São Paulo, terça-feira, 07 de julho de 2009

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BENJAMIN STEINBRUCH

Reaprender a investir


Será preciso reaprender a investir; o ganho fácil e despreocupado do mercado está com os dias contados


NOS TEMPOS da hiperinflação, até pequenos investidores brasileiros se acostumaram a fazer aplicações no overnight. Cada centavo que caía na conta corrente era automaticamente aplicado. Depois do Plano Real, em 1994, com a queda da inflação, a farra financeira continuou, porque as taxas de juros internas mantiveram-se entre as mais altas do mundo por 15 anos. Nessas condições, ganhar dinheiro com aplicação financeira sempre foi muito fácil. Bastava deixar os recursos na mão de um gerente de banco para aplicação em renda fixa. Esse cenário tipicamente brasileiro começou a mudar. Em plena crise global, a aplicação financeira com maior rendimento no primeiro semestre foi em ações. O índice da Bolsa de São Paulo valorizou-se 37% em no período, variação que melhorou bastante as perdas sofridas após o baque de setembro de 2008. CDBs, fundos DI e de renda fixa, por sua vez, tiveram baixa rentabilidade, em torno de 5% em média no semestre. A caderneta de poupança pagou 3,58%, valor sobre o qual não há IR.
O novo cenário dos investimentos é consequência direta da redução dos juros básicos, pela primeira vez desde a criação da Selic, para o nível de um dígito (9,25% ao ano). Essa taxa ainda é muito elevada, porque representa mais do que o dobro da inflação prevista para os próximos 12 meses. Apesar disso, já provoca enormes mudanças no mercado de investimentos e poderá fazer uma revolução se o Banco Central aplicar novos cortes na Selic.
O brasileiro terá de reaprender a investir. O ganho fácil e despreocupado do mercado financeiro pode estar com os dias contados. Já no primeiro semestre, alguns fundos tiveram rendimento negativo, inferior à inflação. Em junho, muitos perderam para a poupança. Nessas condições, investidores que nunca haviam perguntado ao gerente qual é a taxa de administração cobrada pelo fundo levaram um susto ao saber que pagam de 4% a 5% do rendimento. A partir de agora, o investidor terá de ficar muito mais atento à taxa de administração e à possibilidade de diversificar suas aplicações para a poupança ou para áreas de maior risco.
A valorização das ações no primeiro semestre foi excepcional. Essa tendência decorre em grande parte da entrada líquida de R$ 10 bilhões em capital estrangeiro na Bolsa, embora esse fluxo tenha sido negativo em R$ 1 bilhão em junho.
O ritmo de alta da Bolsa poderá se repetir neste semestre, mas alguns fatores devem ser considerados por quem pensa em investir no mercado de risco. Apesar do baixo rendimento previsto para as aplicações de renda fixa, é preciso considerar que ações são sempre um investimento de longo prazo e que o ganho de curto prazo é para especuladores profissionais. Deve-se levar em conta também que há uma clara disposição do governo em estimular investimentos produtivos. Na semana passada, em fato inédito, o BNDES anunciou que passará a financiar a compra de máquinas e equipamentos com juro zero (a taxa será de 4,5% ao ano, igual à inflação anual prevista). Outro fato revelador foi o sucesso do lançamento inicial de ações da Visanet, que captou R$ 8,39 bilhões no mercado, numa demonstração de que há espaço para novas ofertas.
Esse cenário, portanto, traz uma novidade para a economia: o investidor brasileiro terá de passar por um período de reaprendizado, porque os rendimentos financeiros serão menores e o investimento no setor produtivo tenderá a valorizar-se. E isso é uma notícia muito boa para a economia como um todo.

BENJAMIN STEINBRUCH , 55, empresário, é diretor-presidente da Companhia Siderúrgica Nacional, presidente do conselho de administração da empresa e primeiro vice-presidente da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo).
bvictoria@psi.com.br



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