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São Paulo, quarta-feira, 04 de junho de 2003

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Opção por título seca crédito bancário

MARCELO BILLI
DA REPORTAGEM LOCAL

Quase um terço -27%- dos recursos que os bancos detêm e que poderiam se transformar em operações de crédito para as empresas e consumidores brasileiros é aplicado em títulos públicos. Para empréstimos e financiamentos, sobra apenas outro terço, cerca de 29%. O resultado: o Brasil é um dos mercados em que os bancos menos emprestam dinheiro para o setor privado.
Comprar um título público é sinônimo de emprestar para o governo, que paga hoje 26,5% de juros ao ano. É uma operação de risco baixo. Além disso, é mais fácil financiar um grande devedor que tem R$ 644 bilhões em títulos na praça do que gerenciar milhares de pequenas e médias operações.
"É um lucro mais ou menos fácil. Os bancos não precisam sequer disputar clientes", diz Miguel de Oliveira, da Anefac, associação de executivos de finanças.

Exigências
Parte dos recursos vai obrigatoriamente para as mãos do governo. Os bancos precisam cumprir exigências de liquidez -ou seja, ter ativos que podem, rapidamente, ser transformados em moeda- e um dos papéis mais líquidos são os títulos do governo.
Algumas operações de captação, como a poupança, também exigem que parte dos recursos seja aplicada em títulos da dívida pública. Ou seja, a própria regulação do setor financeiro obriga os bancos a aplicarem parte do dinheiro que arrecadam em títulos.
Mas, diante de uma economia estagnada, com índices de inadimplência crescentes e renda em queda, as instituições preferem deixar os recursos de que dispõem em títulos, e a proporção do ativo que poderia virar crédito fica ainda menor.
"Parte deste tipo de aplicação é uma decisão dos bancos, mas parte ocorre por conta das normas a que eles estão sujeitos. Na prática, o governo garante a procura e bons preços para os seus títulos", diz Alfredo Penteado Moraes, vice-presidente da Andima (Associação Nacional das Instituições do Mercado Financeiro).
O governo, explica Moraes, acaba competindo com empresas e consumidores pelos recursos dos bancos. E leva vantagem. Como é um grande devedor e oferece um ativo relativamente seguro, abocanha boa parte das carteiras das instituições. O resultado é que o dinheiro disponível para crédito é escasso e, portanto, o preço de crédito -os juros pagos pelos empréstimos-, alto.
"Apesar de todo o debate sobre crédito e sobre a necessidade de elevar o volume de crédito, a questão acaba se resumindo a preço", diz Moraes. Ele explica: como os juros são altos, seja porque sobra pouco dinheiro para o setor privado, ou porque o Banco Central mantém a taxa básica da economia em níveis elevados, poucas pessoas ou empresas se aventuram a recorrer ao crédito.
"Quem faria algum investimento com dinheiro de banco no Brasil? Ninguém. Que tipo de operação pode render mais do que os juros cobrados pelas instituições?, questiona Moares.
Oliveira, da Anefac, concorda. Mas faz a ressalva de que parte dos juros elevados viram lucro fácil para os bancos. Do "spread bancário" -a diferença entre as taxas a que os bancos captam dinheiro e as taxas a que eles o emprestam-, 40%, diz, correspondem à margem de lucro das instituições.


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