São Paulo, segunda-feira, 06 de janeiro de 2003

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CÂMBIO

Cotação cai em dezembro para melhorar os balanços e em janeiro com a volta do dinheiro que fugiu do risco Brasil

Dólar deverá manter tendência de queda

SANDRA BALBI
DA REPORTAGEM LOCAL

O dólar que assombrou o país em 2002, acumulando alta de 53,20%, entrou o ano de marcha a ré e até sexta-feira acumulava queda de 2,54%, cotado a R$ 3,45. E, segundo analistas, promete continuar descendo a ladeira, a exemplo do movimento de dezembro, mês em que, tradicionalmente, o câmbio recua.
Depois de bater em R$ 3,95 no dia 22 de outubro, uma semana antes da eleição de Luiz Inácio Lula da Silva, o dólar encerrou o ano cotado a R$ 3,54, com queda de 3,01% só no último mês do ano
Em janeiro, segundo Paulo Possas, diretor da Eagle Capital, a tendência do dólar é continuar caindo. A queda neste mês, segundo ele, tradicionalmente atinge até o "black". Até sexta-feira, o paralelo acumulava variação de -3,27%. "Esse fenômeno é muito mais forte e permanente do que a queda de dezembro. "Quem tirou dinheiro do país para fugir do risco Brasil, começa a voltar; já as empresas vendem dólares para pagar contas", diz Possas.
É em dezembro, porém, que os interesses da maioria dos agentes econômicos convergem derrubando as cotações. Naquele mês, as empresas e os bancos encerram seus balanços, contabilizando dívidas e aplicações em moeda estrangeira, além dos dividendos remetidos às matrizes.
O fechamento das contas é feito com base no câmbio do dia 31. "Quanto menor for a cotação em dezembro, melhores os resultados no final do balanço", diz Alberto Borges Matias, professor de economia da Universidade de São Paulo, USP, de Ribeirão Preto.
Também ao governo interessa encerrar o ano com a moeda local mais valorizada. "Historicamente o dólar cai nesta época, pois o BC quer mostrar uma dívida cambial menor e passar tranquilidade aos agentes econômicos", diz Possas.
Segundo Matias, o mercado de câmbio não é um mercado perfeito, pois na maior parte das vezes o volume de operações é pequeno e o Banco Central também intervém vendendo ou comprando moeda, para evitar grandes oscilações. "Isso permite que um número pequeno de empresas e bancos interfiram nesse mercado, puxando ou derrubando cotações, de acordo com seus interesses", diz ele.
Às empresas endividadas em moeda estrangeira, diz Matias, interessa derrubar o câmbio em dezembro para reduzir seus passivos em reais. Essas empresas, em geral, fazem hegde (proteção cambial) comprando títulos da dívida externa brasileira. "Se o real se valoriza em relação ao dólar, cai o risco-país e diminui o deságio desses títulos dando ganhos financeiros a essas empresas", diz.
Também as multinacionais têm interesse em encerrar o ano com o real mais encorpado. "Se o balanço local for fechado com um real desvalorizado, a matriz terá prejuízos, pois seus ativos locais perderão valor", diz Matias.
Já os bancos também têm interesse em encerrar o ano com o câmbio deprimido. Ao longo deste ano eles investiram em títulos públicos federais que acompanham a variação cambial. Quando o dólar disparou, esses títulos se valorizaram inflando os seus ganhos. Mas, contando com um recuo do dólar, os bancos provisionaram nos balanços trimestrais a desvalorização que esses títulos teriam até o final do ano.
Segundo Matias, a maioria das instituições provisionou essas perdas potenciais considerando que o dólar valeria R$ 2,80 no final do ano. Como a moeda americana fechou acima desse patamar, terão de reverter as provisões. O resultado será um lucro maior no final do balanço. "Os provisionamentos vinham ocultando o lucro nos balanços trimestrais", diz ele. "Agora ele vai aparecer", acrescenta.

Mecanismos
Segundo Possas, "há uma gama enorme de operações financeiras e comerciais que podem ser feitas, de forma absolutamente legal, para fixar um lucro maior ou menor e que influenciam o câmbio".
Na virada do ano podem crescer as captações no exterior, por exemplo. Nas últimas semanas foram anunciadas captações significativas de empresas e bancos: Petrobras (US$ 200 milhões), Gerdau (US$ 75 milhões), BBA (US$ 60 milhões) e ABN Amro (US$ 50 milhões). "Quando os recursos são internalizados, cai a cotação do dólar", diz Matias.
Também empurram o câmbio para baixo a entrada de recursos de exportadores, de bancos e de empresas que estavam fora do país e que são internalizados nessa época do ano.
Segundo Possas, a maior parte das movimentações ocorrem na primeira quinzena do mês. "Depois do Natal nada acontece, só manipulação de mercado; por isso o dólar caiu e depois voltou a subir um pouco", diz ele.


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