São Paulo, quarta-feira, 05 de março de 2008

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VINICIUS TORRES FREIRE

Fed pede socorro e perdão de dívida

Bernanke sugere reestruturar débitos da casa própria e pede apoio estatal para atenuar ruína da finança imobiliária

APESAR DA carência recente de notícias sensacionais, a economia americana continua a murchar. Ontem, Ben Bernanke pediu a instituições financeiras que perdoem dívidas da prestação da casa própria. Mais: Bernanke quer que as empresas federais de securitização de dívida imobiliária expandam suas atividades a fim de aumentar o volume de financiamentos e barateá-los. Bernanke quer intervenção estatal na ruína dos imóveis.
Sim, o banqueiro central dos Estados Unidos sugeriu uma "reestruturação da dívida", um reconhecimento explícito de que o consumidor americano, movido a quase 15 anos de bolhas financeiras, quebrou. O objetivo de Bernanke seria atenuar o ciclo de despejos e de aumento do estoque de imóveis à venda, que provoca a queda de preços imobiliários, desvalorização adicional do patrimônio das famílias e, pois, desestímulo ao consumo, o que derruba faturamento e valor das empresas.
Famílias endividadas dão mais calotes, que batem no balanço dos bancos, que emprestam menos. A baixa das Bolsas, das ações, reduz mais ainda poupança, patrimônio e a propensão a consumir do cidadão. A ruína imobiliária geral afeta toda a cadeia conexa à construção civil.
O índice mais expressivo das ações americanas, o S&P 500, está no vermelho em 8,5% no ano. O lucro de 3.155 empresas americanas abertas caiu 52% no quatro trimestre de 2007 ante o mesmo trimestre de 2006. Trimestre contra trimestre do ano anterior, caíra 24% no terceiro e subira 14% e 10%, no segundo e no primeiro. O lucro das 500 empresas do S&P cairia mais 20% no primeiro e no segundo trimestres de 2008, segundo enquete da Bloomberg com analistas financeiros.
Nós com isso? A Opep deve decidir a partir de hoje que o preço de frango, xarope de milho, óleo de soja, espaguete ou algodão continuará alto no curto prazo, excluída a hipótese de um meteorito financeiro explodir um banco americano. Sim, a Opep é o cartel do petróleo.
Mas álcool é, em parte, substituto de petróleo. De milho se faz álcool. Petróleo caro aumenta a procura de milho. Nas presentes condições do comércio mundial (protecionismo agrícola) e sob a atual tecnologia, milho mais caro expulsa lavouras de soja e trigo, que expulsam as de algodão. Soja e milho alimentam "carnes". Subprodutos desses grãos, de açúcares a bioquímicos, são insumos da indústria de alimentos.
A demanda de comida, combustível e metais na "Chíndia" parece em parte ter assumido dinâmica própria. De resto, devido a especulação ou a "correção monetária", a desvalorização do dólar ajuda a inflacionar o preço de commodities. Commodities tornaram-se ainda alternativas de aplicação financeira para Bolsas em queda e juros baixos, além de meio de proteção contra a inflação (em parte causada por commodities. É uma bolha em formação?). Alimentos caros sustentam o câmbio e/ou a atividade econômica de países pobres e emergentes que os produzem. Assim, sustentam parte da demanda global, de commodities não-agrícolas ou de bens industrializados, até americanos.
Essa combinação é inédita e muito estranha: a tempestade que se arma nos EUA e a resistência da economia de pobres e emergentes.


vinit@uol.com.br

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