São Paulo, terça-feira, 04 de agosto de 2009

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VINICIUS TORRES FREIRE

"O petróleo é nosso", a lei é deles



Lula quer enviar ao Congresso a lei do pré-sal já, aprová-la sem contestação maior e "ir logo para o abraço da galera"


APÓS UM ano de conversas fechadas no governo, não seria nenhum inconveniente que as leis sobre a exploração do petróleo e o uso dos recursos do pré-sal merecessem ao menos um mês de discussão aberta no país. Mas o governo Lula avisou ontem que, apresentados aos ministros, no dia 17 ou 18 deste mês, tais projetos vão logo seguir para o Congresso, a fim de serem votados com urgência. "O petróleo é nosso", mas a lei é deles.
Claro, não se trata de decreto-lei ditatorial. Na tramitação, talvez algum debate público haja. Mas é de esperar que a prioridade urgente, urgentíssima, dos nobres parlamentares seja: 1) resolver interesses de suas "bases", Estados etc.; 2) fazer acertos com financiadores de campanha; 3) trocar dificuldades na tramitação por facilidades e favores federais; 4) contrabandear incisos e parágrafos que beneficiem este ou esse interesse menor. A ordem das prioridades varia de acordo com o perfil do parlamentar ou bancada.
Da parte de Lula, o interesse é o de evitar ao máximo a contestação de seu projeto e aprová-lo rapidamente o bastante para colocar logo na rua a propaganda nacionalista-estatista que ornamentará a campanha de Dilma Rousseff. Não que o governo tenha convicção nacionalista-estatista ou qualquer outra. Mas tal trololó pega bem no eleitorado, vide a campanha de 2006, quando Lula nocauteou o pobre Geraldo Alckmin ao enfiar no tucano a carapuça de "privatista".
Atônito e igualmente sem convicções, Alckmin se deu até ao ridículo de se fantasiar com broches de empresas estatais a fim de negar o rótulo pespegado por Lula. Do ponto de vista do interesse público (e não o das empresas ou o do petismo-lulismo), muito pouco quer dizer que o sistema será de "partilha", que haverá uma estatal nova e um fundo para gerenciar o dinheiro do petróleo.
Apesar da propaganda dos lobbies privatista e estatista, os modelos de exploração de petróleo pelo mundo são variadíssimos, e não são tais definições genéricas que determinam seu sucesso ou fracasso. No entanto, caso o pré-sal seja de fato um poço de ouro, os detalhes da nova lei do petróleo determinarão distribuições de renda e efeitos macroeconômicos que afetarão a vida de gerações. Está em jogo a definição, constitucionalmente controversa, do privilégio a uma empresa mista, privada e estatal, a Petrobras.
Ou o privilégio à indústria nacional de equipamentos, o que pode ser útil ou redundar em reserva de mercado que atrasará e/ou tornará menos eficiente a extração do petróleo. Muito importante, está em jogo a criação de um sultanato político-petrolífero, barões que decidirão o destino de bilhões de reais e de empresas, talvez de forma arbitrária. Estará em causa a definição da autoridade sobre o destino de recursos que podem afetar a fundo a política econômica e social.
O "Fundo de Desenvolvimento Social", que em tese recolherá os recursos petrolíferos, pode ter mais recursos livres que os do Orçamento da União. A que normas e fiscalização estará sujeito? Quem será seu gestor de fato? A quem beneficiará? Que distorções macroeconômicas pode causar, se largado na mão da política politiqueira? O governo Lula deu ontem a entender que pretende evitar ao máximo tal discussão. Quer a lei dele.

vinit@uol.com.br


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