São Paulo, quarta-feira, 04 de agosto de 2004

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COMÉRCIO

Negociação será retomada

Amorim espera UE mais flexível com o Mercosul

CLÓVIS ROSSI
COLUNISTA DA FOLHA

O chanceler Celso Amorim acredita que o acordo fechado sábado na OMC (Organização Mundial do Comércio) poderá ter efeito positivo na negociação entre o Mercosul e a União Européia, interrompida há duas semanas, em Bruxelas, mas que será retomada a partir de segunda-feira, em Brasília.
Não se trata de nenhuma informação, mas de um raciocínio empírico, assim formulado: a agenda européia estava sobrecarregada, na medida em que o conglomerado discutia muitas concessões ao mesmo tempo na área agrícola.
Estabelecidas as concessões no âmbito multilateral (o da OMC), ficaria em tese mais fácil atender a demanda do Mercosul, que está centralizada precisamente na área agrícola.
Mas o ministro é o primeiro a dizer que não há relação entre um resultado e outro. Recorre até a uma comparação que lembra seus tempos de presidente da Embrafilme: "Ganhar o Oscar ajuda a ganhar o Festival de Cannes? Pode até ajudar, mas o resultado na OMC é um valor em si".
Ter ganho o Oscar parecia ser o estado de espírito do chanceler durante o almoço que lhe oferecido ontem em São Paulo pelo Iedi (Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial), centro de estudos empresarial que poderia ser considerado a ala esquerda dos homens de negócio, se é que existe.
Tanto aos empresários como aos jornalistas, Amorim vendeu o resultado na OMC como extraordinário, a ponto de dizer que os ganhos de US$ 10 bilhões para o Brasil, que previra na véspera, são um cálculo "para baixo; acho que vai ser muito mais que isso".
O acordo alcançado sábado abre de fato o caminho para a redução do protecionismo agrícola dos países ricos, mas os detalhes ainda serão negociados. Tanto é assim que o exuberante otimismo de Amorim não o impediu de admitir que "é um pouco difícil prever exatamente" o quanto o Brasil se beneficiará do pacote agrícola.
De todo modo, o ministro vê dois tipos de lucro: o político e o econômico. O político está dado pelo fato de que "mudou o equilíbrio de forças (na OMC), graças ao G20", o grupo criado por iniciativa de Brasil e Índia e que luta para derrubar o protecionismo agrícola dos países ricos.
Já o ganho econômico, além dos US$ 10 bilhões (ou mais), "vai se fazer sentir muito antes das medidas entrarem em vigor", calcula o chanceler. Ele acredita que a eliminação dos subsídios agrícolas, embora não tenha data marcada, fará com que, desde já, "os investidores pensem se é melhor investir em açúcar de beterraba ou em outras áreas mais produtivas".
Não por acaso, a Europa é a grande produtora de açúcar de beterraba, com pesados subsídios.
Na negociação com o Mercosul, o açúcar é um dos itens para o qual não foi feita oferta de cota (embora tenha sido para o etanol, também produto da cana-de-açúcar). O fato de as cotas serem reduzidas, divididas em duas etapas (uma agora e outra depois de terminada a negociação na OMC) e, ainda por cima, distribuídas ao longo de dez anos, emperrou a negociação com o Mercosul.
O discurso otimista do ministro foi comprado com entusiasmo pelo Iedi ou, ao menos, por seu presidente, Ivoncy Ioschpe, a ponto de ter dito aos jornalistas que, "pela primeira vez, o Brasil passou a defender os interesses nacionais".
Não é pouca coisa, se se lembrar que o empresariado, de modo geral, apoiou o governo anterior (de Fernando Henrique Cardoso) e tem (ou tinha) histórica antipatia pelo PT.


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