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OPINIÃO ECONÔMICA
FMI como fachada
PAULO NOGUEIRA BATISTA JR.
Para subdesenvolvidos, como
nós, nada mais instrutivo, nada
mais revelador do que escutar o
que dizem os desenvolvidos.
Não quando se dirigem a nós
-é claro-, mas quando conversam e brigam entre si sobre
temas que também nos interessam. Nesses diálogos entre os ricos transparecem, não raro, aspectos cruciais das relações econômicas internacionais.
Vejam a questão do FMI, por
exemplo. Valeria a pena sair da
nossa habitual introversão e dar
um pouco mais de atenção à intensa controvérsia, que está em
curso nos países desenvolvidos
desde fins de 1997, sobre o papel
dessa instituição.
Dentro do establishment financeiro, político e acadêmico
dos EUA e de outros integrantes
do G-7, vozes de peso têm questionado os métodos, a estrutura
e a própria existência do FMI. A
intensidade dessas críticas obrigou o fundo e seus defensores,
dentro e fora dos círculos governamentais, a sair da toca e a recordar ou explicitar questões
que costumam ficar nas entrelinhas.
Por exemplo, o último número
da prestigiada revista norte-
americana "Foreign Affairs"
(edição de novembro/dezembro) traz uma reveladora defesa
do papel do FMI, visto pela ótica
dos EUA. No artigo "O FMI,
agora mais do que nunca", David Hale, economista-chefe do
Zurich Group e consultor do Departamento de Defesa do governo dos EUA, explica ao leitor
norte-americano o modo pelo
qual essa instituição, que foi objeto de severas críticas em edições anteriores da revista, serve
aos interesses do país.
Hale observa que, "embora o
Fundo permaneça sob pesada
influência dos Estados Unidos e
de outros países do G-7, ele ainda oferece uma aparência de
autonomia que torna as suas
propostas politicamente mais
aceitáveis para os tomadores de
empréstimos". De fato, essa
"aparência de autonomia" facilita a superação das resistências
nacionais a políticas de abertura e liberalização defendidas
pelos países que comandam o
FMI.
Desde os tempos da Guerra
Fria, os EUA têm utilizado o
FMI como um instrumento da
sua política externa, lembra Hale. "Os EUA têm moldado decisivamente a agenda do FMI", escreve ele, "exigindo a liberalização do comércio e do investimento em países que teriam de outra
forma resistido à implementação
dessas políticas por meio de canais bilaterais".
Depois do fim da Guerra Fria,
os países centrais, particularmente os EUA, passaram a servir-se do FMI e de outras instituições multilaterais, como o
Banco Mundial e a ONU, de maneira muito mais desinibida. A
Coréia do Sul é um exemplo recente de como o FMI tem sido
utilizado para fazer avançar os
objetivos nacionais de países do
G-7, ponto que já havia sido ressaltado em artigo publicado anteriormente pelo economista
Martin Feldstein na mesma "Foreign Affairs" (edição de março/
abril de 1998).
Aproveitando-se da fragilidade financeira da Coréia, os EUA
e o Japão valeram-se do FMI para extrair várias concessões do
governo daquele país, entre elas
diminuição de barreiras à importação de produtos japoneses
específicos e uma ampla abertura do mercado coreano a investidores estrangeiros. Lawrence
Summers, o subsecretário do Tesouro dos EUA, resumiu os acontecimentos com uma franqueza
pouco habitual nas manifestações de funcionários governamentais: "O FMI fez mais para
promover a agenda comercial e
de investimentos dos EUA na Coréia do que 30 anos de entendimentos comerciais bilaterais".
Para um país do porte do Brasil, que tem inevitavelmente diversas divergências e pendências
com os EUA e outros países desenvolvidos, a tutela do FMI pode acabar se revelando muito
mais cara do que parece à primeira vista. Como ficarão, por
exemplo, as negociações relativas à Área de Livre Comércio das
Américas (Alca) agora que o governo brasileiro está de pires na
mão, pendurado em empréstimos de emergência do FMI, dos
EUA e de outros governos estrangeiros?
Por isso é que eu sempre digo e
repito e insisto: o mais importante para o Brasil é trabalhar duro
para diminuir o mais rapidamente possível a dependência financeira externa em que fomos
lançados pela política econômica dos últimos anos.
P.S.: Depois dessa exortação ao
trabalho duro, comunico, meio
constrangido, que estou saindo
de férias por um mês. Volto no
início de fevereiro.
Paulo Nogueira Batista Jr., 43, economista e
professor da Fundação Getúlio Vargas, escreve às quintas-feiras nesta coluna.
E-mail: pnbjr@ibm.net
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