São Paulo, segunda-feira, 07 de julho de 2008

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Merkel diz que crise da inflação ameaça segurança internacional

ENVIADO ESPECIAL A HOKKAIDO

A chanceler alemã (primeira-ministra), Angela Merkel, enviou carta a seus pares do G8 dizendo que a crise provocada pela disparada de preços de alimentos poderia "pôr em perigo a democratização, desestabilizar os Estados e se transformar em problema para a segurança internacional". Parte da carta vazou para o semanário alemão "Der Spiegel", que começa a circular hoje.
A avaliação de Merkel combina à perfeição com comentários igualmente alarmistas de entidades multilaterais. Tanto o Fundo Monetário Internacional como o Banco de Compensações Internacionais (o banco central dos bancos centrais) usaram "situação crítica" para definir o momento que atravessa a economia global.
Robert Zoellick, presidente do Banco Mundial, também em carta aos líderes do G8, preferiu comparar a crise a um tsunami, com a agravante de ter sido produzida pelo homem, não por um fenômeno natural.
Merkel, ao embarcar para o Japão, afirmou que o grupo dos sete países ricos do mundo mais a Rússia, anunciará uma série de medidas para aliviar a crise alimentar no curto prazo e estabelecerá uma estratégia a longo prazo para aumentar a produção mundial.
No cardápio dos líderes, no entanto, não figura nada além de promessas de ajuda aos países hiperpobres, os 44 que perderam entre 3% e 10% de sua riqueza como conseqüência da disparada combinada de preços de petróleo e alimentos.
Não há, em princípio, nada de relevante na pauta para tentar conter a alta de preços, que causa problemas também para países "classe média", como o Brasil, e para os pobres até de nações ricas.
Tanto que o primeiro-ministro japonês, Yasuo Fukuda, limitou-se a dizer ontem, após se reunir com o presidente Bush, que os dois concordaram em que há necessidade de "esforços expeditos sobre esses temas [altas dos alimentos e do petróleo]". Nada mais.
Não há nem sequer acordo sobre as causas da disparada de preços, seja de alimentos, seja do petróleo. Países como a França, a Alemanha e a Itália põem ênfase na acusação aos especuladores, ao passo que o secretário do Tesouro dos Estados Unidos, Henry Paulson, recorre à antiga mas nunca revogada lei da oferta e procura. Afirma que o desequilíbrio entre uma demanda superaquecida e uma oferta contida levou aos picos dos preços.
A falta de clareza sobre as causas faz os líderes do G8 atirarem para todos os lados. Ontem, o jornal "The Daily Yomiuri", o mais bem informado sobre as negociações técnicas para a cúpula de Hokkaido, diz que o grupo pretende fortalecer a cooperação com vistas a promover a energia nuclear como forma de reduzir a dependência do petróleo.
Até que o preço do petróleo começasse a disparar, a energia nuclear era uma espécie de besta-negra, principalmente para os ambientalistas, o que levou à paralisação ou a uma lentidão na construção de novas usinas desse tipo na Europa.
Relançá-la no debate justamente quando se discute simultaneamente ambiente é uma demonstração de desespero ou impotência ante os níveis de preço do barril de petróleo.
Além disso, é contraditório com a ênfase que os Estados Unidos põem em paralisar o programa nuclear do Irã, alegando que não é para uso pacífico, ao contrário do que dizem os líderes iranianos.
Ainda ontem, Bush voltou a cobrar que o Irã atenda "as justas demandas do mundo" e suspenda "de maneira verificável o programa de enriquecimento de urânio". O urânio enriquecido tanto serve para finalidades pacíficas, como as que o G8 quer agora estimular, como para a bomba atômica.
Por isso, a cooperação para disseminar a energia nuclear como contraponto ao petróleo deverá ser cercada de cautelas, sempre segundo o "Daily Yomiuri". Entre elas, proibir o uso de tecnologias associadas à energia nuclear para desenvolver armas atômicas.
(CLÓVIS ROSSI)


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