São Paulo, sexta-feira, 05 de novembro de 2004

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RECEITA ORTODOXA

Reunião questiona risco inflacionário com crescimento acelerado, um dos fundamentos para a elevação dos juros

Mantega convoca debate sobre ata do BC

MARTA SALOMON
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Um dos fundamentos da política de juros altos do governo Luiz Inácio Lula da Silva -segundo o qual o crescimento econômico acelerado põe em risco o controle da inflação- foi contestado ontem nas vizinhanças do Palácio do Planalto, numa reunião organizada pelo ministro Guido Mantega (Planejamento).
Mantega convidou sete economistas de fora do governo para debater texto do seu assessor especial, Antonio Barros de Castro. Intitulado "A hipótese do crescimento rápido e sustentável", o documento questiona se a economia brasileira poderia ou não crescer aceleradamente sem alimentar a inflação.
As atas das últimas reuniões do Copom (Comitê de Política Monetária do Banco Central) vêm reiterando a preocupação com o rápido preenchimento da capacidade ociosa da economia, que teria chegado a um recorde histórico de 83,3% em agosto, de acordo com a CNI (Confederação Nacional da Indústria).
"A partir dos níveis de produção já atingidos, a política monetária precisa permanecer vigilante", diz a última ata do Copom, num sinal claro de que os juros vão continuar em alta.
"Embora algum arrefecimento espontâneo possa estar a caminho, os dados disponíveis não sugerem que seja intenso o bastante para preservar a compatibilidade entre a trajetória de metas de inflação e a velocidade de preenchimento da capacidade ociosa da economia", completa a ata.
Com o cuidado de dizer que não se havia discutido a política monetária do governo, o chefe da assessoria econômica do Planejamento, Demian Fiocca, resumiu assim a avaliação majoritária na reunião de ontem: "Não há como afirmar peremptoriamente que a economia não pode crescer mais do que 3% ou 4%".
Barros de Castro chegou a classificar de "absolutamente impossível" determinar o chamado PIB potencial -o percentual a que o país pode crescer sem que haja pressões inflacionárias.
"São hipóteses heróicas sobre coisas que são quase subjetivas", avaliou, insistindo em que são "frágeis" os indicadores de capacidade ociosa.

Aperto fiscal
No documento que deu base ao debate de ontem, Castro afirma que, nos últimos 50 anos, "numerosas economias transitaram de situações de baixo ou nulo crescimento para a expansão rápida e sustentada". A maioria delas apelou para a desvalorização do câmbio, e só uma minoria, para as reformas econômicas.
A reunião de ontem foi a primeira de uma série, de acordo com os planos de Guido Mantega. Por ora, o debate segue sem conclusões, apesar da condenação a um aperto fiscal extra em 2005, que inibiria investimentos públicos, e da defesa de medidas de estímulo a investimentos em setores que estão próximos ao limite de sua capacidade, como os siderúrgico, de autopeças e de papel e celulose, sobretudo via redução dos tributos.
Para o ministro Guido Mantega, não é hora de discutir a mudança da meta de inflação para 2005, oficialmente de 4,5%. "Mesmo sendo apertada, a meta só deve ser mexida em última hipótese", avaliou o ministro.


Participaram do debate de ontem: Júlio Almeida, do Iedi (Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial), Antonio Correia de Lacerda, presidente da Sobeet (Sociedade Brasileira de Estudos de Empresas Transnacionais e da Globalização Econômica), Ricardo Bielschovsky, da Cepal (Comissão Econômica para América Latina e Caribe), Rogério Studart, diretor do Banco Interamericano de Desenvolvimento, João Sayad, vice-presidente do BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento), e os professores Paulo Nogueira Batista Júnior, da FGV (Fundação Getúlio Vargas), e Nelson Henrique Barbosa Filho, da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro).


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