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Empresa agrícola pode romper contratos
Com as torneiras do crédito fechadas, cerealistas e fornecedores de insumos podem quebrar acordos com produtores
Além disso, pequenos frigoríficos devem fechar
as portas, e usinas de açúcar e de álcool, endividadas, podem ser incorporadas
MAURO ZAFALON
DA REDAÇÃO
A crise financeira mundial
traz muitas incertezas para o
produtor agrícola, mas pode ser
ainda pior para pequenas e médias empresas do agronegócio.
O setor pode passar por uma
situação bem diferente da vivida nos últimos anos, quando
produtores romperam contratos com "tradings" e fornecedores de insumos devido à valorização das commodities na hora da colheita.
As torneiras do crédito fecharam e essa falta de liquidez
pode levar alguns cerealistas e
fornecedores de insumos a
romper contratos com produtores; pequenos frigoríficos devem fechar as portas; e usinas
de açúcar e de álcool, endividadas, podem ser incorporadas
por outras.
"Acendeu a luz amarela e pode haver inadimplência de
compradores", diz Anderson
Galvão, da consultoria Céleres,
de Uberlândia (MG). Algumas
trocas de soja por insumos foram feitas com valor de US$ 23
por saca no Centro-Oeste. Para
março do próximo ano, as negociações de Chicago indicam
valores próximos a US$ 16.
Se essas empresas compradoras e fornecedoras de insumos não "travaram" (garantiram) esses mesmos valores para o período da safra, vão ter
problemas para arcar com a diferença de US$ 7 a US$ 8 por saca que pagaram a mais pela soja. Sem crédito no mercado, podem ficar inadimplentes.
A falta de crédito afetará
também pequenos frigoríficos.
Os de grande porte compram o
boi para pagar em 30 dias. Os
menores, além de pagar mais
pela arroba, pagam à vista.
Com a situação adversa, os
pecuaristas vão preferir receber menos pelo boi ao entregá-lo aos grandes frigoríficos ou
apenas vender à vista para os
pequenos estabelecimentos.
Para comprar à vista, os pequenos vão recorrer aos bancos, mas não encontrarão crédito. "Se a crise for muito séria
e perdurar, muitos poderão fechar as portas", diz José Vicente Ferraz, da AgraFNP.
Outro setor que está endividado, e deve sofrer com a falta
de crédito, é o sucroalcooleiro.
"O setor vai ter problemas, e as
fusões, que estavam previstas
para daqui a três ou quatro
anos, devem ocorrer bem antes", diz o secretário de Agricultura paulista, João Sampaio.
A captação de crédito está
mais difícil e o setor terá dificuldades para obter Adiantamento sobre Contrato de Câmbio, base do capital de giro.
Um analista do setor sucroalcooleiro diz que o problema é
que as usinas fizeram muitos
investimentos nos últimos
anos devido às expectativas de
crescimento da demanda. Agora, ao buscarem renovações para esses empréstimos, não terão dinheiro novo para isso.
Parte desses empréstimos foi
feita por bancos médios, que
também vão ter dificuldades de
captar recursos para o repasse
às usinas, afirma esse analista.
Gargalos
Há um consenso de que essa
crise será seguida de uma recessão, o que deve afetar todos
os setores da economia. Uma
das vantagens do agronegócio é
que o setor será o último a ser
afetado, o que pode dar tempo
para que empresas e produtores busquem melhores ajustes.
"Esse setor [o agronegócio]
será o último a pagar a conta",
diz o ministro da Agricultura,
Reinhold Stephanes. Já houve
queda nos preços, o fator especulação saiu do mercado e,
mesmo que haja redução de demanda, a comida será a última a
ser afetada, afirma Stephanes.
O ex-ministro da Agricultura
Roberto Rodrigues concorda
que os alimentos podem ser o
último setor a ser afetado, mas,
diante dessa crise financeira,
com reflexos graves na oferta
de crédito, o produtor deve
"botar as barbas de molho".
Ao analisar o cenário atual,
Rodrigues avalia algumas certezas e outras possibilidades.
Entre as certezas, está a de que
o país está plantando uma safra
extremamente cara, mas com
forte redução de crédito.
O pior dos mundos, na avaliação do ex-ministro, será se a
crise se alastrar e tiver reflexos
também nos preços dos alimentos. O produtor estará
plantando uma safra cara, sem
crédito e com preços baixos.
Para Rodrigues, o produtor
deve plantar tudo que for possível com recursos próprios e
crédito barato, mas não deve
arriscar o plantio com baixa
tecnologia. Um contratempo
trará prejuízo ainda maior.
Essa crise financeira vai ser
marcante para o PIB do agronegócio brasileiro no próximo
ano. Neste ano, praticamente
não há efeito porque a produção já foi colhida e os preços tiveram relativa queda.
A avaliação é de Geraldo
Sant'Ana Barros, coordenador
científico do Cepea e professor
da Esalq/USP. O setor terá problema de financiamento porque as empresas estão reduzindo sua exposição no Brasil. Não
tanto pela situação brasileira,
mas pela falta de recursos.
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