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ANÁLISE
Casas Bahia é vítima da própria inovação
MARCIO AITH
DA REPORTAGEM LOCAL
A empresa que destravou o
potencial do consumidor de
baixa renda não resistiu, sozinha, à emancipação do consumidor de baixa renda.
Essa é a principal ironia da
venda do controle da Casas Bahia para o Pão de Açúcar.
Fundada em 1952, a Casas
Bahia inovou ao inventar prestações que coubessem dentro
do orçamento dos consumidores, independentemente dos
juros embutidos.
Deve-se a essa invenção a capacidade da empresa de alimentar-se das adversidades
brasileiras -a Casas Bahia
cresceu devido às adversidades,
e não apesar delas.
Se 80% da população brasileira não possuía conta em banco, as lojas da rede cadastravam
consumidores e recebiam os
pagamentos por meio de carnês, em dinheiro.
Se os bancos não queriam
emprestar para as classes C, D e
E, a Casas Bahia financiava,
com critérios próprios, quase
secretos, consumidores de baixa renda que julgava serem
bons pagadores.
A estratégia permitiu à empresa ser uma das poucas portas de entrada das classes C, D e
E ao mercado de consumo.
Com ela, a Casas Bahia teve
uma expansão meteórica e uma
enorme visibilidade -a empresa foi apontada como benchmark pela Michigan Business
School, citada como uma das
250 maiores do setor pela National Retail Federation (NRF)
e eleita como objeto de estudos
no programa de MBA da Harvard Business School.
O modelo funcionou bem durante o período de inflação e juros altos, quando a economia
brasileira estava desorganizada
e a população de baixa renda
não possuía crédito formal.
Mas se tornou anacrônico
após o recente boom do mercado de capitais e do aparecimento de mecanismos alternativos
e baratos de financiamento das
classes de baixa renda.
Até recentemente, a Casas
Bahia tinha um modelo rústico
de administração, apesar de
suas estruturas comercial e de
distribuição modernas.
A varejista não fazia divulgação de balanços periódicos nem
atendia às regras formais de
transparência apreciadas pela
comunidade financeira.
Seu modelo particular de administração, segundo analistas
de mercado, alijou a empresa
do capital barato e abundante,
disponível nos últimos anos para as sociedades anônimas e
empresas com ação em Bolsa.
Ficar longe dessas fontes de
recursos foi um luxo de altíssimo preço para a maior varejista
do país, cujo principal negócio é
tanto a venda propriamente dita de bens e produtos quanto o
financiamento do consumo.
A empresa também passou a
sofrer competição de todos os
lados, alavancada pelo comércio on-line e pela aliança entre
outras redes de varejo e financeiras de grandes bancos.
Nos grandes centros urbanos, a concorrência veio de gigantes como Pão de Açúcar,
Walmart, Carrefour e Magazine Luiza. Na internet, de lojas
como Submarino, Shoptime,
Fnac ou Americanas.
Para piorar, a empresa só em
2009 chegou ao Estado que dá
nome à empresa, situado na região cujo consumo mais cresce
no país. A entrada no mercado
nordestino deu-se pela abertura, em abril, de quatro lojas na
cidade de Salvador.
O atraso -de 50 anos, brincam os concorrentes- decorreu de uma opinião do fundador Samuel Klein. Toda vez que
lhe perguntavam os motivos da
ausência da rede na região, ele
respondia que a prioridade era
o Sudeste e o Sul.
Como resultado dessa visão,
a Casas Bahia chegou tarde a
um mercado cujo ímpeto nem a
crise mundial sufocou.
Nas periferias do Nordeste,
as classes A, B e C cresceram
12% de agosto de 2008, antes da
turbulência, a agosto de 2009.
Já a parcela da população da cidade de São Paulo que figurava
nas classes A, B e C apresentou
queda de 0,8% no período, segundo Marcelo Neri, coordenador do Centro de Políticas Sociais da FGV.
Uma miríade de redes de varejo surgiu no vácuo deixado no
Nordeste pela Casas Bahia. Líder na região, a baiana Insinuante, por exemplo, mimetizou nos detalhes a empresa da
família Klein e foi por anos a rede que mais cresceu no país.
Curiosamente, foi apelidada de
a "Casas Bahia do Nordeste".
Colaborou TONI SCIARRETTA , da
Reportagem Local
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