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ANÁLISE
A crise de crédito vai crescer
WOLFGANG MUNCHAU
DO "FINANCIAL TIMES"
"Operações financeiras não se prestam a inovações. Aquilo que
costuma ser recorrentemente descrito e celebrado por esse termo representa quase sem exceção uma
pequena variação sobre uma forma estabelecida. O mundo das finanças saúda vezes sem conta a invenção da roda, mesmo que muitas vezes as versões novas sejam um
pouco mais instáveis". John Kenneth Galbraith, em "A Short History of Financial Euphoria"
O ECONOMISTA John
Kenneth Galbraith,
que morreu no ano
passado, teria apreciado o verão (no hemisfério Norte) deste
ano. Ele não era especialista
nos modernos mercados de
crédito, mas sua análise de bolhas históricas se enquadra ao
atual momento de expansão e
contração com alta precisão.
Todas as bolhas históricas
vieram acompanhadas de uma
alta acentuada no endividamento. Um traço saliente das
modernas bolhas é o surgimento de produtos financeiros inovadores. Não importa que estejamos falando de "junk bonds"
ou das obrigações de dívida
caucionada (CDOs) modernas.
Como diz Galbraith, esses produtos se resumem a variantes
da idéia de papéis de dívida lastreados por ativos reais.
Em termos históricos, nossa
bolha de crédito é provavelmente uma das maiores, dado o
tamanho imenso do mercado e
o grau de euforia que caracterizou os estágios finais da expansão. Embora as conseqüências
negativas inicialmente se devam concentrar no setor financeiro, seria surpresa não contagiarem a economia. A oferta de
crédito afeta os preços dos imóveis, e estudos mostram a interconexão entre os preços das residências nos EUA e o crescimento econômico do país.
Assim, o que os bancos centrais deveriam fazer? Suspeito
que não devam exercer papel
central em qualquer operação
de resgate, função que cabe aos
governos. E o espaço de manobra dos BCs em relação a corte
os juros é mais restrito, agora,
do que na última recessão.
Além disso, o mais importante é que não se trata do tipo de
crise que possa ser contida com
facilidade com cortes apressados de juros ou resgate a bancos. Caso o valor da hipoteca de
risco, ou "subprime", de um
imóvel exceda em 10% ou mais
o seu valor de mercado, e caso a
prestação mensal exceda a renda do devedor, não há taxa de
juros que sirva de alívio, mas
um esforço sério de redução ou
perdão de dívidas.
Os economistas Dimitri Papadimitriou, Greg Hannsgen e
Gennaro Zezza publicaram na
semana passada um estudo no
qual demonstravam o risco de
que a atual crise no setor imobiliário representa para o crescimento econômico dos EUA.
Eles argumentam que é quase
impossível que as autoridades
detenham o declínio nos preços dos imóveis, mas que "se o
BC e o Congresso puderem agir
para impedir qualquer recessão incipiente, eles impedirão
perdas de empregos, um dos
principais fatores determinantes na execução de hipotecas
por inadimplência. Um método
efetivo seria um esquema de
garantia de emprego, sob o qual
o governo ofereceria trabalho a
todos que desejassem".
Devemos recordar que o
"subprime" não é a única subcategoria instável do mercado
de crédito. Assim que o consumo americano se desacelerar,
devemos nos preparar para
uma crise nos CDOs de cartões
de crédito e de financiamento
de automóveis. E assim que o
número de falências de empresas voltar a subir, à medida que
o ciclo avança em seu período
de baixa tanto nos EUA quanto
na Europa, provavelmente ouviremos falar de mais problemas com dívidas. O mercado de
crédito é muito profundo e de
alto potencial de contágio.
As autoridades fiscais e monetárias devem portanto presumir que terão de enfrentar
uma crise de solvência. Resgatar um banco avulso, como os
alemães fizeram no mês passado, não será suficiente.
Em lugar disso, as autoridades fiscais e monetárias deveriam estar prontas a apoiar a
economia se e quando necessário. Juros mais baixos devem
ser parte do pacote, nos EUA e
na zona do euro, mas boa parte
da ajuda terá de ser fiscal.
Um dos problemas que as autoridades monetárias precisam
enfrentar é o do risco moral.
Ele resulta de expectativas assimétricas, já que os mercados
esperam que os BCs resgatem o
setor financeiro em períodos
de crise. O problema do risco
moral em certa medida se relaciona ao da estratégia de política monetária dos BCs, com seu
foco mecanicista em um índice
único de preços ao consumidor.
Essas estratégias muitas vezes
não têm espaço para preços de
ativos, mas os mercados sabem
bem que os bancos centrais invariavelmente precisam levar
em conta os preços dos ativos,
em períodos de queda acentuada. Uma maneira de escapar a
essa assimetria é a inclusão dos
preços dos ativos nas normas
de formação de política monetária dos BCs.
Assim, uma operação de resgate ao setor financeiro pode
ser inevitável, mas deve vir
acompanhada de mudanças estruturais. Regulamentação financeira mais forte é provável.
O papel das agências de classificação de crédito deve mudar. E
os BCs deveriam reconsiderar
suas normas de política monetária. São parte do problema.
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