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São Paulo, terça-feira, 04 de novembro de 2003

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OPINIÃO ECONÔMICA

O risco de "desbrasileirar"

BENJAMIN STEINBRUCH

Empresas nacionais fortes, que pudessem atuar globalmente, seriam pontas-de-lança da economia brasileira. Há anos bato insistentemente nessa tecla. Em alguns setores estratégicos, que empregam muitas pessoas, como siderurgia, papel e celulose, têxtil, calçados e agrobusiness, quanto maiores forem as empresas, melhor para o país. E o ideal seria que elas estivessem estruturadas no exterior, produzindo na Europa, nos Estados Unidos e na Ásia.
Infelizmente, não temos nenhuma empresa brasileira nessas condições. Nem mesmo a Petrobras.
É um belo sonho a criação de uma grande companhia siderúrgica verde-amarela, suficientemente robusta para competir lá fora com os gigantes do aço e, ao mesmo tempo, impedir o avanço do capital estrangeiro no setor. Mas é honesto admitir que não é fácil realizá-lo. Em primeiro lugar, o governo precisaria tomar uma firme decisão de apoiar essa empreitada, que pudesse levar os vários protagonistas do plano a atuar com determinação e coragem.
O principal entrave é o elevado custo de capital existente no país. Por causa disso, as siderúrgicas brasileiras, quase sem exceção, estão desestimuladas para investir e também precisam de tempo para diluir suas dívidas.
A despeito disso, a siderurgia brasileira é hoje competitiva internacionalmente, porque acreditou no país e investiu bastante a partir das privatizações na modernização das usinas, ampliação de capacidade instalada e inovação tecnológica. Só de 1994 a 1998, as empresas investiram o equivalente a US$ 7,2 bilhões. E os investimentos continuaram nos anos seguintes, a despeito das turbulências internas e externas. Além disso, o país tem outras vantagens: abundância da principal matéria-prima setorial, o minério de ferro, e excelente localização das usinas, o que propicia uma invejável logística.
Por conta dessas vantagens, o custo de produção de aço no Brasil, de aproximadamente US$ 145 por tonelada, é um dos mais baixos do mundo. Em países da Europa e nos Estados Unidos, esse custo atinge até US$ 300.
Embora as siderúrgicas brasileiras sejam eficientes, a dificuldade de consolidação persiste porque as empresas têm características muito diferentes em vários aspectos: nos controles societários, nas condições de crédito e nos objetivos de médio e longo prazo. Cada uma a sua maneira começa a apresentar bons resultados.
Independentemente de estarem juntas ou separadas, as empresas do setor siderúrgico brasileiro precisam crescer e manter suas vantagens competitivas. É um erro estrutural facilitar a instalação de companhias estrangeiras em nosso mercado em condições diferenciadas de custo de capital e prazo de carência de financiamento, além da vantagem de poderem contar com múltiplos resultados por conta de suas diferentes operações em várias regiões do mundo, o que as torna pouco vulneráveis às instabilidades brasileiras.
É uma atitude pouco inteligente "desbrasileirar" em troca de nada setores competitivos que podem gerar empregos, renda e desenvolvimento. É descabido o BNDES financiar investimentos estrangeiros, limitando ainda mais o já restrito capital brasileiro. A fonte interna de financiamento oficial para esses grandes grupos estrangeiros precisa secar. As grandes empresas brasileiras têm tido sucesso na captação de recursos no exterior. Se elas podem buscar esses recursos lá fora para investir no país, muito mais condições têm as companhias de capital estrangeiro.
O financiamento nacional deve ser reservado a empresas pequenas e médias, que não conseguem acesso ao mercado externo. A estas é preciso oferecer crédito nacional nas mesmas condições que as concorrentes têm lá fora.
Sem dúvida, o caminho do emprego, do crescimento, do desenvolvimento e da internacionalização de nosso país passa por aí.


Benjamin Steinbruch, 50, empresário, é presidente do conselho de administração da Companhia Siderúrgica Nacional.
E-mail - bvictoria@psi.com.br


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