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ENTREVISTA
EDEMIR PINTO
Após fusão, Bolsa brasileira dá início à expansão global
BM&F Bovespa vai propor parcerias a Bolsas da Colômbia, do Chile e do Peru para dupla listagem de empresas
A NOVA BOLSA brasileira, surgida da fusão
entre a BM&F (Bolsa de Mercadorias e Futuros) e a Bovespa (Bolsa de Valores de São
Paulo), é a terceira maior do mundo em valor de mercado e deseja ocupar um lugar entre as principais praças de negociação de produtos financeiros
que existirão no futuro. Segundo especialistas, serão
três: uma na América do Norte, uma na Europa e outra congregando os países hoje emergentes.
DENYSE GODOY
DA REPORTAGEM LOCAL
A estratégia da companhia
para ganhar a importância que
os analistas vislumbram para
ela começa na América Latina.
Como explica Edemir Pinto, diretor-geral da BM&F alçado há
dois meses ao posto de diretor-presidente da nova Bolsa, aquisições estão fora dos planos.
Pelo menos por enquanto. A
idéia é compartilhar com as
Bolsas do Peru, do Chile e da
Colômbia os conhecimentos
brasileiros em gerenciamento
de risco e regulação e propor a
listagem de empresas desses
países na BM&F Bovespa. "O
que temos que fazer é criar um
grande mercado aqui na América do Sul e na América Central, e a BM&F Bovespa tem tudo para ser esse centro de liquidez", disse Pinto em entrevista
exclusiva à Folha. Parcerias semelhantes com a Argentina e o
México virão depois.
A seguir, os principais trechos da entrevista.
FOLHA - Em que estágio se encontra o processo de união das duas Bolsas?
EDEMIR PINTO - Quando começamos a integração, propusemos,
como benefício para os acionistas, uma economia de 25% com
as sinergias, o que equivale a
cerca de R$ 125 milhões, distribuídos até 2010. Não se trata de
fazer uma conta simples, de
dois mais dois são quatro, depois divide por dois, porque
muitos setores são complementares, já que os produtos
das duas Bolsas são diferentes.
Em 1º de setembro, teremos o
desenho definitivo da estrutura
funcional da nova companhia.
Contratamos uma consultoria
para esse estudo, a McKinsey,
cuja tarefa acaba em três semanas. Depois de mais umas duas
semanas, saberemos o quanto
será reduzido na diretoria, na
gerência e entre os demais funcionários. O critério que vai
prevalecer é o da qualidade
profissional. Naturalmente, o
corte de despesas não será feito
somente com pessoal, mas
também em tecnologia e outras
áreas.
FOLHA - Sempre se falou que, após
a fusão, a cultura da BM&F predominaria sobre a da Bovespa. Isso está sendo observado agora?
PINTO - Tanto a Bovespa como
a BM&F tiveram a sua história
de sucesso. Agora, temos que
escrever uma nova história. A
nova Bolsa vai ter a cara dela.
FOLHA - Já começaram as negociações com as Bolsas do Chile, do Peru
e da Colômbia para as parcerias que
darão início à expansão internacional da Bolsa brasileira?
PINTO - No nosso plano, a América Latina é prioridade. A Bolsa não vai jogar dinheiro pela
janela. Como dissemos aos nossos acionistas, não é questão de
comprar. O que temos que fazer é criar um grande mercado
aqui na América do Sul e na
América Central, e a BM&F Bovespa tem tudo para ser esse
centro de liquidez. Devemos
sair a campo no final deste mês,
fazendo uma abordagem simultânea nos três países. Em
um segundo momento, falaremos com México e Argentina.
FOLHA - Como, exatamente, funcionarão essas parcerias?
