São Paulo, domingo, 06 de julho de 2008

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Japão quer que Bush fixe metas para gases

DO ENVIADO ESPECIAL A TÓQUIO

O governo japonês, anfitrião da cúpula do G8 deste ano, está fazendo esforços de última hora para tentar convencer o presidente norte-americano, George W. Bush, a concordar com metas numéricas obrigatórias para a redução da emissão de gases que provocam o aquecimento global.
Bush reúne-se hoje com o primeiro-ministro do Japão, Yasuo Fukuda, um dia antes do início da cúpula entre os governantes de Estados Unidos, Japão, Alemanha, França, Reino Unido, Itália, Canadá e Rússia. Na quarta-feira, o grupo reúne-se com o G5 (Brasil, China, Índia, África do Sul e México).
O esforço japonês destina-se a evitar que o G8 caminhe para a irrelevância ou suas cúpulas se limitem a declarações meramente retóricas ou repetitivas.
É o caso da mudança climática, o tema que os japoneses elegeram como principal para a reunião deste ano, a realizar-se na ilha de Hokkaido, a mais ao norte do Japão.
Na cúpula de 2007 (Heiligendamm, Alemanha), os líderes do G8 haviam concordado em "considerar seriamente" a proposta de Japão, União Européia e Canadá de reduzir as emissões globais até 2050, uma meta de longo prazo.
"Considerar seriamente" já é uma maneira de fugir de decisões. Se há acordo, em vez de "considerar", adota-se a proposta e ponto.
Para a cúpula seguinte, a de Hokkaido, o único passo adiante seria pôr números nas "sérias considerações". Os EUA, no entanto, opõem-se, a menos que haja compromissos de outros grandes emissores, em especial China e Índia, de também reduzirem as emissões.
Com essa meta em vista, Bush organizou, no ano passado, uma nova coalizão, batizada de MME ("Meeting of Major Economies", ou Reunião das Grandes Economias), que reúne o G8 a outros oito países (Austrália, Brasil, China, Índia, Indonésia, México, Coréia do Sul e África do Sul).
Juntos, respondem por 80% das emissões dos gases que provocam o aquecimento global (o que levou um jornal japonês a trocar "major economies" por "major emitters", mantendo a sigla). Um acordo entre eles seria, portanto, o primeiro passo para solucionar o problema.
Só que, nas reuniões prévias, o acordo não apareceu. Tanto que o esboço de declaração final do MME, que também se reúne em Hokkaido, repete a idéia de "considerar seriamente" e apenas acrescenta "[considerar seriamente] ambiciosos cenários" para cortar as emissões até 2050.

Barbarização mundial
O esforço de último momento dos japoneses se volta para as duas pontas do impasse: apela a Bush enquanto oferece à Índia e à China um pacote de incentivos financeiros e tecnológicos para que possam adotar metas ambiciosas de uso eficiente da energia.
A oferta japonesa obedece ao "enfoque setorial" que o G8 está analisando. Trata-se de identificar os cinco maiores poluidores em cada setor e ajudá-los a reduzir as emissões com dinheiro e com tecnologia.
Reduzir as emissões é uma questão vital. "Se nada for feito, as mudanças climáticas poderão levar-nos a uma barbarização no mundo; os ricos se fecharão em comunidades confinadas e protegidas, enquanto bilhões de pobres terão de viver nos lugares destroçados", diz Mohan Munasingh, vice-presidente do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC), o organismo técnico que analisa os efeitos do aquecimento global.
O Brasil chega a Hokkaido com uma proposta ainda mais ambiciosa, já exposta pelo presidente Lula: cortar as emissões entre 60% e 80% até 2050.
Mas a diplomacia brasileira condiciona a adoção dessa meta pelo país a que os países desenvolvidos façam a sua parte.
"O Brasil está disposto a fazer mais, desde que os países desenvolvidos adotem as medidas apropriadas", diz o embaixador Everton Vargas, principal negociador técnico para assuntos multilaterais.
Mas o embaixador mostra-se compreensivo com a hipótese de que os números desse "mais" não surjam em Hokkaido: "Não é plausível, no âmbito do G8 ou do G8+G5, dizer que vamos cortar x% ou y%. E o mesmo vale para os países desenvolvidos".
Se o Japão não conseguir convencer Bush a dizer quanto cortará e, por extensão, puxar os outros grandes emissores a também fazê-lo, ficará valendo a cáustica análise do G8 que ganhou a capa da revista "The Economist" desta semana: "Hoje em dia, cúpulas produzem principalmente extensos comunicados e oportunidades para fotos [dos líderes]". (CR)


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