São Paulo, terça-feira, 06 de julho de 2004

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ARTIGO

Instituições como o FMI precisam melhorar

DO "FINANCIAL TIMES"

Em 1944, há 60 anos, os delegados reunidos à sombra das montanhas que cercam Bretton Woods, New Hampshire, decidiram criar o FMI e o Banco Mundial. E a hora é apropriada para que perguntemos: será que 60 anos é o bastante?
A resposta, em resumo, é não. Ainda que as mudanças no mundo tenham alterado suas funções, as instituições financeiras internacionais se adaptaram o bastante para desempenhar papéis que continuam úteis. Mas, além de suas deficiências institucionais conhecidas, sofrem também de uma fraqueza endêmica em sua história: cotistas de visão curta e egoísta que muitas vezes corrompem instituições financeiras que deveriam ser puramente tecnocráticas e as transformam em instrumentos de influência política.
A tarefa do FMI mudou consideravelmente ante a ordem inicial, fiscalizar a resolução dos desequilíbrios em conta corrente surgidos no seio do mecanismo de câmbio de paridade fixa criado pelo acordo de Bretton Woods. Os maiores desequilíbrios hoje -especialmente o imenso déficit comercial dos Estados Unidos, contrastando com os superávits do Japão e da zona do euro- certamente serão resolvidos, de uma maneira ou de outra, sem assistência do Fundo. Excetuada a Ásia emergente, onde um eco atávico do sistema de Bretton Woods foi recriado, as taxas fixas de câmbio, controles de capital e administração oficial de reservas cambiais deram lugar ao câmbio livre e ao capital privado móvel.
Mas o FMI ainda tem um papel na resolução de crises financeiras, hoje em dia quase sempre relacionadas às imensas dívidas públicas dos países de mercado emergente. Ainda que a dimensão do Fundo com relação ao tamanho dos mercados internacionais de capitais continue a diminuir e que uma nova série de catástrofes como a crise asiática de 1997/98 possa deixá-lo exposto, o Fundo continua a ter poder de fogo suficiente para superar crises de liquidez em economias grandes como a do Brasil, com seus empréstimos.
O verdadeiro problema do FMI é que seus cotistas, muitas vezes tendo em mente imperativos políticos, persistem em emprestar demais a grandes países de mercado emergente, como a Argentina. Mexer um pouco na estrutura não serve como substituto para a indicação de administradores competentes e duros, pelos países cotistas dominantes, e para o apoio que os executivos devem receber depois de indicados.
De fato, a influência do G7 sobre as instituições financeiras internacionais é indefensável. Que os países mais ricos dominem é inevitável; afinal, estamos falando de instituições cujo controle é definido por cotas de capital, e não da ONU. Mas as "cotas" financeiras e os direitos de voto precisam ser revisados para dar a nações como os emergentes asiáticos a influência que as dimensões de suas economias garantem, em termos de gestão do FMI.
O Banco Mundial também enfrenta problemas devido às mudanças nas circunstâncias. Como o Fundo, sua influência nos países de média renda foi apequenada pela entrada cada vez maior de capital privado. Países como Japão e Coréia do Sul já não precisam recorrer à divisão de empréstimos comerciais do banco. Outros, como o México, logo seguirão esse exemplo. O banco será cada vez mais uma instituição para países de baixa renda e muito problemáticos, especialmente na África. A instituição continua a ter conhecimento especializado, se bem que as prioridades concorrentes causem confusão, nessa área. Também exerce um poder que vai além de seu tamanho ao agir como fiscal para todos os doadores de assistência e para todas as transações de perdão de dívidas.
Mas o Banco Mundial sem dúvida encontrará dificuldades para satisfazer os críticos quanto à área do desenvolvimento, cada vez mais controvertida. A coordenação de assessoria, assistência técnica e auxílio da comunidade mundial de doadores continua fragmentada. Como sempre, os cotistas gostam de falar sobre multilateralismo, mas freqüentemente agem por conta própria.
A conferência de Bretton Woods, 60 anos atrás, foi prejudicada por disputas mesquinhas e egoístas entre os delegados nacionais. E as coisas não mudaram, até hoje. O mundo não precisa só de instituições financeiras internacionais melhores. Também precisa de melhores cotistas.


Tradução de Paulo Migliacci


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