PINTO - A idéia é conversar
com as Bolsas e com as autoridades de regulação locais para
ajudá-los a desenvolver seus
mercados. Não que sejam incapazes, mas a BM&F Bovespa
tem condições de oferecer-lhes
seu "expertise" em gerenciamento de risco, tecnologia, trading eletrônico e de viva-voz. O
segmento que abordaremos de
forma agressiva é a dupla listagem das companhias abertas. O
que nos dá uma diferença é o
Novo Mercado, uma grife de
padrão internacional. Não temos, em nenhum desses países,
um mercado tão organizado. Se
fizermos esse centro de liquidez na América Latina, não vai
acontecer como no passado,
quando muitas empresas listaram seus papéis nas Bolsas
americanas e européias. Estamos estudando inclusive introduzir no mercado de BDRs
[Brazilian Depositary Receipts] algumas práticas semelhantes às do Novo Mercado.
FOLHA - Esses planos são para ocupar mesmo o posto de terceira Bolsa
mais importante no mundo?
PINTO - Ela já é a terceira maior
Bolsa em valor de mercado, e
faz tempo.
FOLHA - Sim, em valor de mercado
a Bolsa já é a terceira maior, mas esse critério é suficiente para definir a
sua relevância global?
PINTO - A BM&F Bovespa custa hoje US$ 17 bilhões, enquanto a Nyse [Bolsa de Nova York]
Euronext custa US$ 12 bilhões.
O valor de mercado da Bolsa
brasileira reflete o potencial de
crescimento da companhia. As
economias européia e americana são amadurecidas, e as Bolsas, nesses continentes, não
têm muito mais o que crescer
em termos de volume.
FOLHA - Depois das parcerias na
América Latina, quais serão os passos seguintes?
PINTO - Ainda não estamos
pensando nisso. Porém, depois
que faz uma expansão dessa natureza, a Bolsa se globaliza de
vez. Hoje em dia, a globalização
é feita por meio de plataformas
eletrônicas, a exemplo do acordo que selamos com a CME
[Bolsa Mercantil de Chicago],
que está entrando em vigor em
setembro. Nossos produtos estão distribuídos atualmente em
760 terminais. A partir do mês
que vem, estaremos em 100 mil
terminais em 80 países, em
quatro continentes.
FOLHA - Do que mais a Bolsa precisa?
PINTO - Precisa do desenvolvimento do país. Não chega a
20% do PIB [Produto Interno
Bruto] o volume negociado no
nosso mercado de capitais.
FOLHA - Como o sr. vê a economia
brasileira nos próximos anos?
PINTO - Acho que estamos com
uma prova nos nossos olhos.
Essa crise, se fosse no passado,
pegava a gente em cheio. Você
vê que o país mudou. Parece
que, de fato, houve um "descolamento". A economia dos EUA
não está em recessão, mas a desaceleração é fato, e não está
acontecendo absolutamente
nada com o Brasil. A nossa economia está no rumo. Ou seja, é
questão de acreditar que o país
está "descolado". Precisamos
dessa crença para continuar
impulsionando nosso mercado.
O governo brasileiro está de parabéns, com mão-de-ferro para
segurar a economia nos trinques. É um diferencial.
FOLHA - Há analistas fazendo previsões sombrias para o final do ano,
na expectativa de que o Fed, o banco central americano, voltará a aumentar os juros por causa da inflação. A Bolsa corre o risco de enfrentar problemas sérios se isso realmente vier a acontecer?
PINTO - Estou há 23 anos no
mercado financeiro. Já vi juro
subir e juro cair que não acaba
mais, tanto aqui como lá fora.
Não tem nenhuma crise que
não acabe. Acho que subir juro
e cair juro faz parte da administração dos países.
FOLHA - Os EUA agora estão pensando em estabelecer novas regras
para a negociação de commodities a
fim de coibir a especulação. Seria necessário tomar alguma medida também no Brasil?
PINTO - Os estragos nos mercados americanos ocorreram nos
mercados de balcão [onde ativos são negociados sem passar
pela Bolsa], que não são regulados lá fora. Aqui no Brasil o
Banco Central e a CVM [Comissão de Valores Mobiliários]
dão show. Temos balcão e Bolsa
completamente organizados,
regulados e auto-regulados.
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