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ANÁLISE
Lula reescreve o passado ao prever o futuro
GUSTAVO PATU
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Êxitos e fracassos nacionais
costumam ser explicados depois dos fatos consumados, dado que as ciências política e
econômica são mais hábeis em
interpretar o passado do que
em prever o futuro.
México, tigres asiáticos, Argentina e Irlanda viveram períodos de rápido progresso e foram tidos como exemplos para
os demais até serem devastados por crises em, respectivamente, 1995, 1997, 2001 e 2009.
Depois, com os defeitos de todos devidamente listados, o
passado se tornou previsível.
Apenas três anos atrás, analisava-se por que o Brasil era incapaz de expandir sua renda,
mesmo em um cenário internacional tão favorável. Os dados
de então mostravam que, no
primeiro mandato de Lula, o
crescimento do PIB havia sido
o menor entre as 25 principais
economias emergentes.
Havia um diagnóstico dominante: sofriam-se as consequências de um Estado hipertrofiado, que drenava a escassa
poupança privada e impunha
carga tributária prejudicial às
exportações e aos investimentos; os gastos sociais eram mal
direcionados por privilegiar em
excesso as aposentadorias; o
ambiente institucional era desfavorável aos negócios.
Não era discurso de uma suposta oposição neoliberal -as
teses foram encampadas pelo
governo petista, que apresentou projetos de reformas previdenciária, tributária, das agências reguladoras, para limitar
os reajustes do mínimo e conter gastos com pessoal.
No segundo mandato de Lula, os números do PIB passaram por uma revisão retroativa, e o passado não pareceu
mais tão ruim; vieram dois anos
de bom crescimento, 2007 e
2008, um 2009 menos ruim
que o da maioria e expectativas
de um próspero 2010. O Brasil
agora está na moda, e há um sucesso a ser explicado.
Certamente a explicação não
será a superação dos defeitos
de antes. De lá para cá, a carga
tributária cresceu, o gasto com
previdência e pessoal cresceu
ainda mais e a dívida do governo está em alta neste ano; as reformas pararam, o PAC não
cumpriu suas metas e o país
ocupa o 56º lugar no ranking de
competitividade do Fórum
Econômico Mundial.
Mais simples é permitir uma
leitura mais otimista dos feitos
do período, o que não vale só
para a retórica política local. O
Banco Mundial, por exemplo,
que em 2007 classificou de
"medíocre" e "desapontador" o
desempenho brasileiro contra
a pobreza, neste ano publicou
estudo em que cita o país, ao lado de China e Índia, como paradigma global nessa luta.
Lula tira partido desses humores volúveis e tanto prevê
um futuro brilhante quanto
formula o passado mais conveniente para explicá-lo, de Estado forte, Luz para Todos, Bolsa
Família. E terá razão enquanto
não for necessário recordar os
antigos motivos de fracasso.
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