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LUÍS NASSIF
O risco da sarneyzação de FHC
Nas próximas semanas é
possível que o mercado atravesse uma fase de alívio. Assinatura do acordo com o FMI,
aprovação de algumas reformas, penalização de funcionários públicos ativos e inativos,
cortes na saúde e na educação,
restrição total ao crédito interno. Todos esses atos são recebidos como "heróicos" pela
comunidade financeira internacional, e seus autores, tratados como estadistas. É possível se aguardar, inclusive, alguma volta de recursos à Bolsa de Valores.
Há duas maneiras de encarar a trégua. Uma, é considerar que a crise está superada.
Outra, é aproveitá-la para enfrentar definitivamente a crise. O que de pior poderia
acontecer com o país, agora,
seria a celebração da redução
das saídas cambiais como vitória final.
Nos últimos quatro anos, o
país se comportou como a empresa deficitária, mas que possui crédito na praça e patrimônio para ser gasto. O patrimônio se foi e o crédito acabou. Estatais acumuladas ao
longo de décadas, que poderiam ter servido para financiar a nova etapa de crescimento, foram consumidas no
pagamento de juros.
Agora, com o país quebrado,
conseguiu-se a ampliação no
cheque especial, junto ao FMI.
É o último estoque de dinheiro
para ser queimado. Se forem
repetidos os mesmos erros de
1995 e 1997, não haverá nova
chance.
A primeira precaução a se
tomar é levantar barreiras à
volta do capital especulativo.
Fechado o acordo com o FMI,
haverá saldo em caixa para
minimizar os riscos de "default" no curto prazo. Esse fato poderá ser um estímulo à
volta dos capitais especulativos.
A crise recente revelou que a
manutenção irresponsável
desses US$ 20 bilhões a US$ 30
bilhões de dinheiro arisco nas
reservas gerou dois problemas
cruciais para o país. O primeiro, a elevação substancial da
dívida interna, devido aos juros pagos para atraí-los. O segundo, a crise de credibilidade, que a fuga indiscriminada
desses capitais ajuda a potencializar. Manter US$ 70 bilhões em reservas, sendo US$
30 bilhões de capitais especulativos, foi muito pior do que
ter permanecido com US$ 40
bilhões em reservas de capital
bom.
A segunda preocupação é
que o ajuste fiscal não é saída
para a solução das contas externas brasileiras. A redução
dos déficits comerciais será
conseguida à custa de uma recessão cavalar. Só que é a teoria da mola. Tirou o peso de
cima, a mola volta a se estender. A não ser que se queira
entrar o milênio com o país
imerso em recessão, não se alcançou a solução auto-sustentada.
²
Romper impasses
O problema crucial dessa
travessia é que a atual equipe
econômica esgotou seu estoque de alternativas para a crise. Há uma incapacidade
atroz de pensar saídas fora do
convencional.
A começar pelo próprio presidente da República, qualquer tentativa de romper com
uma inércia que aprofunda
dia a dia à crise é espantada
por temores do que possa vir a
acontecer. Como se, não acontecendo nada, a crise fosse esconjurada por si. O palpite de
FHC é que se reduzir os juros
imediatamente haverá uma
fuga de dólares das reservas.
Se ampliar a banda cambial,
sobrevém uma crise mortal.
A situação é muito semelhante ao que ocorreu no início dos anos 90, com a entrada
de Fernando Collor. Nesse
sentido, o governo FHC corre
o risco de sarneyzação, se não
mudar rapidamente os rumos.
Na época, não se podia mexer nas aplicações ao portador, porque o dinheiro iria desaparecer do país. Não se podia alterar a política cambial,
porque a crise seria inevitável.
Não se podia abrir a economia, porque os capitais iriam
desaparecer.
O governo se meteu no mesmo novelo de indecisões que
paralisou completamente o
governo Sarney, após o fracasso do Cruzado. Mas manteve-
se coesa a base parlamentar
ao preço de favores, não de
projetos.
Mesmo com todos os seus defeitos, Collor rompeu com todos esses impasses, assumindo
a estatura de estadista -que
é justamente o governante que
ajuda a apontar o novo rumo,
quando o impasse paralisa a
nação.
Não se vai sair dessa sem o
concurso de pessoas que pensem de maneira diferente à
crise. Permanecer nesse rame-
rame de aumentar impostos,
manter juros elevados, conseguir o derradeiro empréstimo,
confiando que a natureza
complete por si a obra de tornar o Brasil exportador, será a
maneira mais completa de
completar o ciclo do caos.
O presidente, que começou
como a grande esperança reformadora do país, corre o risco de se tornar um novo Sarney se não seguir o último
conselho dado por Sérgio Motta: "Não se apequene".
²
Vereadores
A proposta do ainda senador
Esperidião Amin, de estabelecer limites aos gastos das câmaras de vereadores, merecia
ser ampliada. Deveria se abolir por completo as remunerações dos vereadores. Não há
lógica vereadores sendo remunerados para participar de
uma ou duas sessões por semana -como acontece na
maioria absoluta dos municípios.
Hoje em dia, não existe pior
balcão de negócios no setor
público do que a Câmara de
Vereadores. Quando a função
passou a ser remunerada,
atraiu um grupo enorme de
aventureiros, afastando os cidadãos com vocação comunitária. As boas vocações políticas tornaram-se minoritárias.
As vozes independentes que
surgem numa Câmara servem
apenas de álibi para que os
negocistas ampliem seu preço.
E-mail: lnassif@uol.com.br
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