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TENDÊNCIAS INTERNACIONAIS
Choque do petróleo aumenta o desequilíbrio global
GILSON SCHWARTZ
ARTICULISTA DA FOLHA
Não há dúvida: é um choque.
Os preços do petróleo subiram
35% nos últimos dois meses,
fruto da guerra entre Israel e a
Autoridade Nacional Palestina.
No Brasil, vai para a gaveta até
segunda ordem o discurso mais
recente do presidente do Banco
Central, Armínio Fraga, que sugeria uma série muito provável
de reduções da taxa de juros ao
longo do ano (eleitoral).
A incerteza global aumentou.
Mas essa mudança de cenário
ainda não gerou um novo consenso sobre o rumo do mundo.
Do ponto de vista estritamente
técnico, focado na análise do
preço do petróleo e de sua importância na economia mundial, há quem argumente que
não há razões para pânico.
É o caso da agência Stratfor,
consultoria privada que publica
um site de análises
(www. stratfor.com). A empresa
registra o consenso no mercado
de que o "prêmio de guerra" no
atual preço do petróleo é da ordem de no máximo US$ 5 por
barril (cujo preço fechou na semana passada em torno de US$
27). Há quem acredite na estabilidade dos "fundamentos" do
mercado mundial de petróleo. O
inverno ameno nos EUA desaqueceu a procura. A guerra e a
lenta recuperação da economia
norte-americana voltam a aquecê-la.
Mas o Ocidente já não depende tanto assim do petróleo (e aí
reside um elo frágil da causa árabe-palestina). Os EUA consomem hoje apenas 60% de petróleo por dólar do PIB em comparação com o ano de 1973, quando houve um choque que abalou a economia mundial. Segundo a Stratfor, para que um choque tivesse hoje efeito comparável ao da década de 70, o preço
do ouro negro teria de chegar a
US$ 90 por barril. É fato que a
guerra no Oriente Médio tem
muita gravidade, mas não parece razoável supor que as cotações cheguem perto desse nível
hipotético.
Pior: um aumento excessivo
nos preços do petróleo provocado por novo boicote dos países
árabes atingiria principalmente
a Ásia, ainda fortemente dependente de combustíveis fósseis
para seu crescimento. E os países asiáticos têm sido, ao lado
dos europeus, linha de apoio
importante à causa palestina.
Até os europeus já sentem que
o problema crucial agora não é o
choque do petróleo, mas o seu
impacto diferenciado (menos
intenso nos EUA que na UE).
Na semana passada, o Banco
Central Europeu já declarou que
está preocupado com o efeito inflacionário da alta do petróleo.
Fica mais receoso de reduzir os
juros. Como nos EUA tem ocorrido uma longa série de cortes
nas taxas de juros, aumentou
muito a diferença nos ritmos de
crescimento entre EUA, UE e Japão. Essa assincronia entre as
trajetórias das maiores economias do planeta é um risco mais
sério que o petróleo em si. O
crescimento dos EUA é agora
pelo menos cinco vezes maior
que o europeu.
Estariam os analistas norte-americanos tomados por uma
nova dose de euforia ou efeito
Polliana (transformar todas as
más notícias em vantagens)?
O fato é que circula também a
tese de que a alta do petróleo é
boa, pois o risco que representa
para a recuperação da economia
norte-americana levaria o presidente do Fed (banco central dos
EUA) a deixar os juros onde estão, em vez de começar a elevá-los (o cenário predominante).
Em suma, a análise econômica
não dá base a uma visão maniqueísta em que o choque do petróleo reforçaria o confronto
"civilizacional" entre Oriente e
Ocidente, Islã e Capital. A incerteza aumenta, os desequilíbrios
se agravam. Mas isso corre de forma não linear e de modo cada vez mais imprevisível.
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