São Paulo, sexta-feira, 07 de março de 2008

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VINICIUS TORRES FREIRE

O caldo volta a entornar

Fundos de investimento voltam a dar calotes devido à crise imobiliária, o que reaviva temor de nova xepa na finança

AS SENHORAS E os senhores destemidos o bastante para jogar nas altas e nas baixas da Bolsa não devem ter se espantado com a evaporação de 2,5% do Ibovespa, coisa corriqueira com ações brasileiras, ainda mais nestes tempos de desalavancagem global. Mas há razoável probabilidade de o caldo engrossar nos próximos dias.
Três empresas, "fundos", de investimento, fizeram "bum" nesta semana, sendo o caso mais recente e explicitado o do Carlyle Capital. Os três se estropiaram, bidu, com derivativos de crédito imobiliário. Para piorar o ambiente, faz dois dias persiste o rumor de que o bancão suíço UBS vendeu de US$ 20 bilhões a US$ 25 bilhões de seus investimentos em papéis imobiliários, a preço de banana, com descontos chutados entre 70% e 85% do valor de face.
Se vendeu, não vendeu os agora já velhos conhecidos papéis lastreados em empréstimos imobiliários de segunda linha, os "subprime". Vendeu papéis "Alt-A", muito prazer, empréstimos para gente com histórico de crédito melhor, mas concedidos sem a checagem de renda do tomador, papéis que começaram a apodrecer mais neste ano.
Os três fundos tomavam dinheiro emprestado, a curto prazo, para investir em títulos de renda derivada de prestações imobiliárias. No caso do Carlyle, a alavancagem, o total de empréstimos, equivale a 30 vezes o capital do fundo, estima-se.
A deterioração geral do mercado nas duas últimas semanas fez tais papéis perderem valor. Os bancos emprestadores (mais precisamente, as corretoras do negócio) pediram mais "margem", mais dinheiro para compensar a perda excessiva do valor dos papéis dos fundos, papéis aliás, em tese, de melhor qualidade, "garantidos" pelas empresas paraestatais de securitização de dívida imobiliária dos EUA. Os fundos venderam alguns desses títulos, mas não fizeram dinheiro bastante para honrar algumas chamadas de margem. Foram chamados oficialmente de caloteiros por alguns bancões.
Se mais fundos quase-quebrarem e tiverem de liquidar papéis, o valor deles cai e recomeça a ciranda baixista que deu até agora em US$ 181 bilhões de baixas contábeis no balanço dos bancos. Se sobrevém nova rodada de queda no capital dos bancos, aumenta a secura de empréstimos, o que acelera o processo de desalavancagem da farra financista da última década.
Tudo isso azedou um mercado que já andava com azia e aziago, deteriorado ainda ontem por péssimas notícias, tais como a do recorde na retomada de imóveis residenciais por falta de pagamento.
Enfim, foi reavivado, por ora em escala menor, o círculo vicioso de desvalorização de ativos financeiros que vai e volta desde pelo menos agosto de 2007. As ações de instituições financeiras e as de bancos americanos, donos de baciadas de papéis imobiliários, caíram muito e foram achadas de novo no lixo, em baixa de quase uma década, como as do Citigroup, que aliás anunciou que vai se desfazer de metade de seu negócios de títulos imobiliários nos próximos 12 meses. As ações brasileiras, embora relativamente "descoladas" das americanas, no entanto não têm escapado desses ciclos mais sinistros da crise financeira. Que está com cara de recomeçar.


vinit@uol.com.br

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