São Paulo, terça-feira, 04 de junho de 2002

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LUÍS NASSIF

Uma política ruinosa

O avanço institucional e econômico do país exige honestidade dos críticos, na avaliação dos avanços obtidos nos últimos anos, mas visão crítica de todos, sobre os equívocos cometidos pelo governo FHC, para não ficar escravo dos próprios erros.
No segundo semestre de 1994, a então equipe econômica transformou a política cambial em bandeira para se manter no poder. Na tentativa de torpedear a indicação de José Serra, a então equipe econômica espalhava aos quatro ventos que a mudança da política cambial explodiria o país.
Os argumentos ganharam vida própria, apesar de o próprio "pai" do Real, Pérsio Arida, estar trabalhando na revisão da política cambial até a sua queda, em abril de 1995. O não-reconhecimento do erro cometido deu sobrevida ao erro.
Está se repetindo o mesmo erro com a questão fiscal do governo FHC. O primeiro passo para uma avaliação isenta é considerar o que deveria ser o objetivo de uma política fiscal: a melhoria das condições econômicas e sociais do país, e não o mero equilíbrio das contas públicas, que é meio, não fim. E esses objetivos não foram alcançados, muito pelo contrário.
A primeira falácia é considerar que a dívida pública cresceu em razão do reconhecimento de esqueletos fiscais de outras instâncias administrativas, e não por conta da combinação juros-câmbio do período.
As taxas de juros praticadas não afetaram apenas os títulos federais novos, mas todo o estoque de passivos da economia -públicos (em todas as esferas) e privados. É só avaliar o que era a dívida de São Paulo no início do governo Mário Covas e quando ocorreu a incorporação dos esqueletos, um aumento extraordinário, mesmo com a obtenção dos superávits primários pelo governo paulista. É só avaliar o que ocorreu com o FCVS. Em um exemplo hipotético, a dívida pula de 10 para 50 por conta dos juros. Aí o governo federal assume os 50 e joga todo esse montante na conta dos esqueletos fiscais incorporados à divida da União. Ora, desse total, há 40 que foram resultado direto da política monetária em vigor e não são considerados como tal.
Mais que isso. Políticas monetária e cambial têm efeito direto sobre a economia e um efeito não menos relevante sobre as expectativas dos agentes públicos e privados. A falsa euforia criada pela apreciação do câmbio induziu a maioria dos agentes econômicos a apostar na manutenção das taxas de crescimento do primeiro ano do Real. As grandes empresas fizeram superinvestimentos (vide setor automobilístico), as pequenas se endividaram e o setor público aumentou as despesas, confiando no aumento auto-sustentado da atividade econômica.
Todos dançaram. O setor público se inviabilizou com os níveis de arrecadação então existentes, devido às dificuldades legais para comprimir despesas.
Em vão o então ministro do Planejamento, José Serra, tentou convencer FHC e a equipe econômica a modificar os indexadores de passivos públicos, desatrelando-os das taxas de mercado.
A segunda falácia é a de que, a partir de 1999, a administração pública passou a praticar políticas fiscais saudáveis. A Lei de Responsabilidade Fiscal é avanço relevante, obrigando os governantes a se ater ao que arrecadam. Só que o equilíbrio fiscal foi feito em cima de uma derrama fiscal sem precedentes, afetando insumos básicos da economia, como telecomunicações e energia elétrica. O "milagre fiscal" brasileiro, no âmbito dos Estados, deu-se em cima do aumento do ICMS sobre energia e eletricidade, insumos básicos da economia. No âmbito da União, em cima de novas fontes de arrecadação.
O Estado se fortaleceu neste período, mas a nação murchou. Quebradeira, inadimplência, aumento do desemprego, queda de renda, incapacidade de retomar o crescimento -essas são as consequências dessa política desastrosa.
A bandeira relevante não é mais a do equilíbrio fiscal, e sim do equilíbrio fiscal com controle de despesas e limites para aumento de tributos, além da criação de indicadores que monitorem a aplicação dos recursos.

E-mail - lnassif@uol.com.br



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