São Paulo, sexta-feira, 05 de maio de 2006

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

LUÍS NASSIF

A EBX e o interesse nacional

Em todo esse imbróglio boliviano, é importante não confundir o interesse nacional nem o da Petrobras com o do empresário Eike Batista, da EBX, a siderúrgica que se instalou na fronteira da Bolívia com o Brasil para produzir coque a partir do carvão vegetal.
A assessoria de Eike fez a gentileza de me remeter o relatório que supostamente atestaria a legalidade da operação de Eike na Bolívia. Pelo relatório, fica-se sabendo que a EBX se instalou em Puerto Quijarro, próximo à fronteira do Brasil.
A licença de construção foi concedida pela resolução 003 de junho de 2006 (provavelmente deve ser junho de 2005), pelo município de Puerto Quijarro, "tendo sido posteriormente encaminhada ao Ministério de Minas e, finalmente, ao vice-ministro do Meio Ambiente". Ora, o simples fato de o município encaminhar o pedido ao governo federal revela o óbvio: que ele não era a autoridade adequada para conceder a licença ambiental.
No dia 17 de janeiro de 2006 -ainda de acordo com os documentos da EBX-, Evo Morales promulgou um novo regulamento ambiental. A licença ambiental solicitada pela EBX foi rejeitada em 17 de março de 2006. Segundo o relatório, a EBX considera que o novo regulamento ambiental não é aplicável ao seu caso, pelo fato de a licença ter sido solicitada antes, em 2005. Ora, pelo próprio documento a licença não tinha sido concedida e já havia quatro fornos implantados.
Além de ter se instalado irregularmente -porque confessadamente sem licença ambiental-, em um ambiente conturbado como o boliviano, a EBX ajudou a botar coque na fornalha, jogando a Província de Santa Cruz contra o Executivo federal.
Há muitas versões sobre os métodos de Eike na Bolívia. Recebi material da imprensa boliviana remetido por jornalistas de lá e leitores de cá. São informações pesadas, mas que, em todo caso, exigiriam uma visita in loco para serem comprovadas.
Quanto ao risco Bolívia, seria relevante uma reconstituição dos passos que levaram à implantação do gasoduto. Na semana passada, o ex-embaixador Rubens Barbosa, hoje na Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo), exortou o governo a tomar uma atitude drástica para defender os interesses da Petrobras, "porque na Bolívia não há o recurso da indenização".
No primeiro governo Fernando Henrique Cardoso, ainda embaixador em Londres, Barbosa foi o grande defensor da associação da Petrobras com a British Gas, para a construção do gasoduto. Desfilou em Brasília para baixo e para cima com a belíssima lobista da British Gas.
O então ministro do Planejamento, José Serra, tentou como pôde segurar o projeto, devido à reconhecida instabilidade política e jurídica da Bolívia e pelo receio de aumentar a densidade populacional da fronteira, o que tornaria praticamente incontrolável o tráfico de drogas.
Fez mal o governo FHC em concordar com o gasoduto? Provavelmente não. A integração continental é uma inevitabilidade, que será alcançada superando episódios como esse.
É evidente que os interesses nacionais têm que ser defendidos. E só o serão adequadamente com cabeça fria e com informações suficientes para definir a estratégia de negociação.

E-mail -
Luisnassif@uol.com.br


Texto Anterior: Companhia tem autonomia, diz Lula
Próximo Texto: Tensão entre vizinhos: "Brasil não quer hegemonia, mas parceria", afirma Lula
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.