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ESPIONAGEM
Documento que solicitou busca e apreensão de papéis menciona suspeita de envolvimento da empresa em sete crimes
Procuradora qualifica Kroll de "criminosa"
ELVIRA LOBATO
DA SUCURSAL DO RIO
A procuradora da República
Anamara Osório Silva Sordi qualificou a multinacional Kroll Associates de "organização criminosa" em documento enviado à Justiça Federal quando solicitou a
busca e a apreensão de documentos do banqueiro Daniel Dantas,
do Opportunity, da presidente da
Brasil Telecom, Carla Cico, e de
funcionários e de colaboradores
da empresa. O episódio ficou conhecido como Operação Chacal.
A Folha teve acesso, na sexta-feira à noite, ao documento que o
Ministério Público Federal enviou
ao juiz da 5ª Vara Federal Criminal de São Paulo. O documento
diz que as informações colhidas
pela Polícia Federal, a partir até de
escuta telefônica autorizada pela
Justiça, indicariam que a Kroll,
sob o manto da legalidade, "esconde contornos de verdadeira
organização criminosa".
Em julho, a Folha revelou que a
empresa de investigação particular Kroll, contratada pela Brasil
Telecom (controlada pelo Opportunity) para espionar a Telecom
Italia, produzira relatórios em que
havia indícios de práticas ilegais.
Opportunity e Telecom Italia travam batalha judicial sobre o controle da Brasil Telecom. A espionagem acabou atingindo autoridades como o ministro Luiz Gushiken e o presidente do Banco do
Brasil, Cassio Casseb.
Em relação a Daniel Dantas e a
Carla Cico, o Ministério Público
os considerou beneficiários, mas
não integrantes do que qualificou
de "organização criminosa".
Mesmo assim, os advogados do
Opportunity reclamam de que até
as gavetas de roupas íntimas do
apartamento de Dantas teriam sido reviradas pela PF.
O juiz autorizou a busca e a
apreensão de documentos na casa
de ambos diante da argumentação do Ministério Público Federal
de que os dois teriam pleno conhecimento das ações e dos métodos de investigação da Kroll.
A procuradora elencou sete crimes que, segundo ela, poderiam
ser atribuídos à Kroll, entre eles os
de crimes contra a paz pública,
contra a liberdade individual,
contra o sigilo de informações
bancárias e contra a administração pública. O inquérito que apura o caso está sob segredo de Justiça, e, até agora, não eram conhecidos os motivos que levaram a Polícia Federal a efetuar as buscas. A
representação feita pelo Ministério Público revela importantes fatos até agora desconhecidos.
Servidores públicos
Segundo o documento, a Kroll
se relacionou com integrantes do
poder público usando servidores
e ex-servidores para ter acesso a
informações confidenciais e, ainda, aproximando-se de autoridades diversas para conseguir o respeito do cliente -no caso, o Opportunity e a Brasil Telecom-,
"aparentando influência que não
tinham, embora quisessem".
Para sustentar a afirmação e
convencer o juiz da necessidade
da busca e apreensão de documentos, a procuradora disse que
os funcionários da Kroll Tiago
Verdial e Bill Goodall (o primeiro
esteve preso por dez dias em julho, e o segundo é dado como foragido) contataram dois procuradores federais que integram a força-tarefa do caso Banestado (que
investiga remessas ilegais de dinheiro para o exterior). Na busca
de aproximação, teriam oferecido
aos procuradores informações
sobre o ex-presidente da Parmalat
Gianni Grisendi e sobre o empresário Naji Nahas.
Uma das buscas efetuadas pela
PF se deu na casa do ex-funcionário do Banco Central Arlindo Ferreira, em Ribeirão Preto (SP),
porque haveria indícios de que ele
obtinha dados protegidos por sigilo bancário do BC e os repassava
à Kroll. O Ministério Público, no
entanto, não especificou que informações ele teria passado.
A PF, segundo se depreende do
documento, desconfia de que o
ex-funcionário do BC receba as
informações de funcionários que
estão na ativa, mas, segundo a representação feita pelo Ministério
Público à Justiça, ainda foi localizado o elo atual dentro do BC.
Outro suposto contato da Kroll
com servidores públicos seria Antonio José Carneiro, do Rio de Janeiro. A Polícia Federal apreendeu documentos na casa dele, na
Tijuca (zona norte), e no escritório da Empresa Nacional de Análises Comerciais, no centro do
Rio, de sua propriedade.
Segundo o Ministério Público
Federal, ele fornecia informações
fiscais à Kroll, "mas ainda não se
sabe qual o servidor da Receita
Federal que, porventura, o abastecia com os dados".
Pelo texto da procuradora, vê-se
que a investigação policial sobre o
caso Kroll ainda engatinha. Na
parte do documento relativo às
suspeitas de envolvimentos de
funcionários públicos, consta que
"Vicente de tal receberia dinheiro
da Kroll para fornecer informações sobre dados telefônicos [informações cadastrais e histórico
de chamadas]".
Hierarquia
A parte mais detalhada do documento do Ministério Público
Federal é a que descreve a relação
entre os funcionários da Kroll na
investigação encomendada pela
Brasil Telecom e que foi batizada
de Operação Tóquio. O principal
objetivo da investigação encomendada à Kroll era levantar informações que comprovassem
conduta irregular da Telecom Italia, acionista da Brasil Telecom ao
lado do Opportunity.
Em vários trechos do documento, a procuradora refere-se à Kroll
como "Orcrim", que vem a ser a
forma como a PF se refere às organizações criminosas.
A procuradora Anamara Sordi
disse que havia uma relação hierárquica entre as pessoas envolvidas na investigação. Segundo ela,
havia três níveis hierárquicos: os
chefes, os intermediários (investigadores) e os subcontratados ou
terceirizados. No topo, segundo
ela, estariam Charles Carr, representante da Kroll em Milão (Itália), Omer Erginosoy (representante da Kroll em Londres),
Eduardo Gomide, Eduardo Sampaio e Vander Giordano, executivos da Kroll no Brasil.
Segundo o documento, as pessoas envolvidas usavam códigos
para se referir aos clientes e contratantes. Os subcontratados
eram orientados a fazer os contatos com os investigados fora da
Kroll, para "isentar a estrutura
operacional" da empresa.
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