São Paulo, terça-feira, 06 de maio de 2008

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VINICIUS TORRES FREIRE

Café com bobagem e gasolina


Lula aumenta subsídio para combustível de ricos, gasta R$ 3 bilhões em gasolina e ainda bate bumbo no rádio

O GOVERNO vai como que gastar cerca de R$ 3 bilhões por ano a fim de comprar gasolina e distribuí-la de graça aos consumidores do produto -e quem mais consumir, mais presente ganhará. Como é sabido, esse será o efeito prático da redução de um tributo, a Cide, decretada com o objetivo de compensar a concessão do reajuste de 10% para o preço da gasolina.
Para quem consome diesel, direta ou indiretamente, não haverá o mesmo subsídio. Entre os consumidores de diesel há proprietários de jipões 4x4, por exemplo. A maioria, porém, consome diesel por meio do passe de ônibus. Ou por meio do custo de abastecimento de máquinas agrícolas. Ou ainda por meio do custo do frete, incluído no preço da comida e de outras mercadorias, no Brasil estupidamente transportadas em caminhões, de resto por estradas medonhas. Mas, como se dizia, quem paga o preço do diesel é o povo mais comum. Esse ficou sem subsídio, sem a redução do tributo que houve para quem compra gasolina.
Para completar o insulto, Lula disse ontem em seu programa de rádio, o café com bobagem, que os consumidores de gasolina têm de denunciar os postos que aumentarem os preços (preços livres de controle, como os do feijão, que chegou a subir quase 200%). Isto é, ficou explícito, como se fosse necessário, que o problema de Lula era faturar a demagogia dirigida àqueles que veriam o aumento de preços com os próprios olhos (os compradores de gasolina). Lula não precisa se ocupar do povo que pagará a comida ou o ônibus mais caros (depois das urnas de outubro), que será ludibriado pelo repasse indireto de custos e não ligará causa e efeito, como de hábito.
A gasolina já vinha sendo subsidiada faz anos. Até agora, a conta era paga pelos acionistas da Petrobras, entre eles o governo e, portanto, o público em geral, pois parte do faturamento da estatal petrolífera acaba no caixa federal, na forma de tributos ou de parte dos lucros. Mas, para o público em geral, o peso desse subsídio indireto era bem pequeno. Agora, são R$ 3 bilhões na veia.
Controlar a variação excessiva do preço dos combustíveis pode ser um artifício útil, se temporário, no controle da inflação e de outros probleminhas -no médio prazo, porém, dá em besteira. Ao menos, pode se argumentar que o benefício do controle do preço tende a ser geral e, enfim, valia tanto para a gasolina como para o diesel. Agora, Lula dá dinheiro para um grupo social que lhe deu na telha agradar. Ressalte-se: são R$ 3 bilhões. Quando se disser que faltou dinheiro para evitar esse ou aquele desastre da administração pública, a gente sempre vai poder apontar a conta-gasolina: R$ 3 bilhões.
Subsídios em geral são ruins, mas alguns podem ser economicamente úteis e todos deveriam ser socialmente justificáveis. Deveriam, no mínimo, ser explicitados e detalhados em contas públicas. Dada a barafunda de isenções fiscais enfiadas em milhares de decretos e de medidas provisórias, dados os certificados picaretas de filantropia, dadas as "leis de incentivo" a isso ou aquilo ou, ainda, dadas as taxas de juros secretas dos empréstimos camaradas do BNDES, a gente jamais sabe direito quem leva quanto.
Mas a gente sabe que, em geral, quem leva não são os pobres.

vinit@uol.com.br


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