São Paulo, domingo, 06 de setembro de 2009

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Brasileira entra no ranking de "quem faz o Reino Unido sorrir"

Daniela Barone Soares torna-se referência em responsabilidade social e é citada na lista das cem pessoas que tornam o país melhor

À frente de ONG que busca captar recursos para aplicar em filantropia, economista desponta como "anjo dos negócios" em Londres

Renata Caland Marshall/photodreaming
A economista Daniela Barone Soares, que trocou o setor financeiro pela filantropia em Londres

MARIANNE PIEMONTE
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
DE LONDRES


Ela foi eleita pelo jornal inglês "The Independent" como uma das cem pessoas que fazem o Reino Unido feliz, na anual "Happy List", que aponta quem trabalha para tornar o país um lugar melhor. Teve o rosto estampado em uma página do "Guardian", numa matéria que recebeu o título de "Anjo dos Negócios". No último domingo, o trabalho da brasileira Daniela Barone Soares, 38, também foi assunto no "SundayTelegraph".
Ela é reconhecida como a economista que está transformando a maneira como são feitos os investimentos no setor social no Reino Unido.
Há sete anos morando em Londres, Daniela está há seis à frente da Impetus Trust, ONG inglesa que faz "venture philanthropy", uma modalidade de investimento nova no mercado de capital social. No Brasil, o nome que está se dando a isso é "filantropia de resultados". Nela, empresas como a Impetus usam as ferramentas e o conhecimento do setor financeiro para buscar fundos que são aplicados na filantropia.
Formada pela Unicamp, com mestrado em Harvard, durante dez anos ela atuou na área de finanças. Trabalhou em empresas como Citibank, em São Paulo, e Goldman Sachs, em Nova York. Por dois anos, fez a ponte aérea Boston-Londres, trabalhando em "private equity", no BankBoston. Mas trocou a carreira programada (e eventualmente alguns dígitos em bônus no final do ano) para colocar em prática um sonho de criança. Fazer caridade.
"Faço trabalho voluntário desde os 12. Minha ideia era fazer muito dinheiro para doar, mas o tempo é curto", disse à Folha, na sede da Impetus, em Holborn, atual região de elegantes escritórios londrinos.
Depois de muito refletir sobre como poderia ser mais útil e "fazer a diferença", em 2002 ela deixou o centro financeiro de Londres para dirigir a ONG Save the Children. No ano seguinte, foi escolhida entre 150 candidatos, todos ingleses, para comandar a Impetus Trust.
Hoje, diz que ganha menos em salário do que pagava anualmente em impostos. Essa mudança teve impacto imediato. "Mudei de apartamento e não acumulo mais dinheiro. Foi o preço a pagar, mas hoje vivo de acordo com meus valores", disse. Daniela trocou um apartamento em Bond Street por outro em Camden Town. Numa tradução livre, pode-se dizer que ela trocou um apartamento de alto padrão no Pacaembu por uma casinha de vila em Pinheiros, em São Paulo.

Impactos
Em seis anos, mil ONGs se candidataram a receber auxílio da Impetus. Dessas, só 13 passaram pelas avaliações e conquistaram lugar no portfólio.
Tanta procura tem explicação. Em média, as ONGs sob a tutela da Impetus aumentam o impacto social em 53% ao ano. Nesse caso, exemplos são mais felizes do que porcentagens. A SpeakingUp, entidade que ajuda deficientes mentais a se tornarem independentes, cuidava de 50 pessoas antes de receber o suporte do time de Daniela. Hoje, auxilia 2.500 e passou de um para 27 projetos no país.
Outro caso é o da St. Giles, entidade que atualmente ajuda a reduzir a reincidência de ex-presidiários. Com a ajuda de Daniela, de 2004 para cá a entidade passou de 200 para 1.700 pessoas no número de atendidos, e a taxa de reincidência, que no Reino Unido é de 65%, caiu para menos de 20%.
"A esquizofrenia desse setor é que quem doa acha que sabe mais do que quem administra os fundos. É aí que atuamos, dando proficiência a elas, além de focá-las em suas missões", afirma. Esse resultado fez com que membros do conselho da St. Giles passassem a ser convidados para a mesa do governo britânico quando tratam do assunto "presidiários". "Há também um impacto de influência, que é muito importante", disse.
Para receber o auxilio da Impetus, as regras são rigorosas. A primeira é que a entidade esteja registrada na Charity Comission, órgão regularizador de ONGs e instituições de caridade no Reino Unido. Precisam tratar com os 20% mais pobres da população, gerar empregos e ter ambição. "Não queremos ninguém que queira crescer só 2% ao ano. Minha obsessão é o impacto", disse. Há ainda um processo de entrevistas e conversas, que dura até seis meses.
Tanta cautela está fazendo com que a ONG, e o trabalho de Daniela, comece a se tornar uma espécie de selo de qualidade e responsabilidade social.

Contágio
O dia a dia de Daniela é outro capítulo interessante da história. Muitas vezes, ela toma café da manhã com ex-presidiários, almoça com o secretário do príncipe Charles, como aconteceu na semana passada, e no final do dia é professora voluntária de meditação.
Dorme em média seis horas por dia e diz ser o suficiente por causa da meditação, que pratica há dez anos. "Acordo às 4h. No começo, meditar me relaxava e isso ajudava na concentração. Hoje, me ajuda a ter mais clareza do que quero na vida", disse.
O trabalho de Daniela já se firmou no Reino Unido. Mas e o Brasil? "Sempre acho que vou voltar em algum momento, mas ainda tenho muito o que alcançar na Impetus." Ela disse torcer para que a ideia inspire pessoas no Brasil e, se alguém se animar a fazer o mesmo, oferece apoio. "Estamos totalmente abertos a ajudar. Boas ideias têm grande poder e não tenho que ser eu a dona delas."


Texto Anterior: Banco prepara ofensiva no setor de seguro
Próximo Texto: Frases
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.