São Paulo, domingo, 04 de junho de 2006

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LUÍS NASSIF

A saga de Álvaro Alberto

O desenvolvimento da moderna pesquisa tecnológica brasileira está associado à energia nuclear

O DESENVOLVIMENTO da moderna pesquisa tecnológica brasileira está diretamente associado à energia nuclear. Nos anos 70, o início do programa nuclear Brasil-Alemanha levou o então secretário da Tecnologia do governo Figueiredo, José Israel Vargas, a montar os primeiros programas sistemáticos de qualidade. O fracasso do programa levou o CNEM (Conselho Nacional de Energia Nuclear) a montar uma parceria inédita com a universidade e, por meio do Ipen (Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares), a controlar o processo de enriquecimento do urânio. No início dos anos 50, foi a busca do domínio sobre a energia nuclear que levou o governo a criar o CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico) e entregar seu comando ao almirante Álvaro Alberto. Naqueles anos, o Brasil esteve a ponto de ter seu primeiro reator atômico, uma história ainda pouco conhecida. A Guerra Fria já começara quando Álvaro Alberto esteve nos EUA. Uma sucessão de acordos militares mal explicados tinha conferido aos americanos o monopólio sobre a pesquisa de minerais brasileiros. Na época, Álvaro Alberto havia enviado minérios brasileiros à França, na esperança de conseguir o apoio dos franceses ao projeto nuclear brasileiro. Quando a informação vazou, provocou enorme reação de Washington. Em sua visita aos EUA, Álvaro Alberto havia se avistado com o "pai" da bomba atômica americana, o físico Robert Oppenheimer. Os acordos firmados com os EUA garantiam ao Brasil a entrega de alguns reatores pequenos, apenas para pesquisa de laboratório. O conselho de Oppenheimer havia sido outro: "No Brasil, não há o que discutir (...) Tem que fazer logo o reator atômico", disse-lhe o físico. Sugeriu a construção de um reator simples. "Deixem essa história de reator experimental e façam um reator desse tipo, porque servirá de escola para vocês". Seguindo a sugestão, e ante a resistência dos EUA em fornecer tecnologia, Alberto encomendou à Alemanha três unidades de ultracentrifugadores (sistema para enriquecer urânio). Isso foi em princípio de 1954. As tropas de ocupação da Alemanha não autorizaram a venda. Tempos depois, restabeleceu-se a soberania da Alemanha. Mas um documento do governo americano ao brasileiro, que permaneceu sob sigilo por algum tempo, encerrou as negociações. Apesar de o equipamento claramente não poder ser utilizado para fins bélicos, o documento dizia que "o estabelecimento no Brasil de um processo de extração de urânio físsil (...) poder ser considerado uma ameaça potencial à segurança dos EUA e do hemisfério Ocidental". Foram necessários quase 50 anos para recuperar o terreno perdido e dominar o ciclo de enriquecimento de urânio. Mas as sementes plantadas por Alberto já tinham encontrado terra fértil na pesquisa brasileira.
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A partir deste domingo, entro na chamada blogosfera. Pelo endereço www.luisnassif.com.br, o leitor poderá acessar o blog no UOL. Aos domingos, no blog, estarão de volta as crônicas musicais, pesquisas históricas e reminiscências; durante a semana, economia e política.


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