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OPINIÃO ECONÔMICA
A força do passado
LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS
O passado exerce um peso às
vezes insuportável sobre o
comportamento do homem. Muito já se escreveu sobre esse tema
aplicado às mais variadas áreas
da atividade humana. Submetido
às experiências do passado, o futuro muitas vezes escapa da compreensão dos que vivem o momento presente. Perdem-se com
isso as grandes mudanças que
ocorrem nas sociedades. E aqueles que conseguem enxergar à
frente passam por sonhadores ou
analistas incompetentes.
Creio que vivemos essa situação
no Brasil de hoje. Falo mais especificamente sobre as mudanças
que estão ocorrendo em partes
importantes de nossa economia,
principalmente em nossas contas
externas. O passado de crises
-que se iniciavam com a escassez de dólares e, em seguida, forçavam uma desvalorização brutal de nossa moeda- ainda povoa o imaginário dos agentes econômicos.
A reação das autoridades econômicas em momentos como este
sempre foi a de aumentar os juros
de maneira agressiva, para provocar um ajuste na conta corrente e lutar contra a inflação que se
seguia ao colapso da moeda. Por
isso essa mania de dizer que os juros reais no Brasil nunca podem
ser inferiores a 10% ao ano. Isso
aconteceu principalmente devido
à ocorrência recorrente de crises
cambiais.
Vivemos agora, como já alertei
várias vezes, uma situação externa totalmente diversa da que prevaleceu nas últimas décadas. Temos uma sobra estrutural de
moedas fortes na nossa balança
de pagamentos. Isso já ocorreu
em 2005, vai se repetir em 2006 e,
na ausência de algum fato imprevisível hoje, pode continuar a
existir ao longo dos próximos
anos. Essa nova bonança pode ser
atribuída a vários fatores. Cito
aqui três deles.
O primeiro, e talvez o mais importante, foi a mudança estrutural na economia global que o desenvolvimento econômico da
China e a nova forma de operar
sua economia provocaram. O segundo pode ser atribuído a uma
nova onda de progresso tecnológico. E, finalmente, há os frutos
que estão sendo colhidos no Brasil
depois de mais de uma década de
uma política econômica responsável e do aprofundamento da
abertura para o mercado externo.
Essa nova realidade, que os
marcados pelo passado não conseguem ver, está criando novas
oportunidades e novos desafios.
Como sempre, o setor privado
saiu à frente e transformou-se no
principal agente dessa verdadeira
revolução. Já o governo ficou a reboque e insiste em práticas que
respondem mais aos desafios de
um passado que não mais existe
do que aos colocados pelo futuro.
O exemplo mais marcante disso
é o nosso Banco Central, que, perdido na sua incapacidade de entender o tempo presente, refugia-se numa ortodoxia desatualizada
e ineficiente. Evidência disso são
suas ações na condução da política monetária e na operação desastrada de uma intervenção no
câmbio que ninguém entende. Juros elevadíssimos e sobra estrutural de dólares certamente não
combinam.
Essa nova situação externa do
Brasil precisa ser discutida em
profundidade, pois os problemas
-bons problemas, como costumo
dizer- a ela associados são diferentes dos enfrentados no passado. O primeiro passo na busca de
uma solução exige uma certa lavagem cerebral para a retirada
dos padrões de análise anteriores.
Um segundo passo é entender que
esse novo paradigma da economia mundial veio para ficar e que
se alguma coisa vai acontecer no
futuro é o seu aprofundamento.
A tomada de consciência de que
um novo Brasil é possível começou com os investidores externos;
entretanto ainda não é consenso
aqui dentro. Por isso a pressão
para apreciação da taxa de câmbio é quase insuportável e o chamado risco Brasil não pára de
melhorar. Mas cabe a nós, brasileiros, entender esses novos tempos e pensar no que fazer internamente -e há muita coisa a ser
feita- para que a sociedade como um todo se beneficie dessa nova chance.
Como já disse em artigo anterior, sinto uma grande semelhança entre 2006 e 1966, quando ainda vivíamos o fim do mandato do
primeiro general ditador...
Luiz Carlos Mendonça de Barros, 63,
engenheiro e economista, é economista-chefe da Quest Investimentos. Foi presidente do BNDES e ministro das Comunicações (governo FHC).
E-mail - lcmb2@terra.com.br
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