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LIÇÕES CONTEMPORÂNEAS
Relações maduras
ALOIZIO MERCADANTE
A Cúpula das Américas de
Mar del Plata cria oportunidade para a discussão da política
hemisférica brasileira e, particularmente, das relações bilaterais
Brasil-Estados Unidos. Infelizmente, o debate sobre esses temas
vem sendo distorcido por avaliações mal-informadas. Tais avaliações colocam ênfase num presumido caráter "ideológico" da política
externa do governo Lula e no seu
suposto "antiamericanismo".
O principal argumento que embasa a crítica ao "antiamericanismo" do governo refere-se ao enrijecimento nas negociações da Alca. Ora, o governo rejeitou a proposta da Alca "ampla" dos EUA
porque considerou que ela colocava ênfase negociadora em temas
do interesse norte-americano, como serviços, compras governamentais e investimentos, mas não
em assuntos do interesse brasileiro, como agricultura e antidumping, os quais ficariam para serem
negociados na OMC. A proposta
da Alca light foi resposta racional
a esse impasse negociador. Porém
indivíduos presos ao esquema
mental da Guerra Fria vêem "antiamericanismo" na proposta brasileira. Ignoram que o impasse verificado na Alca se repete na OMC
e nas negociações entre o Mercosul
e a União Européia. Nossos interesses são defendidos com igual
ênfase em todas as frentes negociadoras.
Na realidade, as relações Brasil-EUA estão num nível muito bom.
Os pontos de confluência estratégica superam, com folga, as áreas de
atrito. Sob a perspectiva econômico-comercial, é preciso considerar
que os EUA são o nosso principal
parceiro desde a Segunda Guerra.
Nos últimos dois anos, o comércio
bilateral cresceu em torno de 22%,
apesar das restrições impostas por
subsídios agrícolas, medidas antidumping e picos tarifários ainda
em vigor. Acrescente-se que os
EUA são o país que mais importa
produtos manufaturados do Brasil. Em relação ao fluxo de capitais, deve-se mencionar que o Brasil é destinatário de mais de um
terço dos investimentos diretos
norte-americanos em indústrias,
na América Latina e no Caribe. Os
interesses econômicos recíprocos
são, portanto, significativos e crescentes.
Já do ponto de vista geopolítico,
a liderança do Brasil na América
Latina, dinamizada no governo
Lula, vem tendo influência moderadora na região e cria interface
importante para as políticas externas de ambos os países. Não há
mais alinhamentos automáticos,
mas sinergia de interesses independentes. Tal sinergia não implica, porém, concordância plena. O
Brasil defende que ações internacionais tenham de se dar no marco do multilateralismo e com base
no respeito incondicional à soberania dos Estados. É em razão dessa filosofia que o Brasil liderou a
missão da ONU no Haiti, mas
condenou a intervenção no Iraque. Nesse sentido, a influência
brasileira funciona como contrapeso regional ao unilateralismo.
Brasil e EUA têm, hoje, parceria
madura, baseada em amplas confluências econômicas e diplomáticas, que convive bem com as divergências normais que ocorrem entre países independentes. Todavia,
a Cúpula e a visita de Bush poderão desencadear processo de
maior aproveitamento do enorme
potencial que as relações bilaterais
Brasil-EUA possuem.
Aloizio Mercadante, 51, é economista e
professor licenciado da PUC e da Unicamp, senador por São Paulo e líder do
governo no Senado Federal.
Internet: www.mercadante.com.br
E-mail -
mercadante@mercadante.com.br
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