claro que não no curto prazo. Não tem nada a ver o
trabalho do BC com a minha
convicção de que a taxa de juros
vai cair para padrões normais
no médio e longo prazos. A obtenção do grau de investimento
vai acelerar o processo de convergência para a normalidade.
FOLHA - Mas o Banco Central não
poderia fazer um ajuste menor do
que planejava?
BARROS - O BC vai fazer o possível para não correr o risco de
jogar fora todo um esforço desses últimos anos. As pessoas
têm que entender que uma das
razões, talvez a mais importante, para a promoção do Brasil a
grau de investimento foi justamente a autonomia do Banco
Central para zelar pela estabilidade monetária. O grau de investimento premiou uma construção monetária bem-sucedida, dentro de um regime de metas de inflação que completará
dez anos no ano que vem. É um
privilégio ter um Banco Central
cuidando de forma autônoma
do combate à inflação. O presidente Lula sacou isso bem antes de muita gente. A autonomia do Banco Central se fortalece com a obtenção do grau de
investimento.
FOLHA - Até quanto os juros ainda
podem subir neste ano?
BARROS - Nem mesmo os diretores do Banco Central devem
saber. Tudo vai depender de como a evolução corrente da inflação afetar as expectativas
dos formadores de preços e de
salários neste momento em
que há um furor remarcatório
com base no aumento de custos
vindos de fora. Acho que o Banco Central vai ter que aumentar
o tom para inibir os formadores
de preços a repassarem 100%
dos custos importados. Minha
intuição é a de que a inflação de
2008 não é mais uma grande
preocupação do BC. Algo pode
ser feito apenas do ponto de
vista das expectativas. A próxima reunião já terá influência na
demanda de 2009. Se eu fosse
banqueiro central, faria tudo
para evitar que as expectativas
da inflação para 2009 não desgarrassem do centro da meta de
4,5%. Já em relação à inflação
de 2008, não há muito a fazer.
Até que o Brasil não vem se
saindo tão mal neste ano em relação aos outros países até mais
maduros institucionalmente
do ponto de vista de autonomia
de bancos centrais.
FOLHA - Existe o risco de o real se
valorizar muito depois do grau de
investimento?
BARROS - Câmbio é balanço de
pagamentos, e não um princípio vago de que vamos ter uma
avalanche de dólares. Eu não
acredito em avalanche de dólares. O Brasil já está caro, 80%
do grau de investimento já era
previsto. Neste momento, a novidade já está toda no preço dos
ativos. As empresas listadas em
Bolsa no Brasil estão mais caras
do que as mexicanas, por exemplo. É claro que sabemos que
tudo que é bom aprecia câmbio.
Tudo que implica um país mais
confiável para financiamentos
e investimentos atrai capitais.
Neste momento, acho que vale
mais o sinal do déficit em transações correntes de US$ 23 bilhões que estimo para este ano.
Representa 1,4% do PIB. A mudança foi muito rápida. Mesmo
sabendo que a causa dessa deterioração é o ritmo da demanda doméstica, e não a taxa de
câmbio, tenho para mim que os
formadores de preços no mercado de câmbio não tratarão isso de forma irrelevante, apesar
de o grau de investimento significar que esse déficit terá financiamento confortável.
Além disso, o dólar no mundo
tende a se fortalecer um pouco
ante o euro e a outras moedas e
isso provoca um pequeno ajuste para baixo no preço das commodities. Em outras palavras,
acho que a taxa de câmbio real
tende a se manter próxima do
patamar onde está. Ainda prevejo um câmbio de final de ano
de R$ 1,75.
FOLHA - O Banco Central vai ser
obrigado a comprar mais moeda para reservas?
BARROS - A ação no câmbio só
pode ser a de suavizar movimentos bruscos. Ele não pode
mudar o rumo da história. Felizmente ou infelizmente, em
regime de câmbio flutuante,
não nos é dado o direito de termos preferências a respeito de
taxa de câmbio. Qualquer intervenção mais brusca só tem
efeitos temporários.
FOLHA - Alguns consideram que o
grau de investimento vai trazer
mais investimento especulativo. O
sr. concorda?
BARROS - Não faz nenhum sentido. É justamente o oposto.
Éramos considerados "investimento especulativo", agora somos "investimento não-especulativo". O grau de investimento favorece muito também
o investimento com perspectiva de longuíssimo prazo.
FOLHA - Que influência o grau de
investimento terá no crescimento
econômico?
BARROS - O grau de investimento é o próprio atestado de
que o PIB potencial brasileiro
aumentou. É o resultado de um
processo cumulativo de 15 anos
de políticas macroeconômicas
que poderíamos classificar como decentes. Apesar dos erros,
dos equívocos, das omissões e
dos apagões, o Brasil acertou
muito mais do que errou nesse
tempo. O grau de investimento
contribui para a menor volatilidade da economia e, conseqüentemente, para maior previsibilidade e maior produtividade. Dá para fazer planos,
olhar dez anos à frente. Poderia
dizer que o grau de investimento favorece, mas não determina
um crescimento maior. O que
determina um crescimento
maior é a perseverança nas reformas e não perder nunca o
sentido de urgência. Para 2008,
sigo com 4,8% de crescimento
do PIB, e, para 2009, 4,5%.
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