São Paulo, domingo, 04 de agosto de 2002

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ANÁLISE

O otimismo do consumidor norte-americano está em teste

ALAN BEATTIE
DO "FINANCIAL TIMES"

Para um grupo cuja reputação é de inatividade, a equipe econômica de Bush ganhou vida, subitamente, nesta semana. A notícia de que a produção dos EUA se reduzira mal chegara às Bolsas quando Paul O'Neill, o secretário do Tesouro, Lawrence Lindsey, assessor econômico da Casa Branca, e Ari Fleischer, o porta-voz de Bush, surgiram para garantir que a recuperação seguia nos trilhos.
Por trás desse surto de energia está o medo de que pelo quase congelamento dos mercados de capitais e por um devastador ataque terrorista nos últimos cinco anos, os consumidores norte-americanos caiam agora vítimas da correção nos preços das ações.
A preocupação é que os consumidores decidam olhar de maneira crítica suas dívidas e optem por apertar os cintos.
A regra de cálculo usada pela administração é que cada dólar de declínio no patrimônio acionário reduz em três a cinco centavos de dólares o consumo. A queda no patrimônio acionário americano em junho e julho foi de cerca de US$ 1,6 trilhão, o que implica queda de 0,5% a 0,8% no crescimento do PIB dos EUA em alguns anos.
Além do mais, os efeitos talvez sejam menores do que supõem os cálculos. O crescimento do consumo nos anos 90 não acompanhou o ritmo das Bolsas, o que implica que os domicílios não acreditaram que seus ganhos patrimoniais fossem permanentes.

Reequilíbrio
Um risco maior seria o de que a queda das ações cause um reequilíbrio mais acentuado dos orçamentos, com as famílias cortando gastos para pagar suas dívidas.
Mesmo admitindo um ou dois efeitos que deprimiram a produção, os dados divulgados na semana passada demonstram que o risco cresceu. O consumo caiu muito no segundo trimestre de 2002 e não há sinal de recuperação que supra essa lacuna. As pesquisas sobre a confiança dos consumidores mostraram quedas pesadas e inesperadas.
A esperança das autoridades é que qualquer queda no consumo seja registrada ao longo de cinco anos, prazo suficiente para que as empresas voltem a investir. Mas o mais recente Livro Bege, uma série de indicadores circunstanciais compilados pelo Fed, sugere que, por enquanto, não há sinais sérios de que o investimento empresarial cubra a lacuna.
Até agora, a despeito dos números sobre o PIB divulgados na semana passada não existe evidência de que os domicílios estejam se comportando de maneira diferente na presente situação.

Compressão de crédito
Jonh Lonski, economista-chefe da Moody's, descarta a possibilidade de uma compressão de crédito no setor empresarial. O maior problema, diz, está na procura, e não na oferta.
Assim que os consumidores decidirem, como as empresas, não gastar mais não há o que as autoridades possam fazer a respeito.
E vem daí o claro esforço dos animadores de torcida do governo, que querem convencer os consumidores a gastar. Em público, o governo segue expressando confiança em que os domicílios não reagirão à turbulência.
Peter Fisher, subsecretário do Tesouro norte-americano, diz que "os EUA são uma coleção de 280 milhões das mais otimistas pessoas do mundo".
Mais meses de más notícias poderiam abalar esse otimismo.


Tradução de Paulo Migliacci

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