São Paulo, domingo, 04 de agosto de 2002

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EM TRANSE

Déficit financeiro de junho, dado mais recente, foi de US$ 4,2 bilhões, pode ter sido maior em julho e derrubou o real

Fuga de dólar é a maior desde a máxi de 99

FABRICIO VIEIRA
DA REPORTAGEM LOCAL
NEY HAYASHI DA CRUZ
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

O déficit financeiro (saída de dólares) do país em junho foi o maior desde a maxidesvalorização do real, em janeiro de 1999, embora desta vez a natureza da crise seja diferente. Em vez de apenas remessas de dólares, o que pressiona o balanço financeiro é o pagamento de dívidas, que não puderam ser roladas devido à seca de dólares para o país.
"É muito provável que o resultado das remessas ao exterior em julho [que o BC vai divulgar nos próximos dias] supere os números de junho. A tensão no mercado cresceu consideravelmente", afirma Eduardo Berger, economista do banco Lloyds TSB.
O resultado negativo de junho, de US$ 4,2 bilhões, é a diferença entre os dólares que entraram e saíram por meio de operações financeiras -como empréstimos, pagamentos de dívidas e remessas de lucros e dividendos. Em janeiro de 99, a saída superou a entrada em US$ 6,7 bilhões.
O aumento do desequilíbrio deu combustível à escalada do dólar e fez a moeda dos EUA atingir níveis recordes nos últimos dias.
O fechamento das linhas de crédito no mercado internacional para o Brasil teve efeito decisivo para o quase recorde de junho. Empresas endividadas tiveram grandes dificuldades para rolar suas dívidas no exterior e tiveram de comprar dólares para quitar grande parte delas.
O resultado foi a queda brutal no nível de rolagem de vencimentos externos privados em junho, que ficou em 22%. No ano passado, as empresas conseguiram rolar mais de 95% dos vencimentos. Os descontos dados por credores para pagamentos antecipados de dívidas privadas também alimentaram o aumento de remessas para o exterior.
De resto, a saída de recursos por meio de contas CC-5 (contas de pessoas ou empresas residentes ou instaladas no exterior) também cresceu no mês. Em junho, as remessas para o exterior por esse canal totalizaram US$ 605 milhões. Apenas nos 12 primeiros dias do mês passado, saíram US$ 690 milhões por meio das CC-5.
O instrumento costuma ser bastante utilizado em momentos de maior nervosismo, pois não é preciso informar ao BC o motivo da remessa. Basta que o destinatário dos recursos seja identificado.
"A demanda por dólares cresceu muito e deu fôlego para a disparada da moeda. Além de as empresas não estarem conseguindo novos empréstimos, é normal que em um momento de maiores incertezas, como o atual, as matrizes solicitem um envio maior de lucros em vez de de reinvestir por aqui", diz Berger.

Desequilíbrio
Nas operações cambiais que envolvem o comércio exterior, o saldo tem sido positivo. Ou seja, tem havido mais vendedores de dólares (os exportadores) que compradores (os importadores). Em junho, os exportadores venderam US$ 6,1 bilhões, enquanto a compra feita pelos importadores ficou em US$ 2,8 bilhões.
"O problema é que não há equilíbrio entre a demanda e a oferta de dólares no mercado. O dinheiro que os exportadores levam ao mercado não tem sido suficiente para compensar a busca crescente de dólares por parte das empresas", afirma Fernando Coelho, economista da ABM Consulting.
A concentração de vencimentos neste mês deve manter a pressão no mercado de câmbio e o forte déficit nas operações financeiras. Dos US$ 6,4 bilhões em dívidas de bancos e empresas que vencem no exterior até o fim deste ano, segundo levantamento da Folha, 30% do total (ou US$ 2 bilhões) são neste mês. "A tensão, e consequentemente o aumento de saída de recursos e a alta do dólar, podem ainda se intensificar até as eleições presidenciais [em outubro]", afirma o economista Vladimir Caramaschi, da Fator Doria Atherino.
No mês passado, segundo o BC, as operações de câmbio financeiras estavam negativas em US$ 878 milhões até o dia 12. Segundo informações do mercado, o resultado negativo já havia crescido para US$ 1,5 bilhão até o dia 15. Nas últimas semanas do mês, a alta do dólar ganhou considerável força.
A moeda dos EUA chegou a ser negociada a R$ 3,61 na última quarta, para fechar vendida pelo preço recorde de R$ 3,47. Analistas afirmam que o esperado acordo financeiro com o FMI pode acalmar um pouco o mercado.


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