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RECEITA EM XEQUE
Estudo de economistas do FMI e de Berkeley conclui que liberalização financeira não traz benefícios esperados
Emergente ganha pouco com fluxo de capital
ÉRICA FRAGA
DA REPORTAGEM LOCAL
Os benefícios diretos da liberalização financeira para países
emergentes deixam a desejar. Essa é uma das conclusões de um estudo feito pelos economistas Olivier Jeanne, do FMI (Fundo Monetário Internacional), e Pierre-Olivier Gourinchas, da Universidade Berkeley, na Califórnia.
Pelas estimativas dos analistas,
os ganhos da total abertura da
conta de capital para um país
emergente equivale a um crescimento do consumo doméstico de
1% ao ano. "Esse benefício é de
uma ordem de magnitude menor
do que os ganhos que economistas desenvolvimentistas e governantes pretendem atingir", diz
trecho do relatório, intitulado "Os
Ganhos Ilusórios da Integração
Financeira Internacional".
Segundo o trabalho, esse retorno -medido para a média dos
países que não fazem parte da
OCDE (Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento
Econômico)- é muito pequeno,
se comparado aos ganhos de riqueza proporcionados por um
forte aumento da produtividade
doméstica na magnitude observada em algumas nações.
"Não é um ganho desprezível
[...] Mas é pequeno, se comparado
aos propiciados por aumentos da
produtividade na magnitude que
observamos em diversos países
depois da Segunda Guerra Mundial", disseram os dois economistas em resposta a perguntas enviadas pela Folha por e-mail.
Nas últimas duas décadas, países em desenvolvimento, como o
Brasil, começaram a remover as
barreiras ao livre fluxo de capitais,
seduzidos pela tese do chamado
Consenso de Washington de que
essa medida viria acompanhada
de um grande crescimento da riqueza nacional. A abertura da
conta de capital passou a integrar
a cartilha de recomendações de
organismos multilaterais como o
próprio FMI e o Banco Mundial.
Muitos economistas liberais especializados em questões de desenvolvimento ainda defendem a
idéia de que o fluxo de recursos
para países em desenvolvimento
-que sofrem de uma escassez de
capital- tende a estimular o crescimento econômico e a fazer com
que o nível de renda deles convirja para o patamar registrado pelas
nações desenvolvidas.
Em um contexto de abertura financeira, a renda dos países
emergentes deve, de fato, aumentar. Mas, de acordo com os resultados do trabalho de Jeanne e
Gourinchas, ainda ficará muito
aquém do nível de riqueza atingido pelos países avançados.
Produtividade
Segundo Jeanne, que é economista sênior do departamento de
pesquisa do FMI, e Gourinchas,
que é professor do departamento
de economia de Berkeley, o caminho mais eficiente para o crescimento econômico é o aumento da
produtividade de uma economia.
Para isso, é fundamental que
um país em desenvolvimento tenha instituições domésticas que
garantam o respeito aos direitos
de propriedade e um ambiente
macroeconômico estável.
A abertura financeira pode até
contribuir para que uma economia em desenvolvimento se torne
mais produtiva por vias indiretas.
Mas não há prova disso, de acordo com os autores do estudo.
"Abrir a conta de capital pode
ser um componente de uma estratégia para o desenvolvimento.
Mas, para defender esse argumento, é necessária uma história
convincente quanto à maneira
pela qual essa abertura aumenta a
produtividade interna. Não é uma
conexão óbvia", afirmaram os
economistas à Folha.
Segundo eles, não se pode alegar, por exemplo, que é evidente
que uma autorização governamental para que empresas emitam bônus no exterior ou para
que investidores de fora adquiram ações do país resultará em
um aumento da produtividade
doméstica.
Se por um lado ainda não foram
medidos todos os benefícios da
abertura financeira, por outro
países em desenvolvimento experimentaram, em períodos de crise, os altos custos dessa abertura.
Nos últimos anos, vários mercados emergentes amargaram um
forte impacto negativo em suas
economias depois de sofrerem
saídas bruscas de capital.
Isso levou muitos economistas
liberais e o próprio FMI a passar a
defender, mais recentemente,
uma posição mais cautelosa dos
países emergentes em processos
de liberalização financeira.
Eficiência
Questionados pela Folha sobre
quais medidas poderiam ser tomadas pelo governo de um país
em desenvolvimento para aumentar a produtividade doméstica, Gourinchas e Jeanne afirmam
que "até recentemente muitos
economistas acreditavam que os
países menos desenvolvidos precisariam acumular mais capital
produtivo e mais infra-estrutura
física". "Mas as pesquisas recentes
enfatizam a importância da eficiência com que o capital e a mão-de-obra internas são usados, em
lugar do volume de capital em si",
afirmaram em suas respostas.
Gourinchas e Jeanne relativizam os reflexos de seu estudo em
futuras recomendações de política das instituições financeiras internacionais aos países em desenvolvimento, tendo em vista que o
FMI, por exemplo, ainda defende
benefícios supostamente maiores
da abertura da conta de capital.
"Primeiro, não devemos nos
deixar iludir pela caricatura que
muitas vezes é apresentada quanto à posição do FMI sobre esses
assuntos. O FMI vem advogando
a liberalização da conta de capital
de maneira relativamente cautelosa, enfatizando em especial a
importância do seqüenciamento
e a necessidade de que as condições domésticas sejam as corretas", dizem. "Esperamos que nosso trabalho influencie a maneira
pela qual as pessoas, dentro e fora
do FMI, pensam sobre a globalização financeira", completam.
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