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DESVENDANDO 2009
Modernizando o multilateralismo
ROBERT B. ZOELLICK
EM WASHINGTON
O
ANO de 2008 será lembrado como de extraordinário tumulto.
A crise financeira surgiu nos
calcanhares das crises nos alimentos e nos combustíveis.
Agora, o mundo está em meio a
uma crise econômica que redundará em muitas perdas de
emprego. País algum escapou
incólume. Estamos entrando
em uma nova zona de perigo,
com riscos acentuados para a
exportação e o investimento,
para o crédito, os sistemas bancários, os orçamentos e os balanços de pagamentos. Em
2009 poderemos ver o primeiro declínio no comércio mundial desde 1982.
Como sempre, os pobres são
os mais indefesos. Para os países em desenvolvimento, as
condições de crédito mais severas e o crescimento muito mais
fraco significarão que os governos serão menos capazes de
atender às metas de educação e
saúde e de investir na infraestrutura necessária a sustentar o
crescimento.
Até o momento, 100 milhões
de pessoas já foram lançadas à
pobreza como resultado dos
preços altos da comida e dos
combustíveis, e as estimativas
correntes sugerem que cada
declínio de 1% no ritmo de crescimento dos países em desenvolvimento representa mais 20
milhões de pessoas na pobreza.
Os países estão tentando pôr
fim ao congelamento do crédito, escorar as instituições financeiras, reduzir as taxas de
juros, reforçar as redes de segurança e reanimar o consumo e o
investimento para estimular os
negócios, permitir que as pessoas trabalhem e firmar as fundações do futuro crescimento.
Essas medidas serão mais
efetivas se os países agirem de
modo coordenado, apoiando-se mutuamente. O nacionalismo econômico que procura extrair vantagem da desvantagem
alheia deflagrará perigos ainda
maiores. Desafios mundiais pedem soluções mundiais.
Em outubro, eu apelei pela
modernização do multilateralismo e dos mercados, a fim de
que reflitam melhor as mudanças na economia mundial e permitam que os países ajam de
maneira coordenada a fim de
enfrentar problemas interconectados. Para que possamos ir
além do velho sistema do Grupo dos 7 (G7), é preciso uma
abordagem do século 21 para o
multilateralismo, por meio do
dinamismo propiciado por
uma rede flexível, e não de novas hierarquias e de um sistema
fixo ou estático.
O novo multilateralismo deve maximizar as vantagens dos
agentes e instituições sobrepostos e interdependentes,
tanto públicos quanto privados. Deve ir além da concentração tradicional nas finanças e
comércio externo e incluir outras questões econômicas e políticas prementes: desenvolvimento, energia, alterações climáticas e estabilização dos Estados frágeis e daqueles que estão saindo de períodos de conflito. É preciso aproximar as
instituições internacionais
existentes, com seus conhecimentos e seus recursos, para
reformá-las quando necessário, e encorajar cooperação efetiva e ação coordenada.
O multilateralismo, em sua
melhor forma, é um meio de resolver problemas entre países,
e o grupo que participa das discussões deve estar disposto a
tomar medidas construtivas
em conjunto. É preciso que sua
força -e sua legitimidade- sejam extraídas de uma participação mais ampla e de resultados mais concretos. A conferência de cúpula do G20 realizada em novembro levou à mesa pela primeira vez as potências ascendentes como participantes ativos na solução da crise financeira mundial. Elas
concordaram quanto a uma
agenda positiva, mas o verdadeiro teste será determinar se
as medidas discutidas serão implementadas.
É um passo positivo que os líderes das grandes economias
desenvolvidas agora estejam se
reunindo com os líderes das
potências econômicas ascendentes. Mas os países em desenvolvimento mais pobres
não devem ser excluídos. Não
resolveremos a atual crise, ou
colocaremos em ação soluções
de longo prazo sustentáveis, se
aceitarmos um mundo em dois
níveis. O objetivo deve ser o de
construir uma globalização inclusiva e sustentável.
Trilhões de dólares vem sendo gastos nos resgates financeiros nos países desenvolvidos.
Em comparação, cerca de US$
100 bilhões anuais são investidos agora em assistência internacional. Precisamos de um
resgate "humano" tanto quanto de um resgate financeiro.
Nesse ambiente, um compromisso mundial de fornecer assistência ao desenvolvimento
dos países mais pobres deve ter
a primazia.
No Banco Mundial, estamos
ampliando nosso apoio financeiro aos mais necessitados.
Estamos acelerando a concessão de verbas e empréstimos de
longo prazo e juro zero aos 78
países mais pobres do mundo,
metade deles na África. Os doadores no ano passado prometeram US$ 42 bilhões em três
anos para o fundo que o Banco
Mundial constituiu para esses
países, a Associação Internacional de Desenvolvimento.
Esse dinheiro é vital se queremos cumprir as Metas de Desenvolvimento do Milênio.
Além disso, a divisão de empréstimos aos países em desenvolvimento do Banco, o Bird
(Banco Internacional para a
Reconstrução e Desenvolvimento), pode assumir novos
compromissos de financiamento da ordem de mais de
US$ 35 bilhões neste ano
-quase o triplo do ano passado- e de até US$ 100 bilhões ao
ano nos próximos três anos.
O aumento foi calculado para
proteger os mais pobres e vulneráveis contra danos, para
apoiar os países que enfrentam
problemas de captação devido
ao colapso dos mercados de
crédito e para ajudar a sustentar investimentos dos quais dependem a recuperação e o desenvolvimento em longo prazo.
Nossa divisão de financiamento ao setor privado, a International Finance Corporation (IFC), está lançando ou expandindo três linhas de crédito,
que devem atingir os US$ 30 bilhões nos três próximos anos.
Elas tratarão de problemas de
alta prioridade surgidos nos últimos meses: expandir o financiamento ao comércio, recapitalizar os bancos dos países
mais pobres e sustentar o investimento em infraestrutura
ao ajudar projetos viáveis sujeitos à crise de liquidez.
Ao mesmo tempo, manteremos nossos esforços de combate à subnutrição e à fome e forneceremos energia aos pobres.
Nossos Fundos de Investimento Climático, recentemente
lançados no valor de US$ 6 bilhões, construirão experiência
prática com tecnologias, reflorestamento e adaptação para
apoiar as negociações das Nações Unidas quanto às alterações climáticas e auxiliar os
países em desenvolvimento.
Enquanto o mundo luta para
sair do buraco financeiro e econômico em que caiu, precisamos pensar no futuro. As crises
atuais refletem a velocidade assustadora do mundo interconectado. Os fatores que produzem a globalização oferecem
excelentes oportunidades de
superar a pobreza, ampliar as
oportunidades e abrir sociedades. Mas precisamos de um novo multilateralismo que expanda esses benefícios a todos.
ROBERT ZOELLICK é o presidente do Banco
Mundial. Este artigo foi distribuído pelo
PROJECT SYNDICATE.
Tradução de PAULO MIGLIACCI
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