São Paulo, domingo, 07 de junho de 2009

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Setor de cartões não repassa redução de custo

Empresas não transferem aos lojistas e aos consumidores os ganhos de escala na tecnologia, aponta estudo do governo

Redecard e VisaNet terão de sugerir meios de aumentar a competitividade do setor; governo já ameaça com investigação sobre cartel

DA REPORTAGEM LOCAL

O mercado de cartões de crédito no Brasil apresenta anomalias graves que impedem a concorrência e oneram excessivamente os lojistas. Em última análise, os consumidores são também prejudicados, porque o alto custo para trabalhar com cartões é transferido para o preço dos produtos.
Essa é a conclusão do levantamento feito pelo Banco Central, pela Secretaria de Direito Econômico (ligada ao Ministério da Justiça) e pela Secretaria de Acompanhamento Econômico (Fazenda).
As principais conclusões do trabalho são as seguintes:
1) Nas transações com cartão de crédito no Brasil, o prazo entre a data de compra e a data do crédito ao estabelecimento vendedor é, em geral, de 30 dias. No exterior, o prazo praticado é de 2 dias.
Essa diferença de prazo permite aos bancos emissores de cartões no Brasil, coincidentemente proprietários da Redecard e da VisaNet, que não arquem com o custo do dinheiro durante o período. Não há risco, já que os portadores dos cartões pagam suas faturas em média 27 dias após a compra.
2) No Brasil, os comerciantes pagam aluguel de até R$ 80 por terminal de captura, conhecido como POS (do inglês "point of sale", ou ponto de venda). Os credenciadores no Brasil são os únicos no mundo que utilizam redes segregadas de terminais POS.
Isso significa que as maquininhas não conversam umas com as outras. O comerciante tem de alugar um terminal para cada bandeira de cartão com que trabalha. "Em 2007, a receita auferida pela VisaNet e pela Redecard seria mais do que suficiente para comprar todo o respectivo imobilizado", segundo o estudo do governo.
3) A rentabilidade da VisaNet e da Redecard está há longo período de tempo bem acima daquela verificada em atividades com características de risco empresarial assemelhadas. O lucro da Redecard e da VisaNet subiu 302% entre 2003 e 2007, enquanto o número de cartões ativos subiu 94%.
4) As reduções de custos advindas de ganhos de escala na tecnologia não estão sendo repassadas para os estabelecimentos. "De acordo com a estrutura adotada no Brasil, onde o credenciamento das principais bandeiras é exercido de forma monopolizada, os credenciadores se beneficiam mais fortemente dessas economias [de escala]."
Esses são apenas alguns dos achados mais visíveis. Há outros, intangíveis.
Hoje, quem quiser competir com a VisaNet e a Redecard será obrigado a utilizar os serviços de compensação e de liquidação das próprias empresas, o que barra a entrada de competidores.
As duas empresas que controlam o setor têm até o fim deste mês para apresentar suas críticas ao trabalho e oferecer sugestões para elevar a competitividade do mercado que atualmente dominam.
Se julgar insuficientes essas soluções, o governo poderá promover uma investigação para averiguar a possível formação de cartel e abuso de poder econômico no setor.

Barreiras
Diretor de Política Monetária do BC, o economista Mario Gomes Torós disse à Folha que o governo já tem um leque de alternativas para elevar a competitividade do setor.
"Fizemos um diagnóstico técnico sobre a indústria, baseado nas melhores práticas de mercado", disse ele. "O estudo mostrou um alto grau de verticalização da indústria e apontou alternativas que podem melhorar a competitividade, com benefícios à sociedade."
O Ministério da Fazenda diz que as práticas, as taxas e os prazos cobrados pelas empresas credenciadoras de cartões de crédito são incompatíveis com o momento atual da economia, com estabilidade e juros baixos. A Fazenda diz estar preparada para adotar medidas mais drásticas, se for o caso.


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