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Calçado chinês dribla taxa e entra no Brasil
Tarifa antidumping de US$ 13,85 é aplicada em cada par chinês, mas produto é importado como "made in Malásia"
Associações de calçadistas brasileiros acusam China de fraudar política comercial e usar países-laranjas; chineses ainda dominam importações
GRAZIELLE SCHNEIDER
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
LEONARDO LÉLLIS
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA RIBEIRÃO
Em 2010, as exportações de
calçados da China para o Brasil
caíram mais de 60% em relação
a 2009. Já a Malásia, que não
enviou nenhum par ao país no
ano passado, vendeu mais de
1,5 milhão só nos três primeiros
meses deste ano.
Essa é uma das evidências,
segundo empresários e entidades do setor calçadista, de que a
China está cometendo uma
fraude ao embarcar produtos
para o Brasil como se fossem de
outros países -prática conhecida por elisão.
O objetivo é burlar a tarifa
antidumping estabelecida pelo
governo brasileiro em março,
que sobretaxa o produto chinês
em US$ 13,85 por par (cerca de
R$ 25) e que valerá pelos próximos cinco anos.
A fraude seria caracterizada
pela alteração dos documentos
que atestam a origem do produto. Um sapato fabricado na
China, por exemplo, teria a sua
documentação modificada na
Malásia para esconder a sua
origem e embarcaria para o
Brasil como um produto malaio, livre da sobretaxa.
Para a Abicalçados (Associação Brasileira das Indústrias de
Calçados) e o Sindifranca (Sindicato da Indústria de Calçados
de Franca), as evidências estatísticas são a principal prova da
manobra fiscal.
Desde que os calçados chineses foram sobretaxados em setembro de 2009, as exportações do país para o Brasil caíram drasticamente, enquanto
as do Vietnã e da Malásia subiram de maneira anormal -os
embarques do Vietnã subiram
mais de 26%.
Milton Cardoso, presidente
da Abicalçados, afirmou que o
processo que resultou na medida antidumping teve 40 mil páginas e levou um ano e três meses para ser concluído.
"Nós entendemos que deveria haver um avanço na legislação que permitisse a aplicação
mais rápida de uma medida,
porque se levar mais um ano e
meio de processo, só teríamos
resultado após dois anos", disse.
Outra prova da fraude, segundo ele, são as ofertas feitas
por intermediárias no exterior
a companhias brasileiras. "Elas
mandaram e-mails explicando
como evitar o antidumping e se
oferecendo para "cuidar disso"
[da fraude] para as empresas.
Mais de dez empresas receberam esse e-mail", afirmou.
O diretor-executivo da Abicalçados, Heitor Klein, defende
o rastreamento das vendas. "É
preciso rastrear as importações
e tentar investigar algum desvio de conduta", disse.
Para o presidente do Sindifranca, José Carlos Brigagão do
Couto, a prática "compromete a
sobrevivência do setor calçadista brasileiro".
Cúmplices locais
Já Welber Barral, secretário
de Comércio Exterior do Ministério de Desenvolvimento,
Indústria e Comércio Exterior,
diz que o esquema não aconteceria se não houvesse empresas
brasileiras participando.
O vice-presidente da Associação de Comércio Exterior do
Brasil, José Augusto de Castro,
concorda. "Assim como a China
está vendendo, alguém aqui está comprando", disse Castro.
Apesar de ainda liderar o
mercado de importações -com
4 milhões de pares vendidos ao
Brasil até março-, a China reduziu a sua participação no volume que chega ao país neste
ano. O país foi responsável por
47% do total de sapatos que
chegaram ao Brasil -no primeiro trimestre de 2009, a participação chinesa foi de 82%.
O presidente da Câmara de
Comércio Brasil-China, Charles Tang, afirmou que a entidade não tem conhecimento de
que a elisão esteja ocorrendo
no setor calçadista. "O empresário brasileiro, em vez de se
preocupar tanto em ter medo
dos chineses, poderia se concentrar mais em ganhar dinheiro com a China", disse ele, ao
destacar o país como um mercado em potencial para os calçados brasileiros.
As embaixadas da China e da
Malásia foram procuradas para
comentar o assunto. Ambas pediram o envio de questões por
e-mail, mas não houve resposta
até o fechamento da edição.
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