São Paulo, terça-feira, 07 de outubro de 2008

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ARTIGO

Pânico mostra que crise é de 1ª grandeza

TONY JACKSON
DO "FINANCIAL TIMES", EM LONDRES

O NOVO surto de pânico que aconteceu ontem nos mercados mundiais oferece a prova final de que, em termos de crise financeira, estamos agora enfrentando um evento de primeira grandeza. As comparações com a bolha da internet ou mesmo com a crise asiática de 1997 são inadequadas. Devemos pensar em 1987 ou 1929.
Em retrospecto, a crise de 1987 foi muito mais contida que a atual. A queda breve e feroz das ações de todo o mundo parecia prenunciar uma retração igualmente severa na economia real. Mas o mundo real seguiu em frente e as demais categorias de ativos escaparam em larga medida incólumes.
Em comparação a 1929, temos duas grandes diferenças, hoje. Primeiro, as autoridades mundiais compreenderam a escala da ameaça de maneira mais rápida e estão preparadas para tomar medidas muito mais drásticas. Por outro lado, o sistema financeiro se tornou muito mais complexo. E graças às comunicações modernas, o ritmo se acelerou imensamente. Assim, qualquer dada ação política é incerta em seus efeitos e em geral tardia quando por fim é adotada.
Como um exemplo dessa complexidade, agora parece claro que as autoridades dos Estados Unidos estavam erradas ao permitir a quebra do Lehman Brothers. O efeito do colapso do banco foi o mesmo que o da quebra de uma peça que opere em alta velocidade em uma máquina de precisão: voaram estilhaços em todas as direções.
Um efeito grande e inesperado foi a severa perda de confiança dos investidores nos mercados de crédito de curto prazo, com uma congestão muito pronunciada no setor.
O fato de que um desfecho como esse não tenha sido previsto pelo secretário do Tesouro norte-americano, Henry Paulson, teoricamente o homem mais bem informado do mundo, oferece nova prova de que o sistema se tornou complexo demais para que se possa controlá-lo.
Um segundo efeito perverso surgiu com o resgate às instituições de crédito hipotecário norte-americanas Freddie Mac e Fannie Mae. A decisão causou caos no enorme e obscuro mundo dos derivativos de crédito -e a quebra do Lehman Brothers agravou ainda mais a situação.
A existência dos derivativos de crédito e do mundo bancário fantasma representado por entidades excluídas de balanços como os veículos para propósitos especiais significam que os investidores ainda estão no escuro quanto a que parte do sistema bancário foi efetivamente danificada. Uma vez mais, o fato de que isso continue a ser verdade 15 meses depois que a crise irrompeu sugere que reparar esses danos será um processo muito lento.
Alguns detalhes do comportamento do mercado ontem também nos lembram de que a crise avançou para bem além do sistema bancário. As ações das mineradoras despencaram ontem em Londres, e a mineradora de cobre cazaque Kazakhmys -que integra o índice londrino FTSE100- fechou com perda de 27% no dia.
Isso, somado às quedas profundas nos mercados emergentes ontem, oferece nova prova de que os investidores agora antecipam uma grave desaceleração na economia real do planeta. E, ao contrário de 1929, as causas são bastante claras.
Embora ainda se discuta por que o crash de Wall Street em 1929 foi seguido pela Grande Depressão, desta vez a história é de simples endividamento excessivo. Os países desenvolvidos assumiram dívidas demais e agora estão passando por um processo brutal de liquidação.

Tradução de PAULO MIGLIACCI



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