São Paulo, domingo, 04 de outubro de 2009

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China amplia comércio com a AL e compete com o Brasil

Potência asiática já está entre principais parceiros das maiores economias da região

Para Antonio Barros de Castro, do BNDES, sede chinesa por commodities e avanço tecnológico recente mudam a economia global

CLAUDIA ANTUNES
DA SUCURSAL DO RIO

Apesar de anúncios bilionários de investimentos, boa parte deles ainda não concretizada, é através do comércio que a China aumenta sua penetração na América Latina.
Além de ter se tornado neste ano o maior sócio individual do Brasil, posto antes ocupado pelos EUA, desde 2000 a China subiu degraus para ficar entre os cinco primeiros parceiros comerciais de países como Argentina, Chile, Peru, Venezuela, Colômbia e México, segundo dados que a Cepal (Comissão Econômica para a América Latina) acaba de compilar.
É a quarta onda da expansão comercial chinesa, que começou nos anos 80 na própria Ásia, varreu os EUA, atingiu a África e só agora bate com força na América Latina.
Ela chega quando os chineses buscam fornecedores alternativos de energia, minérios e comida, ao mesmo tempo em que os produtos que exportam estão muito mais sofisticados do que o trio camisetas-sapatos-bugigangas de há duas décadas.
Por isso, enquanto as importações chinesas de soja e ferro são um alívio para a balança comercial brasileira, os manufaturados chineses ameaçam tomar o espaço do Brasil na vizinhança latino-americana, que compra cerca de 20% das exportações nacionais, 88% em bens industrializados.
O fenômeno já começa a ser detectado na Argentina e deve crescer com a entrada em vigor, no próximo ano, do Tratado de Livre Comércio entre China e Peru. Diferentemente do TLC de 2005 com o Chile, restrito a bens, o acordo com o Peru inclui serviços -como obras públicas-, hoje plataformas de exportação para a indústria brasileira.
"O grande risco da China é a disputa por terceiros mercados. O Brasil sofre e vai sofrer a concorrência cada vez maior de produtos chineses em seus mercados tradicionais", diz Welber Barral, secretário de Comércio Exterior do Ministério do Desenvolvimento.

"Dragõezinhos"
Os números têm de ser olhados com cuidado: os chineses estão longe de dominar o mercado latino-americano. Os EUA ainda são o maior parceiro da região (37% do fluxo total), até em função de acordos de livre comércio antigos com México, Chile, países centro-americanos e caribenhos.
Mas a vantagem chinesa é a constância do crescimento de suas trocas com a América Latina, ressalta Mikio Kuwayama, da Divisão de Comércio Internacional da Cepal. Elas foram as menos abaladas pela crise e passaram, nos últimos quatro anos, de 4% para 10% do total.
Além dos dados conjunturais, porém, o movimento de fundo é a entrada do Brasil e de seus vizinhos, já como "retardatários", no "sistema mundial sinocêntrico", diz Antonio Barros de Castro, assessor da presidência do BNDES.
Barros de Castro prepara para o governo Lula um estudo sobre as perspectivas da economia brasileira, que incluirá o pré-sal e o fator China. Ele compara o impacto da ascensão chinesa à ruptura ocorrida quando os Estados Unidos substituíram a Inglaterra como centro capitalista do planeta.
Se a metrópole britânica comprava matérias-primas e vendia manufaturas, os EUA, com abundantes recursos naturais, acabaram provocando a queda dos preços de produtos agrícolas e combustíveis. Na América Latina, a resposta a isso foi a industrialização pela substituição de importações.
Agora, com a China importando commodities, os latino-americanos têm de se readaptar para não andar para trás. Para países industrializados, como o Brasil, o desafio é ainda maior por causa do que Barros de Castro chama de "dragõezinhos", a nova geração de empresas chinesas que combinam alta tecnologia com processos de produção tayloristas, devido à pressão por emprego do 1,4 bilhão de chineses.
O economista dá o exemplo da BYD, que começou numa velha fábrica de automóveis de Cantão, tomou o mercado japonês de baterias de lítio e está fazendo carros elétricos. Originalmente acrônimo de Buy Your Dollar (compre seu dólar), a BYD agora convida o consumidor a Buy Your Dreams (compre seus sonhos). "É o tecnobrega explodindo."
É essa virada tecnológica à chinesa, com produção em grande escala e câmbio controlado, que preocupa José Augusto de Castro, vice-presidente da AEB (Associação de Comércio Exterior do Brasil): "Enquanto a balança comercial tiver su- peravit, todo mundo diz que vai tudo bem, mas pouco a pouco a China ocupa espaços".


Colaborou SILVANA ARANTES, de Buenos Aires

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