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São Paulo, quinta-feira, 07 de agosto de 2003

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LUÍS NASSIF

Os melindres do BC

Por que o compulsório não baixou até agora? Tecnicamente não há razão para não cair. Há algumas semanas, o ministro da Fazenda, Antonio Palocci Filho, informou a algumas fontes que o compulsório cairia. Dias atrás foi a vez do ministro José Dirceu (Casa Civil). Há consenso no mercado para que isso ocorra, mas o BC resiste de forma inexplicável.
Nesta semana o presidente do BC, Henrique Meirelles, mandou informar os setoristas que o compulsório cairia quando a instituição julgasse conveniente. Isso logo depois de José Dirceu ter acenado com a possibilidade da queda.
Há cheiro no ar de que por trás da intransigência do BC se escondam melindres de seu presidente pelo fato de a informação ter sido adiantada por terceiros. E aí se entra em um ponto delicado na questão das expectativas do mercado e das políticas institucionais.
Nos últimos anos radicalizou-se a idéia de que o BC precisa ser completamente independente. Levou-se a tal extremo essa posição que se jogou para segundo plano um pré-requisito essencial para a independência do BC: a competência e a personalidade de seus dirigentes. Quanto maior a independência e a relevância do cargo, maiores as qualidades a serem exigidas de seus mandatários.
Em abril alertava-se aqui para o erro de gradação do BC na política econômica e cambial. Os efeitos ainda não haviam aparecido. Agora aparecem em toda sua plenitude, acirrando a crise social e econômica, trazendo de volta a instabilidade cambial. E o BC resiste em acelerar a queda de juros, em abrandar o compulsório, em corrigir o câmbio, mesmo com a economia em deflação e em crise aberta. Há indícios de suscetibilidades feridas por trás dessa teimosia.
Em qualquer parte do mundo, há que dar relevância a aspectos da personalidade dos homens públicos que, de alguma forma, possam influir no seu desempenho à frente do cargo. Tudo o que não interferir no exercício da função está preservado pelo direito à privacidade. O que interfere deve ser objeto de avaliação.
Claramente, o BC está em mãos pouco experientes e tem um presidente de personalidade controvertida. Meirelles tem componentes de grandeza no seu temperamento que precisam ser devidamente sopesados. Ficou claro na apresentação do seu currículo, e em diversos episódios de sua vida profissional, inclusive na pretensão, ao retornar ao país, de aspirar nada menos que a Presidência da República.
Repito: são características que não depõem contra a pessoa em si, mas que pesam na avaliação da ação pública. Quem garante que essa insistência do BC em manter esse torniquete sobre a economia, mesmo com ela se esvaindo em sangue, não tenha um objetivo de auto-afirmação?
O importante a considerar é que existe razoável consenso no mercado de que a política adotada pelo BC já tenha ultrapassado os limites do conservadorismo para entrar no da temeridade. Já não cola mais a cantilena de que as críticas ao BC visam influir politicamente em decisões técnicas. Tecnicamente, o BC está quebrando o país. E a maioria dos analistas coerentes já sabe disso.
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