São Paulo, sexta-feira, 05 de outubro de 2007

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Americanos cobram do Brasil nova posição sobre Doha

CLÓVIS ROSSI
COLUNISTA DA FOLHA

Os Estados Unidos cobraram ontem do Brasil (e do G20, liderado pelo Brasil) uma mexida no jogo de xadrez que é a Rodada Doha de negociações comerciais, sob pena de se perder "uma oportunidade única" de fechar um acordo, no dizer de Susan Schwab, a chefe do USTr (United States Trade Representative, uma espécie de ministério do comércio exterior).
Em artigo para o jornal britânico "Financial Times", Schwab lamenta que "as economias emergentes mais avançadas" -e cita especificamente Argentina, Brasil, China, Índia e África do Sul, todos membros do G20- não tenham até agora deixado claro que vão negociar a redução de tarifas de bens agrícolas e industriais dentro dos parâmetros propostos pelos chefes dos grupos negociadores.
Para entender o xadrez, é preciso definir como o jogo está sendo jogado mais recentemente. Primeiro, havia o que Peter Mandelson, comissário europeu para o Comércio, chamava de "triângulo": os Estados Unidos deveriam aceitar forte redução nos seus subsídios internos aos produtores rurais; a própria UE cortaria as tarifas de importação de bens agrícolas; e os grandes países em desenvolvimento (os citados por Schwab) reduziriam as tarifas de bens industriais.
Como nenhuma das partes dava o primeiro passo para resolver o "triângulo", a rigor as negociações ficaram bloqueadas desde seu lançamento em 2001, na capital do Qatar.
Mas, no mês passado, os Estados Unidos finalmente fizeram a sua mexida: aceitaram reduzir os subsídios internos na faixa sugerida por Crawford Falconer, o presidente do grupo negociador de agricultura, ou seja, para entre US$ 12,8 bilhões e US$ 16 bilhões ao ano. Antes, Washington insistia em um teto de US$ 22 bilhões.

Sem intenções
No seu artigo, Schwab confirma a oferta, inicialmente anunciada por Falconer e recebida com certo ceticismo pelos parceiros norte-americanos.
Agora, ela diz que a União Européia também se moveu, em aparente menção ao fato de que os europeus já vinham se mostrando dispostos a reduzir suas tarifas em mais de 50%, o que está no parâmetro definido por Falconer.
Mas, escreve a negociadora-chefe norte-americana, "lamentavelmente, a maioria dos outros grandes parceiros ainda não declarou suas intenções. Pior ainda, alguns manifestaram indisposição para negociar de acordo com os parâmetros dos textos".
O "alguns" parece referir-se menos ao Brasil e mais à Argentina e à África do Sul, pouco dispostas a cortar suas tarifas industriais nos termos sugeridos pelo chefe do grupo negociador, o canadense Don Stephenson.
A proposta de Stephenson representaria cortar entre 55% e 60% as tarifas médias industriais dos países em desenvolvimento. Mas o cálculo se refere às tarifas registradas na OMC, não as efetivamente aplicadas, sempre bem mais baixas.
No caso do Brasil, por exemplo, o corte nas tarifas realmente cobradas hoje ficaria entre 7,6% e 12,5%.
Além disso, o mecanismo proposto prevê "flexibilidades" para proteger certos setores, o que leva Schwab a dizer que, além de não terem declarado suas intenções, "alguns países" expressam "o desejo de anular compromissos de abertura de mercado por meio de buracos [nas regras]".


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