São Paulo, terça-feira, 07 de fevereiro de 2006

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

LUÍS NASSIF

O investimento externo e a poupança

No chamado mercado há três classes de profissionais: os estrategistas, os economistas e os operadores. Os primeiros tentam pensar a economia mundial e as nacionais de forma sistêmica, valendo-se bastante da intuição e do conhecimento para entender as inter-relações entre setores e países. Os segundos trabalham com métodos quantitativos, sendo uma espécie de linha auxiliar dos estrategistas. Já os operadores são os que não querem saber muito de conversa. Percebem para onde os ventos caminham e vão atrás, sem esperar por explicações mais sofisticadas dos estrategistas e economistas.
Pois os operadores -com exceção dos bancos de investimentos norte-americanos- já não acordam de manhã olhando as taxas longas dos títulos americanos. Primeiro olham para a China e a Ásia. Depois, pela Europa. Só então vão olhar a economia norte-americana.
Não que os EUA tenham deixado de ser potência, mas sua economia não conduz mais a economia mundial. Na cabeça objetiva dos operadores, o centro é a China e, momentaneamente, os países emergentes -pela possibilidade de uma enxurrada de dólares atrás das perspectivas de crescimento dos países saudáveis, ou dos juros elevados dos países doentes.
E aí se entra em uma questão tabu: vale a pena o Brasil continuar recebendo essa enxurrada de dólares, com a redução do custo Brasil?
Há um setor claramente beneficiado pela melhoria do rating que são as empresas brasileiras com acesso a crédito internacional. Nesse grupo, há três tipos de empresa: as que utilizam esses recursos internamente, como substituto do crédito interno; as que utilizam para financiamento de exportações e/ou importações e as que utilizam para investimentos no exterior.
A captação externa seria relevante se, por meio do instrumento da arbitragem, permitisse uma redução das taxas internas, para acompanhar as externas. Mas o que o Tesouro faz de dia o Banco Central desfaz à noite.
Sejam quais forem os beneficiários, se a captação não for para exportação ou para financiar importação, ou para investimentos externos, será que o país teria a ganhar mantendo esse fluxo? Há o chamado efeito-substituição quando o BC aumenta as reservas -emite reais para comprar os dólares e depois emite títulos para enxugar os reais. Se não compra, há a apreciação do câmbio.
Há poupança interna suficiente para financiar o desenvolvimento. Neste mês mesmo, o Tesouro começará a troca de LFTs (pós fixadas) por LTNs (prefixadas). Em breve, os prazos se esticarão e se acabará com essa jabuticaba brasileira, de um investimento sem risco, com liquidez total e rentabilidade absurda -os títulos públicos.
É hora de começar a pensar nesse novo mundo que vem por aí. Com a redução das taxas de juros e a mudança de pós para pré dos títulos, com a ampliação dos prazos, poderá haver uma mera troca de ativos, ou se poderá canalizar esse dinheiro para a produção.
Provavelmente, não na fórmula "bife a cavalo" proposta ontem pelo ministro da Fazenda, Antonio Palocci -em que os contribuintes entram com a carne, e o BC com o ovo da política monetária.

E-mail: Luisnassif@uol.com.br


Texto Anterior: Habitação: Lula lança hoje pacote da construção
Próximo Texto: Aéreas: Participação da Varig no mercado cai abaixo de 20%
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.