São Paulo, quarta-feira, 07 de março de 2007

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VINICIUS TORRES FREIRE

O problema de Bush com o álcool

Além da oferta de miçangas, visita pode não render mais que vagos acordos científicos no álcool e politiquices

BUSH foi mão-de-vaca na distribuição de miçangas aos nativos, nós. As ataduras que prometeu são fichinha diante dos petrodólares populistas do novo "guia genial dos povos", Hugo Chávez. O que Bush veio fazer além de faturar a mercê que oferece a Lula, a "photo opportunity", e o tradicional "tour" de responsabilidade social, a nova versão do chá de caridade?
Álcool? Os produtores brasileiros dizem que a visita de Bush é política.
Como se sabe, Bush não tem como atropelar a bancada ruralista dos EUA e suas tarifas de importação do álcool do Brasil. Embora os EUA já levem mais da metade das exportações brasileiras de álcool, parte do produto nacional tem de ser vendida via triangulação, pelo Caribe e América Central.
O Caribe pode vender aos EUA o equivalente a 7% do consumo americano de álcool, sem tarifa de importação (trata-se de um incentivo à indústria da região, a "Caribbean Basin Initiative"). O bloco Caribe-América Central é o segundo maior importador de álcool do Brasil.
Americanos e brasileiros instalam usinas no Caribe e na América Central a fim de converter em álcool anidro o hidratado que compram do Brasil e exportá-lo para os EUA. A trading brasileira Coimex fez uma usina na Jamaica. A Crystalsev e a Cargill desidratam álcool em El Salvador. Juntas, reciclam mais de 300 milhões de litros de álcool, 10% da exportação brasileira. Projetam mais usinas. Os equipamentos industriais são paulistas, da Dedini, de Piracicaba, e da Sermatec, de Sertãozinho. É negócio. O Itamaraty auxilia a expansão caribenha.
Bush quer que os brasileiros ajudem a criar um mercado mundial de álcool. Que o Brasil exporte tecnologia de agricultura tropical a fim de implantar fazendas de cana nas Américas, na África e no sul da Ásia.
Também seria do interesse do Brasil poder importar álcool, a fim de regular a oferta em momentos de crise, diz Heloisa Burnquist, especialista em economia da cana na escola de agricultura da USP, a Esalq.
O Brasil pode se beneficiar da pesquisa americana sobre a conversão de bagaço e palha em álcool, diz Heloisa (o Brasil também pesquisa, mas tem muito menos dinheiro). Isso é coisa para 2010, porém. Mas o produtor brasileiro não quer produzir alhures. As condições ambientais, técnicas e de mercado são muito superiores no Brasil, que ainda tem terras disponíveis, as únicas no mundo "prontas" para a expansão da cana. De resto, parte dos brasileiros desconfia do negócio caribenho. Por ora, é um desvio razoável. E se a tarifa americana cai, o que fazer com o investimento?
O mercado seguirá o caminho do seu interesse e as tarifas barram o aumento do comércio com os EUA. Se Bush ficar em vagos "protocolos de cooperação científica", a visita tende a ser outro fiasco diplomático de Lula. Lembram da China? Pfui.


vinit@uol.com.br

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