São Paulo, sábado, 06 de janeiro de 2001

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ANÁLISE


Greenspan está determinado a evitar o erro de 1990



RICHARD W. STEVENSON
DO "THE NEW YORK TIMES"

Na segunda metade de 1989 e de novo em 1990, Alan Greenspan e seus colegas no Federal Reserve (Fed, o banco central dos Estados Unidos) cortaram as taxas de juros norte-americanas, acreditando que a economia do país estava perdendo o ímpeto. Mas Greenspan não via nenhuma ameaça substancial de recessão e, assim, embora mantivesse a política de corte de juros nos meses que se seguiram, adotou cortes graduais.
Foi uma das poucas vezes em seus mais de 13 anos como chairman do Fed que Greenspan cometeu um erro. A economia entrou em recessão no terceiro trimestre de 1990 sem que o Fed reconhecesse o fato ou respondesse a ele de maneira agressiva.
Foi um erro que Greenspan parece determinado a não repetir à medida que o longo período de crescimento contínuo uma vez mais dá lugar a uma fase de risco econômico ampliado.
Ao reduzir a taxa de fundos federais do Fed em meio ponto percentual na quarta-feira -e de uma maneira que chamou a atenção-, Greenspan estava sinalizando sua disposição de agir cedo e com vigor a fim de manter em curso a expansão econômica.
E, ao fazê-lo, ele lembrou ao mundo que a política monetária, embora seja uma ferramenta menos que perfeita para administrar os altos e baixos da economia, pode ser usada muito mais rapidamente do que a alternativa, no caso um corte de impostos.
"Em 1990, o desempenho do Fed não foi ruim, mas ficou abaixo do ótimo", diz Allen Sinai, economista da Primark Decision Economics, uma consultoria. "Greenspan parece ter dito que não pretende fazer as coisas daquela maneira porque poderíamos ter agido melhor."
Ao agir assim agressivamente, o chairman do Fed estava reconhecendo implicitamente outra realidade que muitas vezes passa despercebida à medida que cresce a sua estatura como mestre da economia: definir as taxas de juros é uma tarefa complicada, sujeita não só a erros de julgamento como também à rápida mudança das condições econômicas.
A ação do Fed na quarta foi em essência uma reversão do aumento de juros de meio ponto percentual decretado em maio, quando parecia que a economia estava à beira do superaquecimento. E o ciclo de aumentos de juros que se fechou em maio passado foi em parte uma resposta a uma série de cortes no final de 1998, que ajudou a levar o crescimento da economia a um patamar potencialmente inflacionário.
"Eles cortaram demais em 1998", disse Mickey D. Levy, economista-chefe da Banc of America Securities. "Depois partiram para o aperto, como deveriam, mas apertaram demais."
No entanto, embora seja fácil criticar em retrospecto, Levy e outros analistas dizem que Greenspan se destaca pela sua flexibilidade e disposição de se adaptar a novos dados, novas evidências circunstanciais sobre o estado da economia e novas idéias sobre receitas de política econômica.
"Alan Greenspan é o sujeito mais positivo que já vi no Fed, porque está aberto a compreender de que forma a economia está mudando e preparado para tomar medidas para enfrentar as mudanças", disse Jerry Jasinowski, presidente da Associação Nacional da Indústria. Ele se provou aberto às mudanças tecnológicas que estavam demonstrando ganhos de produtividade que conduziam a um crescimento econômico mais alto sem inflação, acrescentou Jasinowski, e "continuou aberto diante do impacto cumulativo dos aumentos nos preços da energia e das taxas de juros e dos declínios nas Bolsas de Valores, percebendo que isso estava derrubando a economia".
Além disso, dizem os analistas, Greenspan tem a capacidade de discernir o que está acontecendo com a economia muito antes que a tendência se torne aparente nos dados oficiais, o que permite que ele aja antes que seja tarde demais para evitar os problemas. Parte dessa capacidade, dizem, é sua facilidade para detectar o efeito da psicologia dos investidores e consumidores sobre a economia.
"A psicologia é muito importante", diz Alice M. Rivlin, ex-vice chairman do Fed. "Essa interessante medida foi uma indicação de que a psicologia da situação teria agravado a queda e, por isso, era melhor agir antes."
Greenspan sempre se sentiu desconfortável com sua reputação como vidente infalível. Ele se descreve como apenas um economista esforçado e experiente e, às vezes, parece se sentir intensamente pressionando a atender às expectativas de que seja capaz de realizar milagres.
Até certo ponto, ao ajudar o país a evitar recessão nos últimos dez anos, o maior período de crescimento consistente já registrado, ele o fez. Aos 74 anos, Greenspan sem dúvida está pensando em como a história o verá, e orientar a economia à sua segunda década de expansão consecutiva não seria um legado fácil de esquecer.
Ele também foi cuidadoso sobre a influência política que seu sucesso no Fed lhe concedeu. O momento do corte de juros esta semana colocou o Fed no meio do debate sobre se a queda na atividade econômica oferecia mais base para um corte dos impostos, como o presidente eleito George W. Bush e seus colegas republicanos no Congresso gostariam.
Os republicanos viram o corte de juros como validação de sua idéia de que a economia poderia usar o estímulo providenciado por um corte de impostos. Eles se mantiveram fiéis a essa posição mesmo que cerca de um ano seja necessário antes que o projeto de lei de corte de impostos passe pelo Congresso.
Os democratas viram a atitude do Fed como evidência de que a política monetária era a melhor ferramenta para enfrentar as reviravoltas do ciclo de negócios.
Que ambos os lados possam apontar para o chairman do Fed como aliado na defesa de suas posições é sem dúvida gratificante para Greenspan, que acha útil para ele e para o Fed ter apoio dos dois lados da divisa partidária.
Mas manter esse apoio exige, primeiro, que ele não cometa erros importantes. Ao cortar os juros, Greenspan parecia determinado a não sucumbir à tendência de esperar até que os dados oficiais mostrem provas incontestáveis de problemas antes de agir.
Sinai diz que o verdadeiro desafio para Greenspan seria reconhecer quando os padrões graduais e lineares do comportamento econômico indicam mudanças abruptas, mas não imediatamente evidentes. Nesse caso, disse ele, Greenspan parece ter baseado sua atitude em dados sólidos, evidências circunstanciais e no seu instinto, para concluir que a economia chegou a um ponto de virada que exige resposta imediata.
Ao agir de imediato, Greenspan também está ilustrando sua crença de que a política monetária precisa trabalhar para evitar problemas econômicos, e não só para consertá-los. Mais do que qualquer de seus predecessores, Greenspan quer eliminar a inflação antes que ela se instale e manter a economia crescendo de preferência a ressuscitá-la depois de uma paralisação. "A revolução do Fed de Greenspan", diz Sinai, "é que a política monetária dele está voltada ao futuro."


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